Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Janio de Freitas

ARTIGO 222

"Mídia" copyright Folha de S. Paulo, 12/12/01

"A Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e, sob sua orientação, o deputado Henrique Eduardo Alves conseguiram o que parecia difícil e por certo era desnecessário: deram mais um toque que tornou ainda pior o projeto da oferta, a capitais internacionais, de 30% na propriedade das empresas brasileiras de mídia.

Como não há motivo algum, senão o interesse de certos grupos da mídia, para a mudança da Constituição em sua exigência de propriedade brasileira de jornais, TVs, rádios e revistas, o projeto não pôde ou não precisou usar de subterfúgios para tapear sobre seus propósitos e sua natureza. A maioria dos sócios da Abert e da ANJ apenas silenciou sobre o projeto, enquanto pressionava por ele.

Já em cima da primeira das votações, prometida para ontem pelo presidente da Câmara, Aécio Neves, as duas associações e o relator, deputado Henrique Eduardo Alves, decidiram pelo que foi chamado de um ?aprimoramento? do texto, na tentativa de quebrar resistências parlamentares a apoiá-lo.

Seja qual for o nome dado ao acréscimo, o propósito e o efeito foram dar caráter ardiloso ao projeto. O novo dispositivo, estabelecendo que a linha editorial e a programação ficam sob responsabilidade reservada a brasileiros é, além de grotesco, uma fraude intencional da realidade que todos conhecem: nos meios de comunicação nunca faltaram ?diretores responsáveis? que emprestam o nome e a irresponsabilidade a proprietários cujas finalidades e práticas recomendam o uso das mãos de gatos. Todos sabemos que o falso ?aprimoramento? apenas tornaria maior a farsa, com a burla não só à moralidade, mas também à Constituição e à lei regulamentadora.

Há, porém, um elemento positivo no texto introduzido. Sua intenção é aparentar um resguardo de consequências que poderiam advir da influência estrangeira na condução editorial da imprensa, de TV e rádio. Logo, o ?aprimoramento? é um atestado de que no projeto estão implícitos riscos graves e extensos para a vida brasileira e seu futuro."


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"Dólares na mídia" copyright Folha de S. Paulo, 11/12/01

"Está previsto para hoje o passo inicial de uma modificação de amplo alcance, e não previsivelmente positivo, na vida brasileira e em seu futuro. A primeira votação do projeto que oferta ao capital internacional a propriedade de 30% nas empresas brasileiras de jornal, TV, revista ou rádio está prometida para logo mais pelo presidente da Câmara, Aécio Neves.

O projeto, apresentado pelo hoje ministro da Justiça e então deputado, Aloysio Nunes Ferreira, é de interesse dos grandes grupos da mídia, que estão considerando a abertura de suas empresas a sócios estrangeiros como solução para as dificuldades economias e financeiras que os acometem.

Uma primeira observação, sobre esse casuísmo que marginaliza a velha e justa condenação da mídia a casuísmos, é que a entrada do capital externo na sociedade não assegura a solução dos problemas atuais. De certo, pode proporcionar a resolução momentânea. Embora se manifestem com formas e intensidade diferentes entre as empresas, as causas fundamentais dos seus problemas não parecem solucionáveis com a venda de parte das propriedades e, mais grave, vão continuar produzindo seus efeitos deletérios, na melhor hipótese, por algum tempo ainda.

Essas causas têm raízes na continuidade, já por sete anos, da desaceleração industrial, da queda de poder aquisitivo da classe média e suas variações e, por consequência, da atividade comercial. Indissociáveis, esses três fatores determinam o faturamento publicitário e a circulação (não a audiência, mas, com redução do poder aquisitivo para as vendas, a publicidade cai por redução de utilidade).

Diz-se que, nesse ou naquele ano, o Brasil, mesmo com a atual política econômica, teve crescimento de tanto por cento. Considerados o crescimento populacional, a redução do número de empregados e o aumento anual da população à procura do primeiro emprego, o Brasil vem encolhendo industrial e comercialmente ano a ano, mês a mês. Se a isso juntarmos, até porque também são partes inseparáveis, os juros que envenenam a empresa industrial e o dólar, com sua disparada endividadora a partir de 99, temos o território econômico em que as empresas de jornal, TV, revista ou rádio estão plantadas. Não poderiam passar senão pelas mesmas consequências a que, em tal território, as outras atividades industriais-comerciais ficaram sujeitas.

Curioso é que as empresas de mídia têm dado, ao longo dos sete anos, apoio entusiasta à política econômica que as oprime, a ponto de precisarem desfazer-se de partes de si mesmas. Sem exagero, a mídia é o sustentáculo da política econômica, que não poderia persistir nos efeitos antieconômicos, e favorecedores só do sistema financeiro, se posta sob avaliação independente e constante.

A outra observação é a do sentido que excede a empresa de mídia, nas decorrências, mais extensas no tempo, da alteração constitucional para admitirem-se estrangeiros na propriedade de empresas de comunicação. Enquanto foi exigida a condição de brasileiro nato, houve muitas e conhecidas burlas, fosse por controle absoluto, como na criação das editoras Manchete e Abril, fosse por associação, como a de Time-Life na TV Globo. Nem essa última resultou em consequências drásticas, nem qualquer deles foi prejudicial ao país ou parte dele, por ser de estrangeiros. Mas os tempos eram outros -e outras, as circunstâncias.

Não haveria razão para que investidores internacionais supusessem encontrar lucros, em futuro apreciável, na mídia brasileira, de modo geral e sem nos determos em uma ou outra exceção. A tendência é que haja interessados, sim, mas não em busca de lucro financeiro direto: em busca da influência que proporciona modalidades várias de lucro, inclusive o que pode parecer apenas político.

O que está acontecendo na mídia dos Estados Unidos sugere o que poderia acontecer por aqui, se já estivéssemos com presença de capitais interessados também na autocensura, para servir ao seu governo e sem considerar as condições diferentes do Brasil. O exemplo é até tímido diante de outras hipóteses, fáceis de imaginar-se. E, mesmo que não se chegue a situações extremas, um sócio com 30% de uma empresa não será passivo diante de liberdades que não sirvam aos seus interesses, no mínimo, de investidor."


"Captações de US$ 1 bi no exterior" copyright Valor Econômico, 13/12/01

"O mercado externo melhorou ainda mais para o Brasil e uma verdadeira enxurrada de emissores brasileiros lançaram títulos no total de quase US$ 1 bilhão. Foram US$ 500 milhões da Ambev, mais US$ 300 milhões do Banco do Brasil, mais US$ 125 milhões do Bradesco, mais US$ 50 milhões do ABN-Amro e mais US$ 20 milhões da Editora Abril.

Os emissores aproveitaram a procura forte por ativos de países emergentes, após a nova queda nos juros básicos americanos determinada pelo Fed, banco central dos EUA, anteontem. Os títulos de empresas, bancos e governo americanos passaram a pagar juros considerados baixos demais. Os investidores correram para comprar papéis de maior rendimento. O C-bond, o título da dívida brasileira mais negociado no mercado secundário, fechou com preço acima de 77,43% do valor de face pela primeira vez desde o dia 18 de abril.

A Ambev aproveitou a demanda e vendeu, por meio da subsidiária Companhia Brasileira de Bebidas, US$ 500 milhões em títulos. Os papéis têm cobertura de risco político -contra expropriação e impossibilidade de conversão de reais para dólares- por 24 meses da seguradora Steadfast, da Zurich.

O rendimento ficou em 10,739% ao ano e o cupom (juro nominal) em 10,5% ao ano e o prazo de vencimento foi definido em dez anos. Segundo rumores do mercado, a empresa não deve trazer os recursos ao país. Vai usar o dinheiro para investimentos -possível aquisição- de empresas em outros países.

Já o Bradesco lançou US$ 125 milhões em uma operação de dívida subordinada, a primeira na sua história. A dívida subordinada é assim chamada pois, em caso de falência, é a última a ser paga. Fica subordinada ao pagamento dos demais credores. Só os acionistas recebem depois. O impacto no balanço do banco também é diferente: não entra como passivo, mas sim como base de capital, aumentando o patrimônio líquido. Reduz a alavancagem do banco.

Segundo o diretor do Bradesco, José Guilherme Lembi de Faria, a folga extra no índice de Basiléia do Bradesco (capital sobre os ativos ponderados pelo risco) será de 0,5 pontos percentuais. O índice estava, antes da captação, em 13,2%, disse Lembi de Faria.

A operação do Bradesco era para sair na época do atentado terrorista aos EUA do dia 11 de setembro. ?Tínhamos até marcado um ?road show? que iria começar no dia 13 de setembro?, contou o diretor do Bradesco. Em setembro, o mercado falava em títulos de US$ 200 milhões, mas os papéis foram oferecidos pela Lehman Brothers no total de US$ 150 milhões, dos quais US$ 125 milhões foram vendidos.

?Tínhamos demanda para mais. Mas, por decisão conjunta nossa e do Bradesco, resolvemos emitir US$ 125 milhões agora?, afirmou Alceu Lima, representante da Lehman Brothers no Brasil. Segundo ele, a estratégia é fazer os preços subirem no mercado secundário, mantendo uma demanda forte não atendida, para em 2002 fazer uma outra colocação, que poderá até ter um valor maior do que a atual.

?A captação de dívida subordinada será a primeira de muitas?, disse Lembi de Faria. A classificação de risco de crédito do papel foi A3, pela Moody?s, por causa do seguro de risco político da Zurich. Os títulos alcançaram grau de investimento (?investment grade?) e puderam ser comprados por investidores mais conservadores, como as companhias de seguros e fundos de pensão europeus e americanos.

Segundo Lembi de Faria, o tipo de investidor de dívida subordinada tem de ser ?muito qualificado?, pois os riscos são maiores do que em um título comum. Apesar disso, os papéis, de vencimento em dez anos, pagaram menos do que os títulos da Ambev: 10,25% ao ano de cupom e 10,534% ao ano de rendimento.

O Bradesco não pretende trazer ao Brasil os US$ 125 milhões. Os recursos serão mantidos na subsidiária do Bradesco das Ilhas Cayman.

O Banco do Brasil lançou ontem todos os detalhes da operação de captação externa de US$ 300 milhões lastreados no fluxo de recursos externos ao Brasil em diversas moedas, em uma clássica operação de securitização. Para tal, foi criada uma empresa de propósito específico, a ?Dollar Diversified Payment Rights Finance Company?, que vai emitir os papéis. O prazo dos títulos será de sete anos, com cinco anos de vida média, e o cupom proposto foi de 7% ao ano.

Até mesmo a Editora Abril e o ABN-Amro, que têm vencimentos de dívida externa em dezembro e haviam decidido no final do mês passado não lançar papéis neste mês, mudaram de idéia com a melhoria surpreendente no mercado externo.

A aprovação inicial na Congresso brasileiro da lei que permite a participação de capital externo no setor de mídia e telecomunicações trouxe uma procura forte demais por papéis da Editora Abril, Globopar e TV Bandeirantes, disse Carlos Gribel, sócio-diretor da Eurovest Securities, que está liderando a captação da Abril. A empresa resolveu aproveitar e lançar US$ 20 milhões por um ano, pagando rendimento de 11,5% ao ano e 11% ao ano de cupom. O ABN-Amro tem vencimento de US$ 50 milhões neste mês e lançou bônus de prazo de dois anos pagando juros de 6,75% ao ano ao investidor."


"Deputados aprovam uso de capital estrangeiro na mídia" copyright Folha de S. Paulo, 12/12/01

"A Câmara dos Deputados aprovou ontem a proposta de emenda constitucional que permite a participação de capital estrangeiro nas empresas de comunicação.

A proposta será submetida a votação em segundo turno na Casa, provavelmente na próxima semana, para depois seguir ao Senado. O placar registrou 406 votos a favor, 23 contrários e 2 abstenções. Eram necessários 308 votos para aprovação da proposta.

O projeto permite a participação em até 30% de capital estrangeiro em jornais, revistas e emissoras de rádio e TV. Permite também que pessoas jurídicas nacionais possam participar de até 100% das empresas. Hoje, apenas brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos podem ser proprietários de jornais, revistas, rádios e TVs.

?A partir de agora, nossas empresas vão se capitalizar, se modernizar, aumentar o mercado de trabalho e melhorar a qualificação profissional. Vamos também preservar a nossa cultura?, afirmou o relator, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).

O texto aprovado foi resultado de um acordo entre deputados governistas e de oposição com o apoio de entidades representativas de empresas jornalísticas.

O PDT foi o único partido a fechar questão contra o projeto. O deputado Vivaldo Barbosa (PDT-RJ) leu carta do presidente do partido, Leonel Brizola, no plenário considerando o projeto uma ?ameaça à liberdade de opinião? no país e ?lesão inédita à soberania nacional?.

O PT e o PC do B, apesar de defenderem o voto a favor, criticaram o projeto. ?Nós estamos abrindo mão de um setor da economia nacional?, afirmou o líder do PC do B, Inácio Arruda (CE).

Ontem, depois de quatro horas de reunião com deputados de oposição (PT, PPS, PSB e PC do B) e consultas a entidades das empresas de comunicação, o relator fechou o texto que foi votado.

Para costurar o acordo, Henrique Alves atendeu a mais uma reivindicação da oposição, incluindo dispositivo para garantir a prioridade de profissionais brasileiros na produção de programas nacionais. ?Queremos garantir o mercado de trabalho para os brasileiros?, disse Eduardo Campos (PSB-PE).

O texto fechado após o acordo também estabeleceu que lei ordinária vai adequar os meios de comunicação eletrônica, como internet e TV por assinatura, aos princípios constitucionais aos quais já estão subordinadas as emissoras de rádio e TV.

Pelo dispositivo, a produção e a programação devem seguir os princípios de promoção cultural, finalidade educativa e regionalização da produção. O texto aprovado estabeleceu que a responsabilidade editorial e a definição do conteúdo da programação serão dos sócios brasileiros.

Após a promulgação da emenda, os congressistas terão de aprovar lei estabelecendo as regras para a entrada do capital estrangeiro, incluindo as normas para fiscalizar o cumprimento da lei."