Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Marcelo Migliaccio

ESPN

“ESPN descobre público maluco por futebol”, copyright Folha de S. Paulo, 9/02/03

“QUANTAS vezes a seleção brasileira jogou de meias cinzas na Copa do Mundo de 1970? Quem foi o artilheiro do Campeonato Paulista de 1961? Qual a escalação do time do Bangu, campeão carioca em 1933?

Responder perguntas como essas é um dos desafios dos participantes do programa ?Loucos por Futebol?, do ESPN Brasil, que entrou em sua segunda temporada graças aos muitos telespectadores apaixonados pela bola, que garantem à atração uma das melhores audiências do canal.

Criado durante a última Copa do Mundo, o programa, exibido quinzenalmente aos sábados, às 22h, reúne quatro jornalistas esportivos que são verdadeiros arquivos ambulantes do futebol mundial.

?Nosso diferencial é que não falamos do dia-a-dia do futebol, dos resultados, mas do lado cultural do esporte?, diz Adriana Saldanha, a mediadora do programa. ?Encontro mulheres nas ruas que dizem ter começado a gostar de futebol depois de assistir?, afirma.

Roberto Assaf, Marcelo Duarte, Paulo Vinícius Coelho e Cláudio Arreguy exibem seus conhecimentos sobre a cultura futebolística em meio a imagens lendárias de arquivo. Músicas e livros como ?Flamengo É Puro Amor?, que reúne crônicas futebolísticas de José Lins do Rego, também ancoram os debates.

?Ninguém conhece mais futebol que um garoto de 12 anos. Alguns telespectadores até nos corrigem?, diz Coelho, que, como os colegas, guarda centenas de livros, jornais e revistas em casa.

Segundo o Ibope, cada edição do programa é vista por cerca de 460 mil pessoas em São Paulo. No último, sobre Mané Garrincha, o pico foi de 700 mil. A participação também é alta: 350 e-mails enviados ao canal por semana.

?Um telespectador perguntou quantos gols de pé esquerdo foram feitos na Copa de 38?, conta o escritor Assaf, que prepara a biografia de Zico.

Duarte diz que um dos próximos programas vai mostrar as diferenças das locuções no Brasil e em Portugal: ?Um comentarista luso disse que, ?se não sair nenhum gol até o fim da partida, o jogo terminará zero a zero?. Outra para os anais.”

 

TECNOLOGIA NA TV

“Globo cria circo virtual”, copyright O Estado de S. Paulo, 9/02/03

“Eles podem fazer chover em um lindo dia ensolarado. Podem criar cenários e paisagens imaginárias, fazer aparecer num campo de futebol jogadores que não existem ou quatro juízes. Não, não é coisa de Mister M, muito menos do sumido David Copperfield. Esses ilusionistas fazem parte do núcleo de Produção Virtual da Globo, equipe responsável pela criação das imagens virtuais inseridas na programação da emissora.

São animações como uma chuva de sandálias Havaianas durante algumas transmissões de futebol, a bola com o logo da Globo que aparece estampada na quadra em um campeonato de vôlei, ou bolinhas de sabão que surgem no palco durante uma apresentação de Sandy e Junior. Até aquela imagem de vários isqueiros acesos na platéia escura durante um show é facilmente criada por eles.

O núcleo, que possui seis profissionais, foi criado no final do ano passado para incrementar as transmissões da rede – principalmente as esportivas – e produzir publicidade virtual. Para essa, não faltam recursos, que são utilizados pela emissora em parceiria com agências de publicidade na criação de propagandas virtuais. Em geral, seu preço é de 20 a 50% maior que o do anúncio convencional na mesma faixa horária. ?Essa tecnologia já existe há cinco anos aqui, mas só agora há um núcleo especializado nisso?, fala o responsável pela equipe de Produção Virtual, Delfim Fujiwara. ?Criamos de outdoors virtuais para a Fórmula 1 a bonequinhos que sambam nas transmissões do carnaval?, continua. ?Mas as mais legais são aquelas que não podem ser notadas pelo telespectador. No Show da Virada, da Globo, muita gente não percebeu que os cenários tinham elementos virtuais.?

Caminhão – Utilizando um tipo de tecnologia importada de Israel, parte do núcleo de produção virtual da Globo trabalha em uma unidade móvel que acompanha todas as transmissões que têm esse tipo de inserção. A animação virtual é inserida na imagem real por meio de um sensor acoplado a uma das câmeras instaladas no local para a transmissão.

Dentro desse ?caminhãozinho?, três técnicos monitoram tudo por computador para que a imagem criada entre no ar no momento certo. ?A animação já vem pronta e só fazemos ensaios no local para pequenos ajustes de luz e imagem?, diz Fujiwara. ?Mas não faltam imprevistos. Se chover ou se um torcedor estiver com uma bandeira bem em frente à nossa câmera, temos de abortar a missão. Nossas decisões são tomadas na hora.?

Com tantos recursos em mãos, a equipe de produção virtual tem de seguir um manual de ética para não aprontar nenhuma maluquice no ar. ?Imagine o que aconteceria se resolvêssemos colocar duas bolas, ou dois Ronaldinhos num campo de futebol durante uma transmissão?, fala o técnico da Globo, rindo.

?É uma tecnologia tentadora, mas temos de ter consciência de que não podemos atrapalhar a transmissão da informação real, nunca.? Se isso acontecer, eles é que vão virar funcionários virtuais da Globo.”

 

ESPERANÇA

“Erro de receita favorece as cucarachas”, copyright O Estado de S. Paulo, 9/02/03

“Tudo que está acabando torna-se bom. Só pode ser esta a explicação para a recuperação – em termos de audiência, que fique claro – de Esperança. A principal novela da Globo chegou a resvalar para os 34 pontos de média no Ibope (na Grande São Paulo), colocando a direção da emissora em pânico e provocando ações de emergência, como mudar autor e reforçar elenco. Deu certo, a Globo comemora 43 pontos de média nos capítulos finais.

As razões da recuperação podem ser duas: a curiosidade do espectador para ver como acabará uma história que fez parte do seu cotidiano durante tantos meses. A outra é mérito do autor-substituto Walcyr Carrasco, que imprimiu muita ação na pasmaceira escrita por Benedito Ruy Barbosa.

A saga dos italianos deu tanta reviravolta que está irreconhecível para o espectador que eventualmente tenha passado alguns meses sem ver TV. Ao trio amoroso entre Camille-Toni-Maria, o motor da trama, foram agregados conflitos de nonsense total.

Como que acometidos por um furacão de insanidade, personagens bons tornaram-se demoníacos. E vilões fizeram movimento contrário, passando a comportar-se como santos. A Camille de Ana Paula Arósio passou de mulher apaixonada para uma sórdida vingativa que trabalha para acabar com a vida da rival e, em conseqüência, assume o papel da capitalista selvagem disposta a massacrar a classe operária.

A Francisca de Lúcia Veríssimo, a jararaca empenhada em jogar areia na felicidade dos filhos e dos vizinhos do início, hoje é um docinho, que sofre com a maldade do Farina (Paulo Goulart) que, por sua vez, foi gente boa um dia. É corrente nos programas de fofocas e publicações congêneres que Raul Cortez teria pedido para seu personagem morrer por estar constrangido com os rumos na novela. Ao que parece, Paulo Goulart é outra vítima do constrangimento pelas cenas que tem protagonizado. O oportunista do passado faz nestes últimos capítulos um vilão de desenho animado, que até prende mocinha indefesa em porão.

Outros micos parecidos têm sido pagos por Marcos Palmeira, Laura Cardoso, Otávio Augusto, Denise Del Vecchio, atores experientes e talentosos, porém sem autoridade para mudar o destino de seus personagens.

Esperança, no entanto, não está sozinha no barco do desgoverno. As outras produções dramáticas da Globo – com exceção da minissérie A Casa das Sete Mulheres – contam histórias mal arrumadas que incomodam até o telespectador mais fiel ao gênero.

Relembrando: quem colocou a TV brasileira entre as melhores do mundo foi a Globo, que trabalhou tão bem a ficção a ponto de torná-la, por décadas, produto de exportação. Há uma hipótese: a Globo relaxou tanto em cima do pedestal da qualidade estética (efeitos especiais, imagens, elenco estelar, cenário e figurino), que descuidou da espinha dorsal de qualquer novela, ou seja, da história.

Esse equívoco na receita – que muitos julgam sintomas de uma crise anunciada desde os anos 70 – fertiliza o terreno para o florescimento das ?importadas?, como Joana, a Virgem, Betty, a Feia, Carrossel 2, e outras.

Esses dramalhões rasgados (de visual modelado a laquê) já foram piada um dia, mas hoje passam a ser olhados como uma opção séria de programação.

Afinal, capturaram um público importante e isso faz diferença na receita das emissoras.

Não é por acaso que a Record prepara lançamento pomposo do dramalhão colombiano Um Amor de Babá, que inclui superfesta em São Paulo com a presença da protagonista. É a nova onda cucaracha chegando aí, gente!”