QUALIDADE NA TV
CASSETA vs. CONGRESSO
"Casseta vira pauta no Congresso Nacional", copyright O Estado de S. Paulo, 19/05/01
"O humor do Casseta & Planeta entrou na pauta do Congresso Nacional – e na TV Câmara – pelas portas da indignação. Os redatores do programa vêm se esbaldando à custa do escândalo da violação do painel eletrônico no Senado. A caracterização de Bussunda como Antônio Carlos Fraudalhães é tão boa quanto a que ele fazia de Vera Fischer à época da novela Laços de Família.
Mesmo com o caso ACM, Arruda & cassação esfriando no noticiário (o racionamento de energia assumiu o primeiro lugar no ranking das preocupações nacionais), o Casseta não quis largar o mote das maracutaias em Brasília porque estava dando certo. A garantia do ibope de que estavam no caminho certo – o humorístico é o único programa da Globo que consegue bater o Show do Milhão, de Silvio Santos, com média entre 28/29 pontos em relação a 22/23 (na Grande São Paulo) do SBT – provocou o escorregão que colocou o Casseta & Planeta Urgente! no centro das preocupações dos parlamentares, em especial, os do sexo feminino.
Quarta-feira, o procurador da Câmara dos Deputados, Ricardo Izar, comunicou ao plenário que havia requisitado as fitas do programa exibido na noite anterior, constatado a ofensa às parlamentares e que estava tomando providências à altura da indignação de suas colegas.
O deputado Professor Luizinho, do PT, antes de entrar no assunto para o qual havia se inscrito, chamou a atenção dos colegas para tomar cuidado com o cerceamento à liberdade de expressão que poderia chamar a ?censura? à TV. Isso quer dizer que o assunto vai render muito. É interessante, mesmo porque só episodicamente ressurge a discussão sobre a TV brasileira.
É mais do que sabido que a sutileza não faz parte do repertório do programa da Globo (e de nenhum dos que vão ao ar, em todos os canais, sob a chancela de humorístico), mas o Casseta pegou pesado demais ao vestir a atriz Maria Paula de maneira bem vulgar para, toda ofendida, negar que era senadora. O texto era mais ou menos assim: ?Me respeite! Eu sou prostituta, ganho meu dinheiro honestamente!?
Como lembrou o deputado petista, o comportamento de muita gente no Congresso Nacional tem dado motivos para chacotas, mas não para o desrespeito. Até o politicamente incorreto (a marca da turma do Casseta & Planeta) precisa de certos limites. Brincar com personagens que estão sendo investigados publicamente por uma comissão do Senado, como é o caso do senador ACM, é divertido e justificado.
Mas jogar todos os políticos na vala comum da desmoralização – clichê atual neste Brasil que todo comunicador tenta passar a limpo – para fazer graça é um desserviço à democracia. E uma ofensa também ao telespectador que, depois de amargar mais de duas décadas de ditadura, escolhe por meio do voto – bem ou mal, mas essa é uma outra história – os defensores de suas aspirações e interesses no legislativo. (a jornalista Leila Reis escreve aos sábados neste espaço. E-mail: leilareis@terra.com.br)"
"Câmara estuda processar ?Casseta?", copyright Folha de S. Paulo, 17/05/01
"A Câmara vai interpelar judicialmente os responsáveis pelo programa humorístico ?Casseta & Planeta?, da Rede Globo, por causa do quadro apresentado anteontem à noite intitulado ?Deputados de Programa?.
A pedido do presidente da Casa, Aécio Neves (PSDB-MG), o procurador da Câmara, deputado Ricardo Izar (PMDB-SP), se reuniu ontem com advogados e deputadas que se sentiram ofendidas.
Izar estuda se será solicitado direito de resposta no mesmo horário, dentro do próprio programa, ou se será exigida uma retratação. ?Foi uma agressão?, afirmou, depois de assistir à fita do programa.
O quadro ?Deputados de Programa? mostrava os humoristas do ?Casseta & Planeta? vestidos de terno em uma rua. Os carros paravam, e eles propunham a venda de seus votos, em uma comparação com prostitutas.
Ao final, um ?repórter? que narrava a ?reportagem? pergunta a uma mulher se ela também é deputada. Demostrando estar ofendida, a personagem responde que ganha a vida honestamente, pois é prostituta e completa: ?Me respeite?. Izar diz que adotará medidas judiciais sempre que os deputados forem atacados."
DIGITAL
"Governo sugere fim de regalias de emissoras", copyright Folha de S. Paulo, 17/05/01
"Um grande embate está marcado para o dia 29, quando a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) promove em Brasília audiência pública para discutir a implantação da TV digital.
Mais do que os lobbies pelos sistemas americano, europeu e japonês, o que deve esquentar o debate será a reação das emissoras de TV aberta contra os dois relatórios recentemente divulgados pela Anatel e que servirão de base para a regulamentação do serviço.
Ao analisar os relatórios, técnicos da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV) descobriram que a Anatel pretende acabar com regalias das redes de TV, como a isenção de ICMS e alíquotas reduzidas de importações. Isso porque os relatórios da Anatel enquadram a TV digital como serviço de telecomunicações. A legislação brasileira considera emissoras de rádio e TV aberta como empresas de radiodifusão, que gozam de benefícios fiscais não estendidos às operadoras de telecomunicações (caso da TV paga, por exemplo).
Também assusta as emissoras de TV a possibilidade de a Anatel vir a fiscalizar seus serviços -inclusive o conteúdo. Hoje, tudo é resolvido em gabinetes políticos.
As emissoras poderão ir à Justiça caso a regulamentação enquadre a TV digital como telecomunicações, o que poderá atrasar a implantação. Para a Anatel, TV digital é telecomunicações por agregar serviços como internet."
PEARL HARBOR
"De volta a Pearl Harbor", copyright Valor Econômico, 18/05/01
"Aparentemente, apesar do status de potência bélica toda-poderosa, os EUA não gostam de guerra. Quem os forçou a entrar na Primeira Guerra? Os alemães, que botaram um torpedo no navio Lusitânia, pleno de cidadãos americanos. Na Segunda foi ainda pior. Os japoneses, malvados, atacaram de surpresa a base naval de Pearl Harbor, no Havaí, no dia 7 de dezembro de 1941, batizado num discurso inflamado de F.D.Roosevelt do ?dia da infâmia?. ?Remember Pearl Harbor? (parodiando a ira contra o Álamo, no tempo das diligências) virou palavra de ordem entre os ianques. A nação, ao contrário do que indicavam todas as pesquisas da época, estava unida para o conflito.
Às vésperas dos 60 anos do ataque, o tema está de volta como a revoada de Zeros sobre a ilha. Na segunda-feira, estréia, nos EUA, o filme épico ?Pearl Harbor?, com Ben Affleck e grande elenco, um lançamento da Disney de US$ 135 milhões que promete desbancar o sucesso de ?Titanic?. O ?blockbuster? chega ao Brasil apenas em junho. Mas é possível se preparar para a batalha da telona na telinha. No dia 27, às 21 horas, os assinantes do canal fechado National Geographic poderão assistir ao documentário ?Pearl Harbor: Legado do Ataque?, realizado pelo descobridor do Titanic (o real), Robert Ballard. Curiosamente, apesar do entusiasmo patriótico à Spielberg de ?O Soldado Ryan?, o documentário ajuda a colocar mais lenha na polêmica fogueira teórica de que os EUA sabiam que seriam atacados e preferiram não reagir.
Isso, porque Ballard passa boa parte das quase duas horas do programa em busca de um (dentre os cinco da frota nipônica) minissubmarino japonês afundando pelos americanos. Detalhe: mais de uma hora antes de os aviões chegarem na base. Logo, duas conclusões inusitadas: os EUA deram o primeiro tiro da guerra que se seguiu no Pacífico e, mais, embora cientes de que havia indícios de um ataque japonês nada fizeram para se proteger e impedir a trag&eaeacute;dia que matou 2.409 jovens marujos e pôs a pique 21 navios de guerra (os japoneses, por sua vez, só perderam 29 aviões e os tais cinco minissubs). O dia duplo da infâmia.
?Por três vezes a marinha americana se deparou com invasores antes do raid aéreo e nada fez. Era um domingo sonolento e os militares foram pegos cochilando?, disse Ballard ao Valor. Como em seus outros documentários (sobre o Titanic, o Bismarck ou a batalha de Midway), Ballard reuniu sobreviventes para resgatar o que chama de ?lado humano do drama naval?, incluindo-se japoneses que participaram do ataque a Pearl Harbor. ?É uma forma de contar a história e, ao mesmo tempo, curar as feridas. Durante a guerra, a propaganda antijaponesa era muito agressiva e até hoje há quem tenha essa imagem demonizada do Japão?, fala. ?A cada ano, morrem mil veteranos da Segunda Guerra e se vai com eles essa experiência. O documentário é uma chance de deixá-los falar?, completa.
Ao mesmo tempo em que persegue os restos do submarino ao redor da ilha, Ballard mergulha nos destroços do USS Arizona, o navio que sofreu as maiores perdas, afundou e hoje é um memorial. O cruzador permanece uma ameaça, desta vez ecológica, porque o óleo de seus motores ainda vaza nas águas da baía de Pearl Harbor, um fenômeno que os sobreviventes chamam de ?as lágrimas do Arizona?. Os peixes não têm razão de se comover.
?Por que o Japão queria entrar em guerra com os EUA? O que eles queriam eram os campos de petróleo da Indonésia, o estanho e a borracha da Malásia e as Filipinas por causa da localização estratégica. Ninguém pensou que atacariam Pearl Harbor. É assim que se surpreende numa guerra: atacando-se onde ninguém espera?, diz, no programa, o historiador Stephen Ambrose (o consultor de Spielberg em ?O Soldado Ryan?). Mas as perguntas não são respondidas pelo documentário.
O romancista Gore Vidal (e não está sozinho) usa essa mesma dúvida só que para atacar os EUA. ?Aqueles que negam que o Japão foi vítima de provocações dos EUA não sabem responder por que um paizinho distante atacaria o que já era claramente um vasto império continental como os EUA?, como escreveu há poucas semanas num artigo para o ?The New York Review of Books?, apenas desenvolvendo uma teoria esboçada em seu último livro, ?A Era Dourada? (Rocco). Para Vidal, o ataque a Pearl Harbor foi o resultado de uma série de provocações deliberadas de FDR ao Japão. O então presidente americano queria uma forma de poder ajudar os ingleses, submetidos aos ataques de Hitler. Mas Roosevelt sabia que os eleitores nem sequer cogitavam enviar seus rapazes para mais uma vez morrer pela democracia européia.
Assim, segundo o escritor, desde 1937, no famoso discurso de Chicago, FDR fustigava os nipônicos, exigindo uma quarentena contra seus avanços na China. Quando um navio americano, o Panay, foi afundado pelos japoneses, o imperador enviou prontamente um pedido de desculpas. E, continua Vidal, essa postura de ?luvas de pelica? continou até 1941, mesmo quando o governo japonês foi dominado pelos militares, com o General Tojo. Documentos recém-revelados mostram que os EUA queriam guerra e deram um ultimato a Hiroíto: ?O governo japonês deve tirar todas as suas forças da China e também renunciar à sua participação no Eixo?, dizia um documento secreto. Daí, foi um passo para a guerra. Diz Vidal.
E o que era melhor: sem que, em nenhum momento, o mundo sentisse ter partido dos EUA qualquer atitude de agressão. O ataque a Pearl Harbor foi planejado pelo almirante Yamamoto, um egresso de Harvard que temia despertar o leão ianque, mas sabia que atacar a frota ali estacionada era a única forma de deixar os americanos fora de combate por seis meses, caso o bombardeio fosse bem-sucedido. Em absoluto sigilo, seis porta-aviões, 350 aviões, os agora célebres minissubmarinos partiram para a ilha. Temia-se que os ?subs? pudessem chamar a atenção e destruir o efeito surpresa, mas ainda assim poderiam pegar os navios que tentassem fugir do porto. Todos os pilotos (dois para cada nave) sabiam que não sobreviveriam. Mas foram avistados e destruídos pela marinha americana e dois de seus tripulantes, capturados ao encalhar numa praia, foram os primeiros prisioneiros da guerra.
O documentário também traz outro lado pouco digno da tragédia: o racismo. Entre os marujos havia vários negros e um deles, Miller, não só salvou colegas a bordo do Arizona, como também derrubou dois caças japoneses. Um herói. Mas, ao contrário dos colegas brancos, premiados com altas honrarias, Miller ganhou uma medalha de segunda ordem. Então, o lugar reservado aos negros na marinha era servir os oficiais dos navios. ?Deus ajude o nosso país se Pearl Harbor for esquecido?, avisa, no programa, algo revanchista, o historiador Ambrose. Será que isso só vale para os agressores japoneses?
?Seja como for, assim como no caso do ‘Titanic’, o filme ‘Pearl Harbor’, vai gerar um frenesi pelo ataque nos EUA. Somos um país McDonald’s e temos que consumir tudo como se fosse ‘fast food’. Ainda assim, se as pessoas ficarem sensibilizadas e assistirem ao documentário para aprender algo real, valerá a pena?, assegura Ballard. A Disney aposta nisso. Apenas no primeiro fim de semana, serão gastos US$ 5 milhões para promover a fita, cujas duas horas de duração reservam 40 minutos para o ataque. O resto do tempo, como no filme de James Cameron, é para um triângulo amoroso entre os protagonistas da história. Saudades dos tempos em que filmes de guerra (como ?Tora! Tora! Tora!?, de Richard Fleisher, também sobre Pearl Harbor) sabiam que o verdadeiro drama não era o ?quem fica com a mocinha?, mas a morte inútil e violenta de tantos jovens."
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