CASO JAYSON BLAIR
Carlos Alberto Martins Netto (*)
Chefes do New York Times pedem demissão após escândalo. Esta foi a manchete básica nos principais jornais do mundo depois que um repórter chamado Jayson Blair provocou a demissão do editor-executivo do NYT e de seu braço direito. Blair, o pivô do escândalo, conseguiu publicar várias matérias num dos principais jornais do mundo, simplesmente o New York Times. Os editores degolados, Howell Reines e Gerald Boyd, não puderam imaginar que um novato daria tamanho nó em jornalistas influentes.
O que Blair fez não pode ser considerado barriga (no jargão jornalístico, notícia errada), e sim uma senhora "pança" da mídia impressa.
Ex-jornalista do NYT, Gay Talese, autor, entre outros livros, de O reino do poder, que conta a história do famoso jornal onde trabalhou por 10 anos (entre 1955 e 1965), em entrevista a Roberto Dias, da Folha de S.Paulo (8/6), diz que a maioria dos jornalistas americanos ? e, acredito, também dos brasileiros ? não faz as matérias direito, confiando em informações dadas via fone, fax ou e-mail; além do que, não costumam citar a fonte.
É o que chamo de jornalista cansado: não corre atrás da notícia, espera que chegue até ele, muitas vezes de forma deturpada; fora isso há o fator "primeiro eu", a ansiedade pelo furo, que leva o repórter a gafes famosas, como a da Escola Base. Aqui, um jornalista copião consegue entrar com seu cavalo de tróia na badalada redação do NYT e fraudar matérias. Pior, sem que ninguém percebesse. Gay Talese se disse incrédulo: "Como pode o NYT permitir a entrada desse ridículo repórter sem que ninguém tenha obtido informações sobre o sujeito?". Talese comparou a omissão às falhas do 11 de setembro. "Eles deixaram passar pela segurança, assim como os pilotos entraram nos aviões que espatifaram as torres gêmeas."
O reflexo do outro
Um momento para refletir: quem nunca copiou uma receita de bolo, a bela frase de um filósofo, a velha máxima dos pais, e até "inocentes" colinhas na escola, como lembrete? Na mídia, então, nem se fala. Jornal copia jornal, TV copia TV e vice-versa. Quem duvida? É só dar uma olhadinha nas pautas! Até acho que o pior problema não está tanto em copiar, mas a maneira descarada como se copia, trocando apenas o nome do autor. Sem falar no que copia mau à beça. Muita gente identifica muita coisa parecida.
O mais grave é o plágio que, aliás, é considerado crime: ninguém pode assinar obra pertencente a outro, é canalhice. No jornalismo então nem se fala. O jornalista que faz uso desse artifício deveria perder o direito ao exercício da profissão, assim como o médico e o advogado que são punidos. Depois dessa mancada nova-iorquina, deve haver muito jornalista por aqui com a orelha em pé.
Que esse fato sirva, pelo menos, para alertar bons e sérios jornalistas que podem estar sendo plagiados, e também os "vampiros" de plantão da imprensa, que vivem de sugar o trabalho intelectual alheio. Toda escola, especialmente de Jornalismo, deveria incentivar o aluno a produzir conhecimento, e não apenas a reproduzir. O jornalista tem que participar do processo de informação, e nunca dispensar o trabalho reflexivo. Deve estar sempre atento à falsa projeção, como diz Adorno: "A projeção é falsa quando o sujeito constrói o real a partir da cega produtividade."
Não podemos viver do reflexo do outro.
(*) Professor