LIVROS
Em 1996, às vésperas da eleição presidencial, a equipe do Washington Post viveu um dilema, muito comum na puritana mídia americana: publicar ou não a descoberta de que o candidato Bob Dole teve um caso extraconjugal 28 anos antes? Bob Woodward foi a favor: "O Post assumiu uma postura agressiva em relação a Clinton e sua vida sexual", e poderia ser acusado de "critério duplo". Leonard Downie Jr., editor-executivo, e Robert Kaiser, editor-administrativo, foram contrários. A matéria não saiu, mas o National Enquirer deu a notícia antes da eleição.
Esta história de bastidores aparece no livro que Downie e Kaiser escreveram, "The News About the News: American Journalism in Peril" (As notícias sobre a notícia: jornalismo americano em perigo). Howard Kurtz [Washington Post, 18/2/02] observa que é incomum que executivos de jornal ataquem a profissão enquanto estão na ativa. O livro, segundo ele, não critica muito o próprio jornal ? os autores reconhecem que "provavelmente não viram muitos defeitos" ? e trata de várias organizações noticiosas, em especial redes de TV.
"O declínio do noticiário televisivo sério e ambicioso nas últimas duas décadas do século 20 não pode ser visto como surpreendente"; esta cultura encantada por celebridades é promovida e legitimada pela televisão, afirmam os autores, apoiados pelos três grandes âncoras americanos que entrevistaram, Dan Rather, Tom Brokaw e Peter Jennings.
Kurtz observa que o livro mostra um certo desdém em relação ao jornalismo eletrônico. As notícias de verdade, declaram Downie e Kaiser, vêm dos jornais. "Inevitavelmente", explicam, a crítica parte do ponto de vista de jornalistas que se assumem "a favor do tipo de reportagem séria e minuciosa que os melhores jornais fazem". Mas estes também cometem erros: "Em alguns casos, fizemos julgamentos infelizes", reconheceu Downie. Exemplo? "Fomos muito além do que deveríamos na morte de JFK Jr. Eu me juntei ao time nesta ocasião."
Erros
Apesar do exército de revisores, erros sempre escapam. A novidade é que os melhores foram agora reunidos em livro: "Kill Duck Before Serving: Red Faces at The New York Times" (mate o pato antes de servir: faces ruborizadas no NYT) compila as 500 erratas mais engraçadas e embaraçosas publicadas pelo jornalão. Os editores Linda Amster e Dylan Loeb McClain, leitores ávidos da seção, fizeram as escolhas.
"Embora lamentemos profundamente cada erro, não dá para negar que somos humanos e temos senso de humor", escreveu o editor-assistente Allan M. Siegal na introdução. Conta Ana Mantica [Editor & Publisher, 14/2/02] que, numa das correções mais famosas, o jornal esclareceu que Ivana Trump comprou duas dúzias de sutiãs pretos, duas dúzias de brancos e duas dúzias de beges ? e não dois mil de cada. O título do livro se deve a uma errata em que o Times admite que "descreveu incorretamente a apresentação do prato "Pato moscovita" do chef nova-iorquino Michel Fitoussi. Que, ao prepará-lo, usa um pato previamente morto.
FESTIVAL DE BERLIM
O Festival de Berlim, que terminou em 17/2, dedicou espaço especial ao nazismo, relata Adam Tanner [Reuters, 16/2/02]. Em destaque, três filmes novos, entre os quase 400 exibidos, tratam dos difíceis conflitos morais da época. Dirigido por Istvan Szabo, o americano Taking sides conta o dilema do grande maestro alemão Wilhelm Furtwaengler, que optou por permanecer em seu país durante a Segunda Guerra Mundial, e regeu concertos em Berlim até pouco antes do fim do conflito. "Fiquei em minha terra natal. Isto é um pecado?", pergunta o personagem, acusado de ser colaborador dos nazistas.
"Foi o período mais extraordinário e assustador para a história européia e mundial. Não só por causa da guerra. Eram seres humanos tomando posições e dando suas vidas pelo que acreditavam. E não houve muitos períodos históricos em que isso ocorreu com tamanha intensidade", admira-se o diretor francês Constantin Costa-Gavras. Seu filme, Amen, conta a história de um oficial da SS que tenta alertar o Vaticano sobre o Holocausto, ao mesmo tempo em que fornece gás letal aos campos de concentração.Também baseado em fatos, Laissez-Passer, do diretor Bertrand Tavernier, mostra o cotidiano de dois diretores de cinema na França ocupada pelos nazistas. Um deles, mesmo trabalhando em estúdio controlado pelos invasores, atua na resistência.
Outra sensação do festival foi o relançamento, em cópia restaurada, de O grande ditador, em que Charles Chaplin ridiculariza Adolf Hitler. Geraldine, filha de Chaplin, de 57 anos, revelou, em coletiva em Berlim, que seu pai não teria criado o satírico ditador Adenois Hynkel se soubesse do Holocausto na época em que produziu o filme. Erik Kirschbaum [Reuters, 17/2/02] conta que o público berlinense pôde também assistir a documentário de Kevin Brownlow, The tramp and the dictator (o vagabundo e o ditador), sobre o clássico de Chaplin.