Friday, 29 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Último Segundo

CASO MATARAZZO
Débora Pinho

“Seqüestro divulgado ? TV Globo é condenada a indenizar família Matarazzo”, copyright revista Consultor Jurídico, 23/8/01.

“A imprensa deve divulgar seqüestro antes que a polícia solucione o caso? O questionamento foi suscitado em um programa da rádio CBN depois do seqüestro da filha do empresário e apresentador Silvio Santos.

A questão é recorrente e os tribunais não chegaram a um consenso a respeito do assunto. Ou seja: até onde vai o direito à informação, a liberdade de expressão e o direito à intimidade e privacidade.

Em decisão recente, contudo, a primeira instância da justiça estadual paulista condenou a TV Globo por ter, hipoteticamente, colocado em risco a integridade de uma criança seqüestrada.

Para o juiz Teodozio de Souza Lopes, da 17? Vara Cível de São Paulo, ?a liberdade da imprensa ou a liberdade de informação jornalística não é absoluta?. Na decisão, ele condenou a TV Globo de São Paulo a indenizar o empresário Luiz Matarazzo por ter divulgado o seqüestro de seu filho menor, antes que a polícia solucionasse o caso.

De acordo com a ação, a Globo foi a única emissora a não acatar pedido de sigilo da família sobre o seqüestro com a argumentação do direito de informar os telespectadores.

Apesar das famílias dos seqüestrados ser contra a divulgação, na maioria das vezes, a imprensa tem publicado. No Jornal Nacional, o jornalista Willian Bonner, ao noticiar o seqüestro da filha de Silvio Santos, justificou aos telespectadores que estava apenas seguindo a orientação da polícia em casos de seqüestros.

A opinião do Jornal Nacional sobre o caso é compartilhada pelo advogado da emissora, Luiz de Camargo Aranha Neto. ?A chance do seqüestrado é maior quando o fato é noticiado?, acredita. Na opinião de Aranha, a divulgação do seqüestro não causa risco para a vítima, ?pois o objetivo do seqüestrador é dinheiro?. Segundo o advogado, a divulgação da notícia aumenta a possibilidade de localização do cativeiro através de denúncias.

Agora, a briga entre a família Matarazzo e a Globo está no Tribunal de Justiça de São Paulo. Os desembargadores terão que decidir se a Globo deve pagar indenização por ter divulgado a notícia do seqüestro.

Segundo a família Matarazzo, a criança havia se identificado com o sobrenome Lara. Os seqüestradores somente teriam descoberto a verdadeira identidade do garoto pelos telejornais da emissora. Os noticiários chegaram inclusive a apontar o empresário como ?primo do senador Eduardo Suplicy e do secretário de Comunicação do governo, Andrea Matarazzo?.

A família Matarazzo afirma que depois dos seqüestradores terem visto os noticiários, obrigaram o garoto a confirmar o sobrenome e o torturaram, além de deixá-lo sem água e alimentação.

?Sem dúvida alguma que a ré agiu com dolo ao divulgar, contrariando o pedido da família?, afirma a decisão. Para o juiz, a Globo ?desrespeitou a Lei, descumpriu o que diz a Constituição quanto a inviolabilidade do direito à vida, expôs de forma irresponsável e dolosa a vida de uma criança que estava em cativeiro de meliantes, desrespeitou o direito à intimidade da família e da criança que não queriam seus nomes divulgados?. Lopes afirmou que ?a privacidade das vítimas não foi respeitada?.”

 

“Globo recorre contra indenização por divulgar seqüestro”, copyright Último Segundo, 23/8/01

“A TV Globo recorreu nesta quarta-feira ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ) para tentar reverter condenação que indeniza uma família pelo fato de a emissora ter divulgado seqüestro de uma criança, em março.

No início de abril deste ano, a Globo foi condenada, em sentença de primeira instância, a indenizar uma família por divulgar o seqüestro de uma criança, contrariando o pedido de sigilo dos pais. A sentença foi emitida pelo juiz Teodozio de Souza Lopes, da 17? Vara Cível de São Paulo.

A emissora foi a única a noticiar o fato, quando todos os outros canais de TV e veículos de imprensa acataram a solicitação dos pais do garoto.

O crime aconteceu no dia 6 de março de 2000, quando o pai e seu filho foram seqüestrados por uma quadrilha especializada na região de Campinas, interior de São Paulo.

Apesar de pertencerem a uma família com sobrenome tradicional, os seqüestradores não sabiam da identidade das vítimas e, pai e filho, combinaram de omitir seu sobrenome para evitar o prolongamento do rapto e o aumento do preço do resgate.

Depois de um dia de cativeiro, os seqüestradores libertaram o pai para que ele providenciasse o valor do resgate e ficaram com o garoto como garantia.

No momento da libertação, os seqüestradores dispararam contra a perna do pai para deixar claro que não se tratava de uma brincadeira. Desesperado, temendo pela segurança do filho, o pai foi pessoalmente até as emissoras pedir a não divulgação do ocorrido.

Apesar da solicitação, a TV Globo, alegando liberdade de informação da imprensa, noticiou o seqüestro, mencionando o nome e o sobrenome das vítimas, no Jornal Nacional, Jornal Hoje e na rádio CBN.

Os seqüestradores foram informados da verdadeira identidade do garoto por meio dos noticiários e o torturaram, deixando-o sem água ou comida, até que ele confessasse sua verdadeira identidade.

Segundo o recurso da Globo, a emissora, ao divulgar o fato, foi apenas sincera e honesta em suas opiniões e que nenhum dano teria sido causado pelo fato de ter noticiado o seqüestro. Segundo ela, com a divulgação, aumentam as chances de descoberta dos cativeiros, pelo que o silêncio só beneficiaria os criminosos.

Depois do pagamento do resgate, a criança foi libertada e a família entrou com uma ação na justiça contra a emissora. O juiz Lopes emitiu a sentença em favor das vítimas, obrigando a Rede Globo a pagar um valor equivalente à publicidade dos programas que noticiaram o seqüestro.

Procurada pela reportagem do US, a TV Globo alegou que seqüestro é um crime público e que faz parte da ética da emissora noticiar esse tipo de informação. No recurso ao TJ, a Globo sustenta que todo seqüestro, em princípio, será noticiado, sendo a edição do crime, necessariamente, objeto de consulta à direção de jornalismo.

Entretanto, em outro episódio, conforme registrou o seu ex-Superintendente Comercial, membro do Comitê Executivo da Globo, e que nela trabalhou durante 20 anos, o seqüestro do publicitário Luis Salles, enquanto perdurou, não foi divulgado pela emissora.

Além disso, a assessoria de imprensa do veículo informou que não pode favorecer determinadas classes sociais, omitindo informações sobre algumas pessoas mediante pedido, porque são articuladas ou influentes.

Note-se que, neste mesmo período, a mesma quadrilha realizou outros seis seqüestros, na mesma região, e nenhum deles foi noticiado. ?Mas a Rede Globo teve conhecimento destes outros seqüestros??, questionou a assessoria.

De acordo com juiz Lopes, no entanto, ?se fosse um filho de um Zé ninguém, a Globo não noticiaria o crime.?”

    
    
                     

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