CASO BOECHAT
Alberto Dines
Nem todo criminoso volta ao local do crime. A forma com que o infrator evita mencionar a infração também pode servir de prova. No caso deste grampo [veja remissões abaixo], o duplo silêncio das publicações comparsas é mais do que comprometedor. É prova. Quase um flagrante de delito:
1) Uma semana depois demitir o colunista Ricardo Boechat de O Globo, Veja fugiu de qualquer referência ao caso. Não tratou das "sensacionais" revelações contidas na transcrição do grampo na edição anterior e muito menos da saida de profissional que tantas vezes foi notícia destacada na própria revista. Nem sequer uma notícia na seção "Datas" ou "Holofote", onde a direção da revista costuma enfiar pequenas vinganças contra desafetos. Para os três milhões de leitores de Veja, aquela reportagem com chamada de capa não teve o menor efeito.
2) Um dia depois de demitir o seu principal e mais famoso colunista com uma nota na primeira página, o assunto evaporou-se completamente das vibrantes paginas de O Globo. Ao longo desta primeira semana, sequer uma carta ? condenando ou louvando o jornal ou o jornalista. Como um episódio desta natureza não poderia ser ignorado pelos leitores do jornal, fica a certeza de que as repercussões do caso foram e continuam sendo manipuladas. [A.D., pelo telefone]
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[Reprodução da intervenção, por telefone, de Rodolfo Fernandes, editor-chefe de O Globo, no programa Observatório da Imprensa na TV, que tratou da demissão de Ricardo Boechat, no ar em 26/6/01]
A.D. ? O que você tem a dizer?
Rodolfo Fernandes ? Eu só quero esclarecer que eu mandei uma nota, e acho que o Boechat entendeu justamente o contrário. O Boechat, como ele disse aí, ele é meu amigo. Me considero amigo do Boechat. Nós temos uma convivência antiga. Eu falei justamente o contrário do que ele entendeu. O Boechat entendeu que eu disse que ele é vilão e foi justamente… Ainda bem que a Lúcia esclareceu, ela entendeu a mesma coisa que eu escrevi. Eu não estou dizendo que o Boechat é vilão, estou dizendo que a reportagem do Jornal do Brasil de segunda-feira tentou transformar o Boechat em vilão único dessa história. Eu só queria deixar claro e esclarecer esse ponto porque eu não quero que fique esse mal-entendido na cabeça do Boechat. Por favor, eu queria esclarecer aos telespectadores, todos que estão me ouvindo, que eu jamais disse isso e está escrito e a Lúcia entendeu o que o Boechat não entendeu.
A.D. ? Rodolfo, só uma pergunta da parte da produção deste programa, sem entrar no mérito: seguindo o exemplo americano, que pratica um jornalismo sério e mais responsável, as empresas jornalísticas, toda vez que elas são alvos de discussão, elas dão a cara, elas aparecem, elas prestam satisfações à sociedade, elas dão entrevistas coletivas, elas vão aos programas de televisão. Você não acha… o dia de ontem eu sei o quão doloroso foi para todos vocês, especialmente para você, mas hoje é um outro dia. Você não acha que vocês deveriam estar presentes aqui, para que esse debate pudesse ter realmente os dois lados e vocês pudessem sentar para discutir, não apenas o caso da demissão do Boechat, mas toda essa paranóia do grampo que está prejudicando o jornalismo brasileiro?
Rodolfo ? Bom, Dines, eu já estive várias vezes no seu programa e isso já diz tudo. E como você mesmo já disse, esses últimos dois dias não foram dias comuns no Globo. Então, só isso que impediu a nossa presença aí, mas eu enviei uma… Assim que o Eugênio Viola me ligou, eu enviei uma…, tão rápido quanto possível, uma correspondência para ele. Eu só não queria que ficasse a impressão errada na cabeça do Boechat. Quanto à questão da fita, hoje eu estava tendo uma conversa com Luiz Garcia, discutindo justamente isso, e ele falou uma coisa interessante ? precisamos "rediscutir" o uso de grampos na imprensa brasileira, aí ele falou o seguinte: "Eu não gostaria de estar no comando da decisão de não publicar um grampo que denuncia uma autoridade". Eu já conversei várias vezes com o Boechat também sobre isso. É uma permanente discussão que tem que ser analisada caso a caso.
Boechat ? Eu só queria não deixar pairar no ar qualquer impressão de que eu tenha qualquer… Feito o esclarecimento do Rodolfo, Rodolfo, um abraço! Domingo a gente se vê na pelada e é bom a gente jogar no mesmo time, senão pode ser que eu quebre a sua perna e vão achar que foi vingança, tá certo?
Rodolfo ? Um abraço, até logo, tchau!