Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Fogo cruzado contra o Zeta

MÉXICO

Jesus Blancornelas, jornalista em Tijuana, no México, já foi baleado, teve um sócio assassinado e anda com 13 guarda-costas cedidos pelo Exército. Mesmo assim é um vencedor. Seu jornal Zeta sobreviveu às represálias dos traficantes de drogas que imperam na região fronteiriça com os EUA. Consagrado "padrinho do jornalismo mexicano moderno" pelo instituição americana Comitê de Proteção dos Jornalistas, ele conta parte de sua luta no livro Los Arellano Félix: la mafia más poderosa en la historia de América Latina , lançado em julho pela editora Plaza y Janés.

Em 1960, Blancornelas chegou a Tijuana para ser editor do El Mexicano, na Baixa Califórnia. Três jornais o demitiram por suas reportagens sobre corrupção na fronteira até que fundasse o semanário ABC, com o qual causou tanto incômodo ao governo que foi obrigado a fugir para San Diego, nos EUA. Então, em 1980, com Hector Felix Miranda fundou o Zeta, reinstalando-se após algum tempo no México. Cinco anos depois, o jornal publicou um furo, reportando que os irmãos Ramon e Benjamin Arellano Felix seriam os novos chefes do "cartel de Tijuana", em matéria na qual mostrava um ponto de venda de maconha que contava com policiais como seguranças.

Blancornelas conta que não sabia da importância da denúncia até que funcionários do governo compraram todos os 20 mil exemplares da edição do jornal. Ele, então, republicou o material no dia seguinte, manchetando "Censurado!" na primeira página.

Em 1987, o escritório de Blancornelas foi crivado de balas e, em 1988, Miranda foi assassinado a caminho do trabalho. Pelo crime, foram condenados dois seguranças de Jorge Hank Rhon, filho de um dos homens dos mais poderosos do México, alvo freqüente da coluna de Miranda. Desde então, como o assassinato nunca foi completamente esclarecido, Blancornelas publica toda semana no Zeta o seguinte anúncio, em forma de bilhete: "Jorge Hank Rhon: por que seus guarda-costas me assassinaram? Hector Felix Miranda."

A luta contra a violência continuou com denúncias e listas de vítimas do tráfico. Em 1997, o Zeta publicou de graça, a pedido de uma mãe, anúncio perguntando por que Ramon Arellano Felix havia matado seus dois filhos que trabalhavam para ele. "Espero que viva o suficiente para saber o quão doloroso é perder os filhos", dizia o texto, que terminava assim: "P.S.: Pode mandar me matar quando quiser. Estou pronta para dar minha vida". Acabou sendo morta a outra filha da desesperada senhora, fuzilada quando, com o marido, colocava o lixo para fora de casa. O bebê do casal ficou ferido.

Quando Blancornelas deu primeira página à matéria que identificava David Barron Corona como o elo entre o "cartel de Tijuana" e a máfia mexicana, ainda em 1997, os seguranças da polícia que acompanhavam o jornalista se recusaram a o continuar protegendo. Sobrou apenas seu guarda-costas particular, Luis Valero. Uma semana depois, ele morreu num ataque ao proteger Blancornelas ? que, ainda assim, levou vários tiros.

O jornalista recuperou-se e voltou à velha rotina de ataques ao crime organizado. O governo federal enviou 13 militares do Exército para sua proteção. Por intermédio de seu advogado, os irmãos Felix pediram que o Zeta afirmasse que eles não tinham relação com o atentado. Em troca, relata Anne-Marie O?Connor, do Los Angeles Times [28/7/02], dariam proteção a Blancornelas. A proposta não foi aceita e, algum tempo depois, Ramon foi morto pela polícia e Benjamin, preso.

O semanário Zeta continua circulando.