Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Jornalistas "de envelope"?

ÁSIA

Recentemente, numa estação de TV da Tailândia, a energia elétrica acabou no instante em que se fazia uma crítica ao primeiro-ministro Thaksin Shinawatra. A emissora acusa o governo. Se for verdade, este será só mais um episódio na difícil situação da imprensa no sudeste asiático.

Empobrecidos e censurados, os jornalistas são pressionados a apoiar os governos. Na Indonésia, por exemplo, segundo a Aliança dos Jornalistas Independentes de Jacarta, 80% deles se consideram profissionais "de envelope", ou seja, recebem suborno para fazer vista grossa aos fatos e publicar o que o poder local pede. Muitos têm salário de até US$ 100. Um antigo ministro da Justiça, Ali Said, disse: "Tenho mais medo de 10 soldados que de 100 jornalistas, porque deles posso me proteger com 100 envelopes".

Após a crise econômica na região, há cinco anos, esperava-se da imprensa postura mais transparente. Contudo, os governos não deixam muito espaço para a liberdade de imprensa, e os EUA reduziram o apoio financeiro aos veículos de comunicação. Na década passada, o governo Clinton criou programas de fortalecimento da mídia, mas George W. Bush, após o 11 de setembro, desviou o dinheiro para o ensino básico.

A crise causada pelos ataques terroristas também fez com que países com população islâmica se fechassem mais às publicações estrangeiras. Na Malásia, alguns veículos, como a Time, tiveram restrições de circulação. Bangladesh recolheu neste mês uma edição da Far Eastern Economic Review por chamar o país de "casulo do terror".

PERU

Mães e viúvas de jornalistas peruanos mortos em 1983 no vilarejo de Uchuraccay pediram, no dia 11/4, a uma comissão que investiga as causas das mortes de 30 mil pessoas entre 1980 e 2000, que a verdade sobre o incidente seja apurada. Elas acusam o governo. "Esta pode ser minha última chance. Para mim, o crime continua impune. Tudo que peço como mãe é justiça", exige Gloria Trelles, que perdeu um filho, Jorge, na época com 22 anos.

O grupo, de oito pessoas, se dirigia à vila, na província de Ayacucho, para verificar informação do governo de que a população local teria matado sete guerrilheiros do Sendero Luminoso, grupo originário da região. O exército, como estratégia contra os rebeldes, vinha estimulando tais ações, e este seria o primeiro caso de sucesso. Ao chegarem a Uchuraccay, os repórteres foram assassinados com pedradas e golpes de ferramentas agrícolas.

O então presidente, Fernando Belaúnde Terry, nomeou o escritor Mario Vargas Llosa para chefiar comissão de investigação. Em um dia concluiu que os camponeses confundiram os jornalistas com guerrilheiros, tomando as compridas lentes das máquinas fotográficas por armas. O povo de Uchuraccay quase não fala espanhol, o que teria ajudado no equívoco.

"Esses camponeses são boa gente, não são como diz o senhor Vargas Llosa. Eles veneram a morte e não seriam capazes de enterrá-los nus, dois em cada cova, com o rosto para baixo. Isto é obra de soldados e eles precisam ser punidos", denuncia Eudocia Reynoso, viúva do repórter Felix Gavilan, que falava quéchua, língua da região.

As famílias que se apresentaram à Comissão da Verdade e da Reconciliação repudiam a investigação de Vargas Llosa, que nunca teria tido intenção de resolver o caso. Segundo a AP [12/4/02], três moradores do vilarejo foram condenados a 25 anos de prisão pelos assassinatos. Gloria lembra que um deles, no julgamento, disse que se contasse o que realmente aconteceu seria morto com a família.