Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Folha de S.Paulo/Le Monde

IRAQUE

“Mídia iraquiana é livre, mas não tem dinheiro”, copyright Folha de S.Paulo/Le Monde, 14/7/03

“Em dez semanas de existência, dois dias de greve. Nos salões do Palácio das Convenções, onde a administração civil norte-americana lhes reservou um pequeno espaço em Bagdá, crescem a raiva e a frustração entre os 357 técnicos e jornalistas da Iraqi Media Networks (IMN).

?Estamos cheios!?, diz o enraivecido Abudal Salam al Dharri, diretor de informação da nova rede via satélite de rádio e TV iraquiana. ?A liberdade de transmitir aquilo que nos parece importante, nós a temos. Mas não temos recursos, redações, equipamentos suficientes, e os salários são horríveis. Exatamente o inverso do que acontecia sob Saddam Hussein.?

Um combate confuso irrompe na nova paisagem audiovisual iraquiana. Composta por uma única rede de TV aberta, uma rede de TV via satélite e três estações de rádio, uma em FM e duas em ondas médias, montadas pelos norte-americanos assim que o regime de Saddam Hussein caiu, a IMN funciona como uma espécie de novo serviço oficial de rádio e teledifusão do Iraque.

Gerenciada, sob o controle geral de Paul Bremer, o administrador civil dos EUA no Iraque, por uma empresa privada norte-americana, a Saic, que participou da concorrência lançada depois da guerra pelo Pentágono, a nova mídia pública iraquiana oferece de seis a 12 horas diárias de música, documentários, filmes norte-americanos e notícias.

Percebidas, com ou sem razão, como veículos norte-americanos, as estações de rádio e televisão controladas pela IMN transmitem, decerto, as mensagens e decretos das ?forças de libertação?.

Só a mídia privada, como jornais de grande porte como o ?New York Times?, fala em ?forças de ocupação?, mas seus dirigentes e jornalistas juram que o fazem por escolha própria, e não por imposição militar.

Os veículos oficiais de mídia concorrem contra mais de duas dezenas de pequenas rádios privadas, todas mais ou menos afiliadas a grupos de influência e partidos políticos, que lançaram em menos de três meses uma boa centena de jornais, os quais não usam eufemismos para denunciar a ?ocupação do Iraque?.

?Sem escritórios?

Antigo redator-chefe da Rádio Iraque Livre, a estação de resistência a Saddam Hussein, transmitida de Londres, Ahmed al Roukabi, 33, o jovem diretor da IMN, nos recebeu em um corredor. ?Lamento, cheguei do Kuait com o Exército dos EUA no começo de abril e ainda não tenho escritório para receber visitas?.

?Além do fato de não terem preparado bem a administração do pós-guerra?, diz al Roukabi, ?tenho a impressão de que os americanos não percebem bem que é aqui, com o nosso trabalho, que a futura democracia iraquiana está sendo preparada?.

Cidadão sueco de origem iraquiana, al-Roukabi diz que jamais viveu no Iraque e protesta contra o governador americano que ?oferece dezenas de milhões de dólares mensais a pseudo-conselheiros políticos iraquianos que nada fazem?, enquanto jornalistas e técnicos ganham salários entre US$ 60 e US$ 120 por mês.”

“?Minha vida como editor de Saddam?”, copyright Jornal do Brasil, 13/7/03

“As pressões de uma reunião editorial podiam ser tão assustadoras que muitos jornalistas assediados se sentiam como se estivessem ante um tribunal com poderes para aplicar sentenças de morte. Mas, para Saad al-Bazzaz, ex-chefe da televisão estatal iraquiana e editor-chefe do principal jornal de Bagdá, a ameaça era real demais quando ele tentava descobrir notícias que agradassem a Saddam Hussein e a seu filho Uday.

Como editor-chefe do principal jornal de Bagdá, Al-Jammhoria, entre 1990 e 1992, al-Bazzaz era obrigado a lidar diariamente com Uday, o despótico filho mais velho de Saddam, que era dono da maior parte da mídia do Iraque. Até a derrubada do ditador, o império pessoal de meios de comunicação de Uday incluía dois jornais diários, sete semanários, duas revistas mensais, um canal de TV e uma estação de rádio.

O monopólio dos anúncios financiava seu agora abjeto estilo de vida de playboy – com zoológico privado e etc.

Uma lembrança particular de Uday, o magnata da imprensa, com uma Kalashnikov banhada a ouro, faz Al-Bazzaz estremecer.

– Em certa reunião editorial, ele estava irritado com um artigo que havia saído no meu jornal e pegou sua arma – recorda, com um arrepio. – Você pode imaginar nossa reação quando ele começou a brincar com a arma enquanto gritava conosco. Depois disso, qualquer tipo de diálogo com ele era impossível – diz, balançando a cabeça, com ar de cansaço.

Três anos antes, al-Bazzaz esteve a ponto de ser executado por seguidores fanáticos de Saddam. Como chefe do Ministério da Radiodifusão estatal, ele foi convocado a uma das muitas casas de campo luxuosas do ditador, nos arredores de Bagdá. Embora tivesse tido encontros freqüentes com Saddam durante a década anterior, ficou imediatamente claro que esta audiência era diferente. Saddam, de uniforme militar completo, estava em pé e irritado, atrás de uma grande escrivaninha.

Al-Bazzaz começou a se apavorar. N&atiatilde;o era incomum servidores públicos graduados ?desaparecerem? repentinamente depois de serem julgados irritantes. Por algum tempo, al-Bazzaz vinha liderando uma discreta campanha para convencer Saddam a dar um pouco de liberdade à imprensa. Será que ultrapassara o sinal?

Friamente, o presidente perguntou como ia sua saúde. Havia uma regra de ouro quando se estava na presença de Saddam: Só falar quando abordado diretamente. Al-Bazzaz respondeu que estava bem. Logo ficou claro o que tinha feito para ofender o ditador. A televisão e a rádio estatais transmitiam diariamente horas de poemas melosos e canções em honra de Saddam. Grande parte da produção era decepcionante e, nas últimas semanas, ele tinha instruído os produtores a jogar no lixo o que fosse pior.

– Quem fez de você juiz? – perguntou ele entre dentes. – Quem é você para impedir que as pessoas expressem seus sentimentos por mim?

Foi nesse momento que al-Bazzaz receou que estivesse para ser executado. Mas, após uma pausa, o presidente abordou o problema da liberdade de imprensa e informou ao seu trêmulo ministro que não haveria relaxamento de controles. No dia seguinte, o povo iraquiano foi brindado novamente com um programa inteiro de poemas e canções em louvor ao seu presidente.

Não muito depois do incidente com Uday e sua arma, al-Bazzaz desertou do Iraque junto com 150 jornalistas. Viveu na Jordânia e nos EUA, antes de se mudar para Londres, onde montou uma editora que fornece notícias para os muitos milhares de iraquianos exilados no mundo inteiro. Nas décadas intermediárias, observou de perto o ditador.

– No final das contas, acho que Saddam acreditava sinceramente que era um semideus e que 25 milhões de iraquianos eram formas inferiores de seres humanos – diz.

Até que ponto era difícil a vida dos jornalistas sob o domínio de Saddam?

– É justo dizer que os jornalistas não eram amados e que as coisas eram sempre difíceis, mas a situação ficou pior quando Uday assumiu o controle da maior parte da mídia. Ele não tinha nada a ver com jornalismo, mas viu isso como um poderoso meio de tentar controlar as mentes do povo.

Os poucos que realmente criticaram o regime, embora levemente, foram silenciados. Outro jornalista empregado no escritório londrino de al-Bazzaz descreveu como os colegas tinham desaparecido. Alguns foram espancados e ameaçados de execução. Outros foram assassinados ou fugiram do país. (Tradução de Antônio Machado)”

 

VIOLÊNCIA / IRÃ

“Khatami manda apurar morte de jornalista do Canadá presa em Teerã”, copyright Folha de S.Paulo, 14/7/03

“O presidente do Irã, Mohammad Khatami, determinou ontem que quatro ministros chefiem a investigação da morte de uma jornalista canadense que havia sido detida pela polícia em Teerã.

Familiares de Zahra Kazemi, que tinha origem iraniana e trabalhava como fotógrafa free-lancer, afirmam que ela foi presa em 23 de junho e deixada em coma por agressões físicas após ter sido detida quando tirava fotos de uma prisão em Teerã. A morte aconteceu na última sexta-feira.

A versão do governo iraniano é que Kazemi, 54, sofreu um ?derrame cerebral? enquanto era interrogada e morreu no hospital.

O governo do Canadá exige esclarecimentos da administração iraniana desde a morte da jornalista. O embaixador canadense em Teerã já tentou um encontro com o ministro das Relações Exteriores do Irã para tratar do caso, mas a resposta que obteve foi que não era possível no momento.

De acordo com familiares de Kazemi, a chegada dela ao Irã aconteceu após o final dos principais combates na Guerra do Iraque, em 1? de maio.

Além de definir a comissão de ministros para cuidar do caso, o presidente iraniano lamentou ontem a morte da jornalista.

?Vocês devem determinar as razões da morte repentina e quem é responsável por isso?, afirmou Khatami, segundo a agência de notícias iraniana Isna.

Autoridades iranianas afirmam que Kazemi só havia recebido autorização para fotografar os protestos por reformas políticas que têm acontecido no país.”

 

VIOLÊNCIA / PAQUISTÃO

“Jornalista paquistanês em prisão perpétua”, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 11/7/03

“Ao permitir a publicação de um texto considerado insultuoso aos islâmicos, Munawar Mohsin, editor assistente do jornal The Frontier Post, do Paquistão, foi condenado à prisão perpétua por crime de blasfêmia. Naquele país, a blasfêmia, ou ofensa aos deuses, pode levar à pena de morte. O jornalista também foi multado em 50 mil rúpias (algo próximo a R$ 300,00).

O editor do jornal, Mahmood Shah Afridi, está foragido porque a polícia está atrás dele. A justiça paquistanesa quer julgá-lo também quando for preso. Os colegas Aftab Ahmad e Wajeehul Hassan também estão presos por serem considerados responsáveis ?pelo computador? de Mohsin.

A organização Repórteres Sem Fronteiras condenou a decisão da justiça do Paquistão, classificando-a de ?extremamente dura? porque, ao publicar o texto, Mohsin ?não estava sequer dando sua própria opinião, mas permitindo que um leitor expressasse a sua própria?.

A carta foi publicada há dois anos e meio, mas a sentença de prisão perpétua foi dada na terça-feira passada (08/07).

A carta do leitor Ben Dzec foi considerada um insulto ao profeta Maomé.”