CRISE NO NEW YORK TIMES
“Sinto-me grato de ter Joe Lelyveld, um editor de talentos soberbos e feitos fenomenais por sua vontade em gerar liderança jornalística forte, como o novo editor-executivo e administrativo selecionado”. Quem discursa é Arthur Sulzberger Jr., em release enviado por The New York Times Company em 5/6. “Enquanto as últimas semanas foram difíceis, permanecemos leais em nosso compromisso com os empregados, leitores e anunciantes, para produzir o melhor jornal possível ao aderir aos mais altos padrões de integridade e jornalismo.”
Lelyveld tem 66 anos e aposentou-se em 2001, após servir de editor-executivo por sete anos. Sob seu mandato, o Times ganhou 12 prêmios Pulitzer, introduziu cores nas páginas, adicionou novas seções e expandiu a circulação nacional.
Trabalhou na sucursal de Washington e foi correspondente em lugares como Congo, Índia, Paquistão, Hong Kong, Londres, além de duas vezes na África do Sul, em 1965 e entre 1980 e 1983. Ele também esteve na equipe de redatores e colunistas da revista do Times. Voltou a Nova York como editor de internacional em 1987 e tornou-se editor-administrativo, segundo cargo executivo mais alto na redação, em 1990. Em 1994 foi nomeado editor-executivo.
Desde que saiu do Times, Lelyveld tem sido um free-lancer ativo, escrevendo para The New York Review of Books, The New Yorker e The New York Times Magazine. Seu livro, Move Your Shadow, que descreve décadas de conflitos raciais na África do Sul, ganhou o Pulitzer de não-ficção em 1986. Lelyveld graduou-se em 1958 pela Universidade de Harvard em História e Literatura Inglesa. Formou-se em Jornalismo na Universidade de Colúmbia, em 1960, e recebeu título de mestre em História Americana na mesma Harvard.
Agora, Lelyveld substituirá Raines, de 60 anos, que se tornou editor-executivo do New York Times em 2001, após ter cuidado da página de editoriais do jornalão desde 1993. Antes, esteve na sucursal de Washington, como chefe de redação, desde 1988. Ele entrou no Times em 1978, na sucursal de Atlanta.
Boyd tem 52 anos. Foi nomeado editor-administrativo do Times em 2001, após ter sido subeditor-administrativo a partir de 1997. Boyd também foi co-editor sênior da série “How Race is Lived in America” (“Como a raça é vivida na América”), publicada no Times e vencedora de um Pulitzer em 2000, por melhor reportagem nacional.
Beatriz Singer
No mesmo dia em que o NY Times saiu com um editorial que explicava a saída dos dois principais editores, o Wall Street Journal saía com um editorial pérfido, atacando o concorrente. Os títulos já dizem muito: respectivamente “Liderança no Times” e “Turbulência no Times“.
“O bem-estar de uma grande instituição é sempre mais importante que as carreiras das pessoas que a dirigem. Raines e Boyd entenderam isso, e por essa razão escolheram sair”, disse o Times. No mesmo dia, 6/6, o WS Journal deduzia que, por menos informado que fosse sobre a cultura interna do Times para dissecar seus problemas administrativos, Howell Raines e Gerald Boyd “perderam toda a confiança da redação, e talvez também do proprietário”.
“O bem de qualquer instituição particular depende de seus funcionários, mas esta depende também da confiança dos leitores, baseada na crença de que todos os dias o jornal se esforça ao máximo para fazer tudo certo”, afirmou o editorial do Times. Em seguida, mais retórico, ensinou que “o jornalismo é um negócio imperfeito, envolve trabalhos de reportagem, entendimento e escrita sobre a complexidade de questões humanas. Como qualquer empreendimento humano, jornalismo não é perfeito. Mas deve sempre caminhar na direção da perfeição.”
O Journal parecia rebater: “Como concorrente, estivemos a par da recente crise do New York Times. Mas a demissão dos dois editores de primeiro escalão é notícia suficiente para iniciar uma discussão sobre padrões jornalísticos em geral”. E espezinhava: “Este é um país livre, e talvez o Times tenha decidido que quer que seus repórteres expliquem o mundo de forma tendenciosa. Isso é tradição na Europa, onde jornais e suas equipes devem se posicionar à direita (Le Figaro) ou à esquerda (Le Monde), e já foi real em jornais americanos também. Se o Times quer voltar a essa época, seus editores seriam mais felizes se saíssem do armário e admitissem sua parcialidade. A confusão se dá quando um jornal prega um padrão de justiça e objetividade, mas pratica outro”.
Sobre o escândalo de Jayson Blair, o Times afirmou estar em “introspecção forçada” desde que o caso veio à tona. Essa introspecção “será, a longo prazo, saudável”, disse o editorial. “Uma série de sucessos espetaculares pode nos ter tornado muito arrogantes, muito confiantes de que o futuro apenas traria mais do mesmo sucesso. Agora, estamos reexaminando algumas regras e estruturas internas”. O editorial lembra que o Times tem um nome forte e isso está ajudando a reerguer tanto a redação quanto a credibilidade do jornal.
O Journal puxava pelas ofensas. “Desvelada a saga de Jayson Blair, o comentário deprimente que ouvimos freqüentemente tem sido algo como ?o que há de novo? Os jornais não fazem isso o tempo todo?? Não, não fazem. A melhor notícia que pode surgir do turbilhão Times seria o renascimento dos padrões jornalísticos fora de moda e sem rodeios”.
Não haveria melhor oportunidade para o conservador e classudo Journal atacar a índole liberal do concorrente. Vale lembrar que o Times foi o único grande jornal a se posicionar contra a guerra no Iraque.
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