TRANSPARÊNCIA
Cláudio Weber Abramo (*)
Um dos principais antídotos contra a corrupção é a informação. O simples fato de o público ser mais informado lhe dá instrumentos de acompanhamento e cobrança dos governantes que, na ausência de informações, estariam ausentes. Um exemplo: há um par de anos, em Uganda, cerca de 80% dos recursos destinados às escolas sumiam pelo caminho. Quando iam procurar as verbas que caberiam às suas escolas, os respectivos diretores recebiam respostas desencontradas.
Após tentar sem sucesso diversos mecanismos administrativos, o governo ugandense bateu com uma solução simples e barata: todos os anos, uma vez definido o orçamento da educação, passou-se a publicar a lista das escolas e os respectivos montantes que deveriam receber. Isso deu aos diretores a arma de que precisavam para pressionar a estrutura administrativa. Ao mesmo tempo, as escolas passaram a afixar as verbas alocadas, as quantias recebidas e sua destinação. Dessa forma, as comunidades passaram, também elas, a dispor de um mecanismo de controle sobre as unidades escolares.
Os resultados vieram depressa. Em 2000, dois anos após a implantação da medida, a porcentagem dos recursos que passaram a chegar às escolas havia se elevado a 95%.
O exemplo é simples, mas demonstra bem o poder da informação. De forma mais geral, quanto mais a informação chega ao público, mais este tem meios de controlar o governo. É por isso que uma imprensa independente constitui um dos pilares do controle social do Estado e, em particular, do combate à corrupção.
No Brasil, a Constituição define formalmente a independência da imprensa, mas na prática a história é outra. Embora existam no país muitos milhares de jornais, revistas e programas noticiosos de rádio e televisão, apenas um punhado pode ser considerado independente. É o punhado que alia uma propriedade desligada das forças políticas e econômicas a uma saúde econômica suficiente para não precisar do Estado e dos interesses econômicos locais para sobreviver.
Em parte dos estados brasileiros, a virtual totalidade da mídia é possuída pelas mesmas famílias que dominam tanto a vida econômica quanto a política. Collor de Mello em Alagoas, ACM na Bahia, os Maias e os Alves no Rio Grande do Norte, os Jereissati no Ceará, as dinastias de estados do Sul como o Paraná, formam um padrão coronelístico que mantém a informação sob pesada disciplina. Nessas condições, o controle exercido pela mídia é, na melhor das hipóteses, esporádico.
Jornalistas vivem esse tipo de dilema desde sempre. Os limites da atuação profissional lhes são rapidamente exibidos, em geral implicitamente. E, mesmo quando conseguem manter independência pessoal, não são todos os ambientes que a toleram. O que pode fazer o jornalista nessas condições? Por exemplo, o sujeito que trabalha num jornal médio de alguma capital de estado pobre e meio esquecido pela "grande" mídia nacional?
Uma possibilidade é ajudar grupos a montar mecanismos de informação paralelos, conhecidos como "Observatórios". Por exemplo, um Observatório de Licitações, publicado na internet, dá informações sobre os processos de compras realizados num município. Um Observatório do Legislativo informa sobre o comportamento de vereadores. Iniciativas relativamente simples como essas podem fazer uma grande diferença, dependendo do grau de (des)informação da cidade. Como têm experiência na seleção e organização de informações, eles podem ajudar grupos interessados em manter observatórios desse tipo. É uma forma de combater a corrupção que requer esforço relativamente pequeno.
(*) Secretário-geral da Transparência Brasil <http://www.transparencia.org.br>. E-mail: <cwabramo@uol.com.br>