Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Livro proibido é (enfim) lançado

CENSURA NO UNASP

Alunos de Comunicação do Unasp (*)

Liberdade vigiada ? Questão de opinião, de Ruben Dargã Holdorf, Imprensa Universitária/Unaspress, Engenheiro Coelho, SP, 2002, 287 pp.

Inicialmente proibido de ser lançado, o livro Liberdade vigiada ? Questão de opinião, do jornalista curitibano Ruben Dargã Holdorf, finalmente conseguiu se desvencilhar das algemas. Impedido de divulgação por um pró-reitor do Centro Universitário Adventista (Unasp), o livro fez jus ao título: a censura poderia desmoralizar esta instituição localizada na Grande Campinas. Venceu a Declaração de Chapultepec.

Didático mas polêmico, Liberdade vigiada foi alvo da mais vil censura prévia, comparada apenas aos tempos da ditadura no país, quando publicações recebiam o veto das autoridades. O motivo do constrangimento causado ao jornalista surgiu quando se analisou o texto “No reino da ?malan?dragem”, publicado em O Estado do Paraná, em 1996, republicado pelo Correio Popular de Campinas em 2000. Nele, Ruben critica veementemente o ministro da Fazenda, Pedro Malan, que acusa de “faltar com a verdade” e conduzir “com a barriga os interesses nacionais, mas com muita eficiência os negócios de norte-americanos e europeus”, rotulando-o de “burro” ou “bobo” no trato com os negócios do país. Se o artigo apresentasse problemas teria sido descartado pelos diretores de redação dos periódicos, Carlos Roberto Tavares (Charles) e Mário Evangelista, respectivamente. Além disso, não houve repercussão negativa contra Ruben na época.

Desrespeitando o Código de Direitos Autorais e a Declaração de Chapultepec, o pró-reitor responsável pela censura desconhece que “toda pessoa tem o direito de buscar e receber informação, expressar opiniões e divulgá-las livremente. Ninguém pode restringir ou negar estes direitos. Nenhum meio de comunicação ou jornalista deve ser censurado por difundir a verdade, criticar ou fazer denúncias contra o poder público”. Não se contentando em apontar o dedo em riste contra os artigos de política ? textos produzidos em O Estado do Paraná, de 1996 a 2000 ?, o censor desaprovou o prefácio do jornalista Elizeu Corrêa Lira, seu desafeto desde quando trabalharam na Casa Publicadora Brasileira, editora de livros localizada em Tatuí, interior paulista.

Proposta didática

Parecia premonição quando Ruben escreveu artigo denunciando a apreensão do jornal Laboratório da Notícia do Unicenp pela Polícia Federal. “Os alunos do Positivo não são os únicos a sofrer perseguição de figurões. Incrivelmente existe em todo o Brasil preocupação generalizada com os cursos de Jornalismo”, disse. Na proposta de exercícios, Ruben sugeriu aos alunos investigarem se outros cursos brasileiros de Jornalismo sofrem algum tipo de censura.

Infeliz coincidência, mas sua seleção de textos causou enjôo apenas na Pró-Reitoria do Campus Engenheiro Coelho do Unasp. Quem definiu se o livro seria lançado foi o reitor, Euler Bahia, que não percebeu desagravo à instituição de ensino, inclusive elogiando a iniciativa pioneira do professor do curso de Comunicação Social.

Tratando-se de material didático, os 102 artigos em Liberdade vigiada visam estimular à reflexão os alunos de Jornalismo, com propostas de pauta ao fim de cada texto. Divididos em vários assuntos, a maior seção é a de política, salientando-se críticas venenosas a governos municipais, estaduais e federal. Alguns dos textos são obras de produção literária, como os da seção de crônicas.

Sugestivamente, Liberdade vigiada estampa na capa duas mãos acorrentadas digitando num teclado. “Muitos acham que o jornalismo de opinião é livre, fácil de se desenvolver. Mas você fica amarrado pela linha editorial”, diz Ruben. “Não há nada mais vigiado em jornal do que o texto de opinião.”

Graduado em Jornalismo pela UFPR, especializado em Educação Superior pelo Unasp, ex-professor do curso de Jornalismo da UFPR, ex-jornalista de O Estado do Paraná, Rubem é atualmente professor do Unasp e responsável pelos sítios Agência Brasileira de Jornalismo <www.unaspress.unasp.br> e Canal da Imprensa <www.canaldaimprensa.com.br>, além de várias revistas do centro universitário.

Perguntado sobre seu artigo preferido e de maior repercussão, o autor citou “Proagindo com o HC”. Segundo ele, uma semana após a publicação deste texto, que apelava ao não-fechamento do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, a Prefeitura Municipal de Curitiba doou mais de quatro milhões de reais ao HC. “Texto de opinião não é só uma tribuna para criticar, atacar ou se defender de pessoas. O jornalista deve ter a visão de colaborar com o crescimento social”, salienta.

Apoio

Respaldados pela reitoria, por professores e alunos, tanto o livro quanto seu autor contaram com apoio de profissionais da área. O produtor da CBN-Recife, Heron Santana, considera “este livro ferramenta indispensável para quem deseja dar um passo adiante na difícil tarefa de comunicador”. “A obra é um instrumento essencial para preparar os futuros profissionais a serem também bons editorialistas”, recomenda Amarildo Augusto, repórter do Mogi News.

Ruben também recebeu aprovação dos ex-companheiros de redação de O Estado do Paraná. Adalberto Bueno, revisor-chefe, afirma valer “a pena ler com atenção cada página com tempo suficiente para saborear um estilo vivo, pensamentos claros e abordagem encarnada de um palavreado acessível, fazendo dele ? Ruben ? um comunicador sempre convincente”. O diretor-executivo do Paraná OnLine, Marcos Paulo Assis, considera a empreitada resultado da “competência e ousadia” do ex-editor/criador do site de O Estado.

Segundo o geógrafo paranaense Luís Roberto Halama, “a luta pela liberdade de expressão de forma completa e livre de pressões e censuras, posto que é um direito constitucional assegurado a todos os cidadãos, tem sido marcante na vida do jornalista e professor Ruben Holdorf.” Desde quando abraçou este ideal de liberdade de consciência e imprensa, Ruben tem sido vítima de ataques nada fortuitos, bem direcionados. A respeito da tentativa de se impedir o lançamento do livro e a ameaça de demissão, Ruben preferiu conservar o silêncio. “O importante é que o livro será lançado e eu respeito a opinião do pró-reitor, mesmo não concordando com a possibilidade de censura e até uma eventual demissão. Ele é meu superior e minha postura ética como profissional não permite qualquer retaliação.”

Lira, amigo desde a adolescência, define Ruben como “um pesquisador incansável, comprometido unicamente com a busca da verdade, um educador de vanguarda, arguto e visionário, e um jornalista competente que vive, come, bebe e respira jornalismo nos moldes dos melhores profissionais da área”. Indicado ao Prêmio Jabuti 2000, Lira julga Liberdade vigiada uma corajosa tomada de posição e veemente condenação aos desmandos e desvios éticos daqueles a quem exatamente cumpre o propalado dever de zelar pela feitura e aplicação de leis justas”. “Mais do que meros exercícios, a seleção de artigos com as suas respectivas pautas propicia uma rica incursão pelos temas básicos, essenciais mesmo, à constituição de uma visão real de mundo para os estudantes da área jornalística”, incentiva.

(*) Não se identificam por receio de retaliação.

Informações

Imprensa Universitária/Unaspress

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