Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Laura Mattos

CASA DOS ARTISTAS

"A criação do real" copyright Folha de S. Paulo, 11/12/01

"A cinco dias de chegar ao final, o ?reality show? ?Casa dos Artistas? (SBT), programa de TV mais polêmico do ano, começa a se tornar um assunto importante para acadêmicos da comunicação.

Além da já batida discussão sobre o voyerismo na televisão, que entrou nas rodas intelectuais há mais de um ano com a primeira versão de ?No Limite?, da Globo, a atração do SBT traz um novo debate: como a edição consegue transformar 24 horas por dia de captação de imagens ?reais? em um verdadeiro enredo de novela.

É essa criação da narrativa, acreditam especialistas, um dos principais segredos da audiência do programa, que tem batido a da Globo nas edições dominicais desde a estréia, em 28 de outubro -anteontem, a média foi de 41 pontos no Ibope contra 22 do ?Fantástico?, na Grande SP.

Os telespectadores, como se acompanhassem uma novela, são levados pela edição a querer saber como a ?história? continua. O reforço vem do narrador, que diz frases como: ?Será que eles vão fazer as pazes? Veja amanhã?.

?A edição quase obedece a um script. Interessa à direção criar uma história ou várias histórias, o que se assemelha à teledramaturgia. O casal Supla e Bárbara (concorrentes do ?reality show?) funciona da mesma forma que Jade e Lucas (personagens da novela da Globo ?O Clone?)?, diz a dramaturga Renata Pallottini, coordenadora do Núcleo de Pesquisa de Telenovelas da Escola de Comunicações e Artes da USP e autora de ?Dramaturgia de Televisão?.

Para ela, a técnica de criar uma novela com personagens ?reais? se apóia em dois pontos: a produção e a edição. ?O programa é duplamente roteirizado. Primeiro pela maneira como é produzido: o que haverá na casa, os jogos, as regras. O processo segue na edição: a seleção de cenas que formem uma sequência narrativa e definam o vilão, a heroína, o mocinho. De espontâneo, não há nada, mesmo porque eles sabem que estão sendo filmados e podem encarnar os personagens.?

Lauro César Muniz, autor de novelas da Globo e um dos criadores da Associação de Roteiristas de Televisão, diz que vê ?com grande curiosidade? o fenômeno ?Casa dos Artistas?. ?Assisti a alguns episódios para saber como era essa ?construção da dramaturgia espontânea? e achei muito interessante. As pessoas costumam dizer que é vazio. Em alguns aspectos pode até ser, mas é humanamente muito rico?, afirma.

Ele percebe características claras de um roteiro de novela no ?reality show?. ?Para o processo de dramaturgia funcionar, é preciso haver um conflito. No programa, ele existe porque todos querem o mesmo prêmio, e há a eliminação por voto. O enriquecimento da tensão é gerado pelo confinamento. Na edição, há a síntese do que ocorre no dia, valorizando as relações humanas e criando a identificação do público com cada tipo de personagem.?

A técnica não é exclusiva de ?Casa?. Faz parte da essência do formato ?reality show?. A gincana de Silvio Santos, no entanto, está mais para melodrama do que ?No Limite?, principalmente pelo fato de ter edições diárias, enquanto o outro é semanal.

O intervalo maior é menos favorável à sequência narrativa. A novela da ?vida real? chegará à Globo em 2002, com a estréia de ?Big Brother?, que será diário.

Para ter detalhes de como se dá a edição de ?Casa dos Artistas?, é preciso tempo, paciência e o ?pay-per-view? da DirecTV, que transmite o confinamento ao vivo, 24 horas. A reportagem da Folha acompanhou os artistas por dois dias, na semana passada, e comparou com as duas edições feitas desse material para o SBT.

Além de cortar assuntos polêmicos, principalmente os que envolvam pessoas de fora do programa, a edição se concentra no romance de Bárbara e Supla e nas intrigas do jogo de eliminação.

Esse verdadeiro enredo de novela só é quebrado quando são realizadas provas e brincadeiras.

Mas, na ?vida sem edição?, eles não passam o dia falando da votação, criando intrigas ou se divertindo. E Supla e Bárbara não ficam 24 horas se beijando ou discutindo a relação. Há horas e horas de nada, de Alexandre Frota deitado no sofá olhando para o teto, de Mari Alexandre lendo ?Estação Carandiru?, de Patrícia Coelho abraçando a almofada e de conversas sobre bolo de fubá.

E, quando o papo esquenta e os artistas começam a falar dos bastidores do mundo ?celebrity?, vem a atenta produção e muda a câmera para o quintal vazio. Criar ?o real? é bem mais difícil ao vivo."

***

"Conversas picantes são cortadas ao vivo" copyright Folha de S. Paulo, 11/12/01

"A ?mão-de-ferro? da edição de ?Casa dos Artistas? não está apenas no compacto de 30 minutos dos melhores momentos, exibido diariamente pelo SBT, às 21h.

Na transmissão 24 horas, em ?pay-per-view? pela DirecTV, a edição aparece na seleção das câmeras (há 35 espalhadas pela casa) e microfones (33, além dos que ficam com os concorrentes). Cortam diálogos polêmicos, mostrando um ambiente vazio ou cortando o som.

Há uma semana, por exemplo, todos os concorrentes estavam na sala fazendo um jogo da verdade. Alexandre Frota contava que tinha um filho de dois anos.

?Conheci uma menina, ficamos juntos por um mês. Um tempo depois, ela ligou: ?Estou grávida e vou ter o filho?. Tudo bem, porque sou contra essa coisa de… tipo o Edmundo e o Romário fazem, de engravidou…? A transmissão do jogo é interrompida e trocada por uma imagem da piscina, sem ninguém, completo silêncio, por mais de um minuto.

Outro exemplo: todos estavam na piscina falando sobre ?podres? dos bastidores da TV. O som era cortado em várias ocasiões, às vezes por mais de dez minutos, deixando no ar citações de Boni, Gugu e Silvio Santos. ?…Gugu, na hora de assinar o…?, ?…O Silvio sabia de tudo…?, ?Aí o Boni falou…?. Com um pouco de atenção, dava para ler nos lábios algumas reações dos ouvintes. Mari: ?Não acredito!?. E Supla: ?P. que o pariu!?.

Rodrigo Carelli, diretor do programa, diz que, ?tanto na edição diária quanto na transmissão pela DirecTV, tenta-se preservar a imagem de pessoas que não fazem parte do elenco?."

"?Casa dos Artistas? acaba em saia justa" copyright Folha de S. Paulo, 15/12/01

"Se Silvio Santos não tiver mais nenhuma idéia mirabolante de última hora, ?Casa dos Artistas? (SBT) acaba amanhã e deve ser um verdadeiro show de saia justa.

A primeira será a do ?Fantástico?, que deve sofrer derrota histórica no Ibope. Desde a estréia de ?Casa?, em 28 de outubro, a atração da Globo nunca mais venceu.

Outra situação constrangedora deve ser o encontro entre Marta e Eduardo Suplicy. Eles aceitaram convite para a festa que reunirá os finalistas com seus familiares e os candidatos já eliminados.

A relação entre a prefeita de SP e o senador, pais de Supla -o favorito para vencer o programa-, não foi das melhores na última semana. Em entrevista à Folha, Suplicy fez críticas à administração da ex-mulher e a seu atual namorado, Luis Favre. Marta soltou nota, rebatendo as declarações.

Além dos dois, devem estar lá os pais de Patrícia Coelho, mãe, irmã e sobrinha de Alexandre Frota, as duas irmãs e um sobrinho de Bárbara, a mãe de Mari e seu noivo, Vavá. Daniela, namorada de Frota, estará no ?Terceiro Tempo? (Record) até 23h30 e tentará chegar no fim da festa. Se der, haverá mais saia justa, já que o namorado ensaiou romance com Patrícia.

Todos os convidados verão o programa em parte reservada da ?Casa? até o vencedor ser escolhido. Depois, encontram-se com os participantes para a festa, que também será transmitida. Ao todo, a atração deve durar quatro horas. Os candidatos devem ser eliminados pelo público por telefone até sobrar o vencedor, que leva R$ 300 mil. Enquanto isso, na Globo, o fim de ?No Limite? deve ser adiado, evitando o confronto."