JB

Depois de 39 anos deliciando os seus leitores com o traço sensual, alegre e efetivamente irreverente, Lanfranco Aldo Ricardo Vaselli Cortelini Rossi Rossini, vulgo Lan, está no Globo desde terça, 12/2 O Jornal do Brasil perdeu uma de suas marcas e entregou ao concorrente um dos símbolos do Rio. Entregar é ato voluntário:

LAN

por livre e espontânea vontade, o jornalão abdicou de
uma de suas atrações para presentear o adversário.

Foi uma demissão homeopática: há seis meses, depois de profundas elocubrações estéticas e mercadológicas, a equipe de plantão no comando da redação do JB, resolveu tirar Lan do seu lugar cativo na última página da "Revista de Domingo". E enfiaram-no no miolo do caderno em meio aos pequenos anúncios. A tática é conhecida, velha como a perversidade, e aplica-se aos nomes e atrações tradicionais: escondê-las devagarinho, bem devagarinho, até que o público não perceba o sumiço.

No último passaralho (não é palavrão, está dicionarizado), fim de ano, afinal, a degola: comunicaram a Lan que estava dispensado. O Globo contratou-o imediatamente para uma colaboração semanal anunciada em grande estilo na primeira página da edição de sábado (9/2) e iniciada com todas galas e paetés na terça de Carnaval.

Criou-se na mídia brasileira o mito de que os cofres do Grupo Globo são imbatíveis, nenhum profissional resiste às suas tentadoras propostas. Lérias, aconteceu algumas vezes, mas Lan foi oferecido ao antigo vespertino embrulhado para presente, com os cumprimentos da diretoria do matutino. No exato momento em que comemorava o retorno à Avenida Rio Branco.

Estas quase quatro décadas de Lan no JB são significativas, marcam dois momentos da historia do jornal e refletem as profundas mudanças na imprensa brasileira no período. Quando Lan foi convidado para uma charge diária, em janeiro de 1963, este Observador, recém-chegado ao JB (um ano antes), encontrou alguma resistência da parte dos colegas remanescentes do processo de reforma iniciado em 1956. Os reparos eram de natureza conceitual ? o traço "brigaria" com a concepção concretista dos volumes, a mancha dos textos e fotos contrastando com os claros. Segundo eles, não havia lugar para o desenho, com suas retículas, meios-tons, riscos e brancos.

Há sempre lugar para o talento quando se pretende fazer bom jornalismo. Lan em 1963 e 2002 é a prova disso.

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volta ao lar do traço do Rio ?
Laura Antunes (Entre Aspas,
copyright O Globo, 9/2/02)