NOS CAFUNDÓS
Algo estranho apareceu no encontro anual dos editores de jornais do Kansas no mês passado: notícias internacionais. A reunião normalmente trata de assuntos geograficamente próximos, como circulação e política local. Mas pela primeira vez em muito tempo, o principal tópico foi notícias de além-mar ? como aumentar o espaço dedicado a elas no jornal, como torná-las relevantes ao público, como explicar assuntos complexos como fundamentalismo islâmico etc.
Seguindo a tendência dos jornais médios e pequenos dos EUA, os diários do Kansas estão engordando a seção internacional após os ataques de 11 de setembro e com o conflito no Afeganistão. Preocupações, no entanto, já estão emergindo. Segundo reportagem de Seth Sutel [The Associated Press, 13/11/01], o interesse do leitor americano quanto a notícias do resto do mundo já míngua, uma vez que pequenos jornais há muito tempo apresentam índice de leitura desse tipo de notícia em declínio.
Jeff Burkhead, diretor executivo da Kansas Press Association e responsável pelo encontro do dia 27 de outubro, disse que há dois meses "leitores de uma cidade pequena do Kansas não teriam o menor interesse no Afeganistão". Hoje, diz, "há mais interesse lá fora". No entanto, parece que já está na hora de repensar a mudança. Bob Ashley, editor do Owensboro Messenger-Inquirer, a oeste de Kentucky, disse que já está cortando notícias estrangeiras porque seus leitores estão "perdendo parte da adrenalina das primeiras duas semanas". "Senti certa monotonia nas reportagens", disse. Muitas pessoas estão tentando normalizar suas vidas e voltar a ser o mais ocupadas possível, na opinião de Ashley.
Ashley disse que os leitores não se mostraram interessados por outros assuntos estrangeiros, tais como a crise financeira na Argentina ou o conflito político na Irlanda do Norte. Apesar de tudo, editores de jornais menores dizem ainda lutar para tornar reportagens de além-mar mais interessantes e relevantes à vida do leitorado. A atual conjuntura, para Joe Distelheim, editor do The Huntsville Times, no Alabama, fez os EUA "mais conscientes da importância das notícias internacionais."
FALHAS DE SEGURANÇA
"Há uma diferença entre estar alerta e estar intimidado. Esta nação não será intimidada." As recentes palavras de Bush ecoaram na cabeça de muitos jornalistas americanos como Mike Fancher [The Seattle Times, 11/11/01], preocupados com a forma de levantar ao leitor questões como segurança, segredo de Estado e imprensa.
Nos dias subseqüentes aos ataques terroristas que trouxeram abaixo o World Trade Center e parte do Pentágono, o Seattle Times publicou diversas reportagens sobre falhas potencialmente mortais nos aeroportos americanos, assunto que foi ignorado pela mídia por muitos anos.
Alguns leitores perguntaram se o Times deveria mesmo chamar atenção a tais problemas de sistemas de segurança. As mesmas críticas foram feitas a reportagens sobre vulnerabilidade da comunidade frente ao bioterrorismo.
De todo o alvoroço que a cobertura das ameaças de segurança nos novos tempos trouxe ao Times, uma reportagem em especial, publicada em 4 de novembro, provocou o leitorado. Intitulada "Venenos antigos, preocupações novas", chamava atenção para sítios do nordeste que armazenam combustível nuclear e armas químicas. "Nosso país, de acordo com a ONU, passou anos tentando localizas onde estavam estocadas e as armas químicas do Iraque. O artigo de capa do Times de domingo deu a possíveis terroristas o mapa da mina. O que vocês estavam pensando? Esse é o pior caso de jornalismo irresponsável que vejo há muito, muito tempo", disse um leitor, entre diversos outros.
O jornal, no entanto, acha a reação injusta. "Todos os problemas de segurança citados na reportagem do Times são conhecidos há anos, mas foram deixados de escanteio. Talvez recebam a atenção devida se a imprensa invocá-los", afirma Fancher, editor-executivo do jornal.
Os leitores devem falar quando as reportagens lhes incomodam, mas devem também dizer ao governo que o conteúdo desses artigos incomoda ainda mais. A cobertura do jornal, diz Fancher, não aumentará a vulnerabilidade dos EUA se os problemas forem devidamente dirigidos. "Pense nessas reportagens como um aviso para estar vigilante."
LE NOUVEL OBSERVATEUR
Um grupo de oficiais da Força de Defesa de Israel (IDF) que mora na Europa abriu processo contra o semanário de esquerda Le Nouvel Observateur por escrever em sua última edição que soldados da IDF estupram mulheres palestinas. Segundo o veículo, os oficiais agem dessa forma porque sabem que o preço pago por essas mulheres é alto: são assassinadas por parentes que querem recuperar a honra da família. A ação contra a publicação foi oficializada em 14 de novembro.
Além do processo, o Ministério do Exterior está exigindo da revista um pedido de desculpas. A Observateur é lida pela elite intelectual parisiense, de acordo com informações de Herb Keinon [The Jerusalem Post, 14/11/01]. Um porta-voz do Ministério disse que a veiculação dessas mentiras em uma publicação respeitável mostra como Israel se tornou bode expiatório na Europa e como é possível hoje em dia escrever qualquer coisa sobre seu povo.