DIRCEU vs. MÍDIA E MP
“Dirceu ataca Ministério Público e imprensa”, copyright O Globo, 17/01/04
“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou ontem o que chamou de clima de vale-tudo nas investigações sobre a morte do prefeito Celso Daniel, assassinado em janeiro de 2002. Num tom ainda mais duro, o chefe da Casa Civil, José Dirceu, criticou fortemente o Ministério Público e a imprensa durante ato de desagravo ao deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) na sede da OAB em São Paulo. O ato foi organizado porque Greenhalgh, conhecido advogado e deputado defensor dos direitos humanos, foi acusado por um criminoso preso pelo assassinato do prefeito de ter sido uma das pessoas que o torturaram para que confessasse o crime. O depoimento do preso foi publicado pela ?Folha de S.Paulo? no dia 23 de dezembro passado.
Dirceu atacou a forma como o Ministério Público estadual conduziu as investigações sobre o assassinato que, segundo ele, esconderia interesses de grupos políticos adversários do PT. Dirceu também disse que o Congresso deveria tomar providências sobre a ?persistente e permanente violação? de direitos dos cidadãos pelo Ministério Público e por parte da imprensa.
? A violação do sigilo de Justiça virou uma coisa normal, sistemática, e toma conta de setores do Ministério Público, articulado com facções políticas e alguns setores da imprensa. O Congresso precisa se debruçar sobre essa situação de extrema gravidade ? disse Dirceu, afirmando estar falando como cidadão e não como ministro.
Em carta lida pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, o presidente Lula afirmou:
?Não poderia deixar de manifestar minha irrestrita solidariedade ao deputado Luiz Eduardo Greenhalgh. Conheço a trajetória desse advogado e companheiro desde a década de 70, quando colocou o seu talento profissional e sua generosa militância a serviço da redemocratização do país (…). Considero importante essa manifestação para que o direito e a honra das pessoas não sejam atacadas irresponsavelmente, num vale-tudo em que os princípios éticos se constituem na primeira vítima (…)?, diz a carta lida pelo ministro da Justiça.
Dirceu discursou ao lado de Greenhalgh, que não conseguiu conter o choro.
? Estou fortemente abalado com tudo isso. Mas posso afirmar que o depoimento desse preso foi acompanhado por nove pessoas, que podem confirmar que não torturei ninguém. Lembro até que pedi para meu motorista comprar um sanduíche para o preso, que estava há oito horas depondo sem comer nada ? disse.
Além de Dirceu e de Thomaz Bastos, participaram do ato o ministro das Comunicações, Miro Teixeira; o presidente da Câmara, João Paulo Cunha; os presidentes do PMDB, Michel Temer, e do PT, José Genoino; o líder do MST João Pedro Stédile; o vice-prefeito de São Paulo, Hélio Bicudo; e o senador Romeu Tuma. Mais de cem convidados lotaram o auditório da OAB.
João Paulo rechaçou as acusações que constam das denúncias oferecidas pelo Ministério Público, principalmente as que pesam sobre dirigentes do PT.
? Diante do ridículo da notícia, ou relevamos ou tentamos desmontar essa farsa. Não se pode admitir arrastar Greenhalgh ou o PT para um caminho que não queremos ir, e não iremos ? disse.
O presidente nacional da OAB, Rubens Approbato, disse que os procuradores não deixaram a defesa ter acesso aos autos:
? Roberto Podval (advogado de Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, preso pela acusação de ser mandante do seqüestro e da morte de Daniel) defendeu seu cliente praticamente na base da premonição.
O presidente do PT, José Genoino, também criticou as investigações do Ministério Público. Segundo ele, o processo já começou errado.
? Muita gente do PT teve o telefone grampeado ilegalmente, com desculpas de que se estava investigando tráfico de droga. É evidente que se tentava prejudicar o PT ? disse Genoino.
Um dos procuradores que investigam a morte do prefeito Celso Daniel, Amaro José Thomé Filho, rebateu as críticas.
? O sigilo só foi quebrado depois de os parentes do prefeito pedirem cópias da documentação que produzimos. Da nossa parte nunca houve manipulação política. E este ato me faz crer que não somos nós que estamos fazendo uso político da situação ? disse Thomé Filho.”
“Dirceu acusa procuradores e imprensa de violar direitos”, copyright O Estado de S. Paulo, 17/01/04
“O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, fez um duro ataque ontem ao Ministério Público e à imprensa, durante ato de desagravo ao deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), na sede paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ele sugeriu que o Congresso tome providências sobre a ?persistente e permanente violação? de direitos dos cidadãos pelo Ministério Público e a imprensa. ?Estamos vendo a Constituição ser violada diariamente numa série de procedimentos feitos seja pelo Ministério Público, seja pela imprensa?, afirmou. ?Não é mais razoável tolerar esse estado de coisas.?
Dirceu criticou explicitamente a violação do segredo de Justiça, com a divulgação de informações de inquéritos não concluídos, falando do caso de Greenhalgh. Em 23 de dezembro, reportagem do jornal Folha de S.Paulo informou que Rodolfo Rodrigo dos Santos Oliveira, um dos presos acusados pela morte do prefeito de Santo André, Celso Daniel, teria dito em interrogatório sigiloso à Justiça ter sido torturado pelo deputado para que confessasse o crime. A tortura teria ocorrido em 2002, quando Oliveira depôs à polícia.
Segundo Dirceu, o processo em que aparece a acusação de prática de tortura contra Greenhalgh está protegido pelo segredo de Justiça, mas foi violado e divulgado em jornal. ?Está se tornando uma norma a violação do segredo de Justiça?, disse, acusando o Ministério Público de, articulado com facções políticas e setores da imprensa, distorcer e politizar algumas discussões.
?Isso exige uma reflexão?, afirmou, avaliando que há ?impunidade? para este tipo de ação política no País.
Falando especificamente do caso de Greenhalgh, o ministro contou que, ao ser informado, considerou ?inacreditável? a acusação. ?Custo a acreditar que isso aconteceu?, insistiu. Ao fazer a crítica, Dirceu explicou que falava como cidadão. ?O Congresso precisa se debruçar sobre essa situação de extrema gravidade?, afirmou.
No ato de desagravo, Greenhalgh reclamou que o jornal publicou a acusação sem checá-la com outras fontes. E afirmou que, além dele, oito pessoas acompanharam o depoimento de Oliveira. Dizendo-se ?profundamente abalado? com a acusação, Greenhalgh afirmou que não quer transformar o ato numa luta contra a Folha, mas ficou magoado por não ser ouvido antes da publicação da reportagem. ?Uma notícia como essa vai contra toda a minha trajetória?, assegurou, acrescentando que ?jamais toleraria? um ato de tortura – o deputado tem longa atividade na defesa dos direitos humanos.
Elogios
O deputado agradeceu em especial a presença no ato do advogado José Carlos Dias ao ato de desagravo, já que, embora seja seu amigo, é o advogado da Folha. Visivelmente emocionado, Greenhalgh foi elogiado por Dirceu e pelos ministros Miro Teixeira (Comunicações) e Márcio Thomaz Bastos (Justiça). Também recebeu apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que mandou uma carta repleta de elogios. ?É um ato que ele merece por sua história e pela inconsistência dessas insinuações?, disse Thomaz Bastos.
Além da carta de Lula, o deputado ouviu mensagens da prefeita Marta Suplicy, do cardeal Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo, com quem trabalhou no Centro Santo Dias de Direitos Humanos, de Aloysio Nunes Ferreira Filho, vice-presidente do PSDB e do ministro do Supremo Tribunal Federal Nelson Jobim.
O ato contou ainda com os presidentes do PT, José Genoino, e do PMDB, Michel Temer, parlamentares de vários partidos, e representantes do Ministério Público, CUT, MST, OAB e de outras entidades. ?Eu já me sinto desagravado?, contou Greenhalgh depois. Na cerimônia, ele apresentou à OAB-SP um pedido de desagravo que será enviado à Comissão de Direitos e Prerrogativas da entidade.”
“Procurador-geral rebate acusações de Dirceu”, copyright O Estado de S. Paulo, 20/01/04
“O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Herberto Magalhães da Silveira Júnior, definiu ontem como ?um grave ataque à independência do Ministério Público? as declarações do ministro da Casa Civil, José Dirceu, que criticou a violação ?normal e sistemática? do sigilo de Justiça no caso Celso Daniel.
Na sexta-feira, durante ato de desagravo ao deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), que foi destacado pelo PT para acompanhar as investigações policiais sobre o crime, Dirceu apontou existência de suposta articulação de ?setores do Ministério Público?, da imprensa e facções políticas.
José Dirceu propôs que o Congresso ?precisa se debruçar sobre essa situação de extrema gravidade?.
?Não se sabem as razões por que setores do governo federal e de um partido político, que não são objeto dessa investigação, têm se manifestado virulentamente contra as apurações que visam a desvendar os autores do homicídio?, ressaltou Silveira Júnior, por meio de nota.
O chefe do Ministério Público paulista alertou que ?a sociedade brasileira, destinatária final dos serviços do MP, deve estar atenta para aqueles que querem articular iniciativas para reduzir nossas atribuições e nos tornar submissos aos poderosos do momento; o grande prejudicado será o povo?.
Oligarcas – Para Silveira Júnior, que ocupa interinamente o cargo – o titular, Luiz Marrey, está de férias – ?o povo ficará privado de instituição autônoma e independente, de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, que vem desempenhando suas funções de forma efetiva, motivo da ira dos totalitários e dos oligarcas?.
O procurador sustenta que ?é inadmissível que, ao invés de aguardar com serenidade o pronunciamento judicial sobre o caso, certas autoridades se auto-invistam do poder de julgar e passem a difundir condenações genéricas, abusivas e despropositadas a uma das partes, o MP, na tentativa de desqualificar seu trabalho sob pretexto de defender os direitos da cidadania?.
O procurador lembrou que ?o Judiciário, único órgão constitucional destinado a julgar supostas violações de direitos dos cidadãos, tem acolhido as ações e investigações do Ministério Público, particularmente no caso do homicídio do prefeito de Santo André?. Ele acrescentou que ?as atividades do MP são desenvolvidas perante o Judiciário, daí a razão para ser conceituado como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado?.
As declarações do ministro da Casa Civil também foram repudiadas pela Associação Nacional dos Procuradores da República. ?Os procuradores reafirmam sua confiança no Congresso, conclamando-o a não enveredar por caminhos que levem ao enfraquecimento do Ministério Público, à quebra do direito de informação e ao prejuízo da própria sociedade brasileira?, destacou Nicolao Dino de Castro e Costa Neto, presidente da entidade.
Para o presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp, entidade que congrega promotores e procuradores de Justiça de todo o País), Marfan Martins Vieira, o ministro repetiu ?conhecido discurso reiteradamente proclamado por aqueles que, de algum modo, se vêem alcançados ou incomodados pela atuação séria e responsável de promotores e procuradores que, no exercício de suas elevadas funções, não transigem na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos sociais e individuais indisponíveis?.”