Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

FSP

CASO SONINHA

"Soninha, do programa ?RG?, diz fumar maconha e é demitida pela TV Cultura", copyright Folha de S. Paulo, 20/11/01

"A apresentadora Sonia Francine, 34, a Soninha, teve seu contrato rescindido ontem pela TV Cultura, onde comandava o ?RG?, programa voltado para o público adolescente.

O motivo da demissão foi um depoimento de Soninha publicado na reportagem de capa da revista ?Época? desta semana, em que ela admite fumar maconha, ?muito pouco, em festas ou casa de amigos?, e defende a descriminação da droga, ?com restrições?.

A entrevista de Soninha, que é colunista da Folha, foi discutida ontem de manhã pelo conselho curador da Fundação Padre Anchieta, que mantém a TV Cultura. A decisão, no entanto, foi tomada pela diretoria da emissora.

Em comunicado, que foi lido no ar, a TV afirmou que ?em sua condição de televisão pública, tem promovido, em diversos programas de sua grade, debates pluralistas sobre o consumo de drogas em geral e sobre a descriminalização das drogas leves. Entretanto, não pode permitir a manifestação pública, por seus funcionários e colaboradores, de práticas atentatórias às leis vigentes no país?.

?[A decisão da Cultura] é coerente com esse sistema hipócrita [a proibição da droga] que faz mal à sociedade?, disse a apresentadora à Folha.

A exibição do ?RG? foi temporariamente suspensa."quot;

 

"Para Angeli, título ?está fora do contexto?", copyright Folha de S. Paulo, 21/11/01

"O cartunista da Folha Angeli, 45, um dos nomes que declararam à ?Época? serem usuários de maconha, disse que a revista errou em não informar aos entrevistados que seus rostos sairiam na capa e em outdoors em São Paulo, ladeados pelo título: ?Eu fumo maconha?.

?A frase é sensacionalista e está fora do contexto. Quem passa não tem a revista à mão para conferir o que foi dito exatamente?, criticou. Angeli disse que sua filha de 14 anos ficou ?chocada? com os outdoors. ?Ela tem medo de ser proibida de frequentar a casa de alguns amigos.?

O filho mais velho de Angeli, Pedro, 21, que também aparece na reportagem, não quer falar mais à imprensa.

O cartunista criticou a TV Cultura. ?Soninha defendeu politicamente uma idéia. Ser penalizada por isso mostra certa postura arbitrária.?

?A TV Cultura tem todo o direito de demitir, mas devia ter discutido mais, até mesmo com o público?, opinou o músico Otto, 33, outro entrevistado da ?Época?. ?O adolescente está precisando muito mais de verdade do que de preconceito.?

?Se ela dissesse que bebia isso não teria acontecido?, disse o artista plástico Jairo Jordão, 61, sogro de Otto, também usuário entrevistado pela revista."

 

"Advogados divergem sobre apologia", copyright Folha de S. Paulo, 21/11/01

"Ao declarar que fuma maconha, a apresentadora Soninha exerceu o direito à livre manifestação do pensamento ou fez apologia de um crime? A resposta depende do advogado consultado.

?Não acho que foi apologia do crime. Não houve incentivo. Reprimir quem fala do assunto é fazer de conta que o problema não existe?, disse o advogado Roberto Podval, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Segundo ele, declarar-se usuário também não é crime.

?Ela [Soninha? não disse para outros fumarem. Não houve incitação ao crime?, disse o advogado criminalista Roberto Garcia.

Os dois citaram o princípio constitucional de que ?é livre a manifestação do pensamento?.

Para o advogado constitucionalista Celso Bastos, porém, alguém que declare que fuma maconha em um veículo de comunicação está ?inevitavelmente fazendo apologia ao uso da droga?.

Ele citou o Código Penal, que considera crime ?fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime?."

 

"Influência em jovens não é consensual", copyright Folha de S. Paulo, 21/11/01

"Não há consenso entre psicólogos e psiquiatras sobre o risco de uma declaração como a da apresentadora Soninha incitar adolescentes a usar maconha.

?Os jovens não são idiotas de sair copiando alguém cegamente. Hoje eles são informados sobre o risco que correm?, afirma a psicóloga Mônica Gorgulho, especialista em adolescência e toxicomania e presidente da Reduc (Rede Brasileira de Redução de Danos).

?Se fosse assim, o número de suicídios e de casos de overdose entre os jovens seria absurdo?, diz ela, citando ídolos dos adolescentes que morreram nessa situação.

?A demissão [de Soninha? pode ter efeito contrário. O adolescente vai pensar: ?Se eu falar com o meu professor ou com meus pais sobre isso, vou ser punido?, diz o psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg. Para ele, Soninha contribuiu para colocar o assunto em discussão. ?Ela encorajou a transparência.?

Arthur Guerra de Andrade, psiquiatra do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas, da USP, e coordenador do curso médico da Faculdade de Medicina do ABC, discorda dos dois psicólogos. ?A resposta [de Soninha? não foi apropriada. Não cabe, porque influencia muita gente. Ela é um ícone?, disse.

Para o psiquiatra, ao ler as declarações da apresentadora, muitos jovens vão ser críticos, outros não. ?Se isso [a discussão sobre o uso da maconha? fosse feito dentro de um contexto, com debate, poderia até ter validade. Deram uma abordagem simplista para um assunto sério.?"

 

"Capa de Época provoca demissão e debate", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 20/11/01

"O debate está em todas as redações. Uma apresentadora de programa para adolescentes da TV Cultura tem o direito de admitir e justificar o uso da maconha em uma revista de grande circulação. A revista Época mostrou Soninha Francine (com outros três) na capa, admitindo francamente: ?Eu fumo maconha?.

A discussão não se trava em torno da hipocrisia da sociedade em relação à maconha ou sobre o uso da maconha em si. A questão no caso é mais restrita: pode um apresentador de uma televisão pública – e trabalhando em um programa para adolescentes – defender e/ou justificar, em outros órgãos de comunicação, hábitos pessoais que uma parte significativa da sociedade não aceita que seus filhos adotem?

Soninha foi demitida nesta segunda-feira (19/11) pela TV Cultura, onde apresentava o programa RG diariamente entre 17h e 18h. Ela também tem colunas na Folha e na AOL Brasil, além de um programa quinzenal e comentários na ESPN Brasil. Nenhuma dessas outras empresas censurou-a ou tomou qualquer medida contra ela.

Este foi o comunicado da TV Cultura sobre a demissão da apresentadora:

?Revista de circulação nacional publica, esta semana, matéria de capa com o título ?Eu fumo maconha? e fotos de diversas personalidades, entre as quais a de Sonia Francine, apresentadora do programa RG, da TV Cultura.

A TV Cultura, em sua condição de televisão pública, tem promovido, em diversos programas de sua grade, debates pluralistas sobre o consumo de drogas em geral e sobre a descriminalização de drogas em geral e sobre a descriminalização das drogas leves. Entretanto, não pode permitir a manifestação pública, por seus funcionários e colaboradores, de práticas atentatórias às leis vigentes no país. A Fundação Anchieta respeita a luta pela transformação das leis, mas não pode aceitar que o seu descumprimento seja uma atitude defendida por apresentador de programa da TV Cultura, tanto mais quando se trata de um programa de debates destinado ao público juvenil.

Por esse motivo, e sem questionar a competência de Sonia Francine como apresentadora, a TV Cultura rescindiu seu contrato e suspende temporariamente a transmissão do programa RG.?

Soninha diz que não se arrepende de ter dado a entrevista e também não retira uma só linha do que disse a Época. Mas reconhece que deveria ter pensado bem antes. ?Quando topei dar a entrevista, eu sabia dos riscos que corria?, disse ela corajosamente ao site MMonline. ?Fiz isso por acreditar numa causa. Na minha opinião, mais prejudicial que os efeitos da maconha é a violência que ela gera por ser ilegal. Para o meu bem-estar teria sido melhor eu ficar quietinha, mas achei importante a abordagem do assunto.?

Mas ela condena o uso que a revista fez de sua imagem, colocando-a na capa e em outdoors, porque não foi ?convidada a fazer anúncio?. Pior: ela acha que Época não está contribuindo para um debate saudável sobre o assunto e ?só aumenta a desinformação e o preconceito contra os quais luto e tentei lugar quando topei a reportagem.?"