CONDIÇÕES PROFISSIONAIS
“Quanto custa melhorar?”, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 15/12/03
“Olá, amigos. Não é novidade dizer que o mercado de trabalho está dificílimo para todos, seja qual for a formação profissional. E o panorama não é diferente para os jornalistas. Freqüentemente temos nossos empregos ameaçados, vemos demissões coletivas em jornais concorrentes ou não, somos substituídos por estagiários que custam muito menos para a empresa (nada contra a contratação de estagiários, é bom que se diga), etc…
Além disso, somos vítimas também da ?voz do mercado?, que dita os valores de salários de acordo com a quantidade de profissionais em busca de uma vaga. Na prática, funciona assim: oferece-se um salário bem abaixo do valor esperado pelo jornalista. Caso ele aceite, ótimo. Se não aceitar, tem quem aceite. E aos montes. O que isso ocasiona? Uma queda brusquíssima da qualidade final dos produtos, já que os melhores profissionais acabam não aceitando salários muito abaixo do que eles acham justo.
Outra faceta do nosso mercado é a ?otimização da equipe?. Na prática isso significa o aumento do trabalho de cada um que fica após uma demissão em massa (o popular ?passaralho?). Normalmente, quando são demitidos diversos jornalistas de uma redação, os que ficam já sabem que terão, no mínimo, 50% de trabalho a mais. E o que é pior, sem ganhar nada a mais por isso. Conseqüência: ritmo de trabalho acelerado, pendências acumulando sobre a mesa, qualidade decrescente e nível de stress elevado.
Por fim, as condições de trabalho. Computadores eficientes e ágeis, programas que funcionem, linhas de telefone disponíveis e farto material de agências. Tudo isso tornaria as vidas dos jornalistas esportivos mais agradáveis. O problema é que em menos de 10% das empresas isso tudo existe e funciona a contento.
Problemas com computadores defasados, restrições a ligações telefônicas, licenças limitadas de programas de produção de texto e diagramação e acesso apenas às agências de notícias mais baratas são rotina em várias redações, que convivem também com atrasos de salários, irregularidades fiscais e problemas de estrutura física para que os jornalistas trabalhem (dividir computadores é uma realidade mais comum do que se imagina).
Não quero, aqui, desestimular quem está começando na profissão, nem fazer o papel de inconformado eterno, mas é importante que sejam revistos diversos conceitos de trabalho e de estrutura e investimento em jornalismo. Dificilmente se conseguirá aumentar o nível de nossos produtos jornalísticos sem que se invista seriamente na valorização dos nossos profissionais e, principalmente, na sua estrutura de trabalho.
Sem investimentos sérios nessas duas frentes, teremos sempre empresas mambembes, que tapam buracos e apagam incêndios, sem conquistar a confiança do público e a credibilidade que é imprescindível para que se cresça num mercado difícil como o jornalístico no Brasil.
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Um meio de comunicação que vem crescendo muito em todo o mundo, e que ainda não despertou no Brasil a atenção que deveria é o dos aparelhos celulares. Hoje em dia milhões de brasileiros possuem um telefone celular. Mesmo os aparelhos mais simples possuem recursos interessantes, que poderiam ser utilizados na distribuição de informações a seus usuários.
Pesquisas feitas recentemente indicam que os usuários de telefonia móvel no Brasil não se importariam de pagar uma pequena taxa extra em suas contas ou no débito nos planos pré-pagos para terem acesso a notícias esportivas de seus times ou de esportes em geral.
Esse mercado pode ser uma boa saída para empresas que queiram desenvolver conteúdo para uma mídia que ainda está se desenvolvendo, e cujo potencial pode ser o mais rentável possível. Vale lembrar que no Natal e no dia das mães, já há alguns anos, o bem mais procurado é o bom e velho telefone celular.
Portanto, empresas de conteúdo, animem-se. Montem uma estrutura própria de desenvolvimento de conteúdo para serviços WAP, SMS, MMS ou qualquer outro. As empresas de telefonia móvel, até onde se sabe, estão ávidas para poder oferecer serviços diferenciados a seus clientes. Vale lembrar que 2004 é ano de Olimpíadas, e que as Eliminatórias da Copa do Mundo vão engrenar nessa mesma época.
Um bom projeto, prevendo direitos de imagem e áudio de atletas, narração de gols, notícias em tempo real e outros atrativos seriam excepcionalmente aceitos pelas operadoras de telefonia móvel, que terão em 2004 o ano mais competitivo de todos até agora.”
COMO FIZEMOS A TV GLOBO
“Militares tentaram até encurtar novelas”, copyright Folha de S. Paulo, 21/12/03
“O governo de Ernesto Geisel (1974-79) tentou reduzir a duração das telenovelas, de até mais de 300 capítulos na época, para no máximo 70 episódios. A revelação é do advogado Luiz Eduardo Borgerth, 71, no livro ?Quem e Como Fizemos a TV Globo? (editora A Girafa, R$ 38, 247 págs.).
Borgerth foi entre 1967 e 2000 o principal executivo de relações institucionais da Globo, período pelo qual ?dificilmente alguma legislação de radiodifusão foi discutida? sem que ele fosse consultado. Entre 2001 e o início deste ano, foi consultor do SBT.
O ex-diretor da Globo levanta algumas hipóteses sobre o que estaria por trás da ?pressão do Planalto? por novelas mais curtas. Uma delas seria o pedido de ?alguma esposa altamente colocada na hierarquia militar?, que não suportava esperar um ano para ver o desfecho das tramas. Outra, de que menos capítulos facilitaria o trabalho dos censores.
?Naquela época, havia uma crítica muito grande quanto à duração das novelas. Uma idéia que os militares tinham, em benefício do país, era reduzir as novelas?, disse Borgerth à Folha.
O fato é que Borgerth acabou marcando uma audiência com o general Hugo Abreu, então chefe da Casa Militar do governo federal. Logo no início da conversa, o diretor da Globo foi interrompido. ?Não se preocupe, ninguém vai fazer nada contra a televisão. Minha irmã está nos Estados Unidos e me disse que a televisão brasileira não tem nada a dever à americana; nossas novelas são melhores do que as deles. Deixa comigo?, teria dito Abreu, de acordo com ?Quem e Como Fizemos a TV Globo?.
O livro, lançado na semana passada, é uma obra memorialista. Não tem compromisso com a precisão de datas, por exemplo. Mais do que relatar casos de censura e curiosidades sobre o regime militar, se presta a homenagear os principais profissionais que ajudaram a formar e a consolidar a TV Globo, entre 1965 e início dos anos 70, numa época em que os recursos eram mínimos.
Borgerth organizou o livro como os créditos de uma novela, com verbetes sobre os personagens. Os ?protagonistas? são o fundador da Globo, Roberto Marinho, Walter Clark (que ?moralizou? o departamento comercial e iniciou uma gestão profissional), José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni (que implantou o modelo de programação vigente até hoje), e Joe Wallach, o norte-americano enviado pela Time-Life para acompanhar os investimentos que o grupo fez na Globo, tendo apenas imóveis como garantias.
A participação da Time-Life na implantação da Globo gerou muito barulho, até uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Uma campanha foi liderada por João Calmon, dos Diários Associados, grupo ao qual pertencia a TV Tupi. Em tom de ironia, Calmon é ?homenageado? no livro de Borgerth. Ele aparece como personagem no capítulo ?Extras?.
Borgerth diz que a campanha de Calmon ajudou a divulgar a Globo, então lanterna nos índices de audiência. Afirma que Roberto Marinho deve a ele o fato de os militares terem, em 1967, tornado claro que não era permitida a associação com estrangeiros em empresas de comunicação.
Assim, Marinho se livrou dos norte-americanos, que investiram pouco mais de US$ 5 milhões na Globo. O investimento, segundo Borgerth, foi devolvido sem juros. Para Borgerth, tanto a associação como o rompimento com a Time-Life, foram lances de ?sorte? para Roberto Marinho, um homem de ?sorte grande?.
Borgerth não economiza adjetivos para definir os principais personagens do livro. Roberto Marinho, além de sortudo, era ?educadíssimo, amável, afável?. Walter Clark era ?catalisador de talentos?, ?impecável?. Boni não era apenas perfeccionista. ?Para ele não existia o melhor possível, porque se é possível que exista algo melhor, então não é o melhor possível?, afirma no livro.”
“Livro revela cenas internas da Globo”, copyright O Estado de S. Paulo, 21/12/03
“Ele viu o todo-poderoso da TV José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, ensinar literalmente uma galinha a ?cacarejar?. Conheceu Roberto Marinho quando este ainda era apenas o dono de um bom jornal local. Quando começou sua trajetória na TV, a Globo era a quarta emissora em audiência, sendo líder apenas em títulos de protestos, ameaças de greves e em salários atrasados. O ex-diretor-administrativo da Globo – trabalhou na rede por 30 anos – Luiz Eduardo Borgerth acompanhou passo a passo a construção da maior rede de televisão do País.
Conheceu de perto todas as relações de dinheiro, poder e influência que ajudaram a erguer o império dos Marinhos e mais de perto ainda as pessoas que formaram as pilastras desse império. É justamente sobre elas que resolveu escrever.
Borgerth lançou na semana passada o livro Quem e Como Fizemos a TV Globo, da editora A Girafa, que, como o título diz, conta um pouco da trajetória de uma das maiores empresas de comunicação do País, esmiuçando a personalidade de cada um dos personagens que participaram dessa história. Na obra, que ele mesmo diz não ter a pretensão de ser um relato histórico sobre a Globo, Borgerth não traz documentos, datas, horários e nem locais precisos.
Preferiu pinçar curiosidades biográficas de pessoas como Boni, Nelson Rodrigues, Armando Nogueira, Daniel Filho, Walter Clark, João Saad, Silvio Santos e Roberto Marinho, cuja trajetória se confunde com a história da TV no Brasil.
Boa sacada. Histórias de vida são sempre mais interessantes.
A relação do autor com Boni vem da época em que esse ainda não era o primeiro nome de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho. Em seu relato sobre ele, Borgerth não mede elogios – como faz com a maioria de seus amigos no livro -, mas também não deixa para trás o lado exigente do diretor. Conta passagens engraçadas como o dia em que, insatisfeito com o cacarejar do ator vestido de galinha que estrelava o comercial do caldo Knorr na TV, Boni tomou o lugar do rapaz que fazia a galinha e cacarejou com perfeição , para espanto e diversão dos presentes.
Ainda sobre Boni, fala de sua relação conturbada com militares e alguns profissionais, de sua parceira com a outra pilastra na construção da Globo, Walter Clark, do seu lado doutor – Boni queria ser médico e chegou a medicar, de curioso, alguns colegas – e de sua impaciência com o malfeito. A expressão ?Tolerância zero? só pode ter sido invenção de Boni, diz o autor.
?Para Boni, se algo não era perfeito, era uma merda.? completa.
Borgerth também conta burburinhos como o caso de um funcionário fantasma da Globo, Alexandre von Baumgarten, repórter que, dias depois de ser demitido, foi readmitido a pedido de Roberto Marinho, que não quis dar muitos detalhes. O sujeito estava acima do bem e do mal, conta, tinha ligações com os militares e aparecia na Globo vez ou outra só para pegar passagens aéreas. Não fazia nada, mas morreu na folha de pagamento da emissora.
Por falar em militares, Borgerth relata fatos curiosos da relação entre a Globo e a ditadura. Fala do coronel que quase acabou com o programa Telecath, o ganha-pão de Ted Boy Marino, e da prisão mal explicada de Jacinto Figueira Jr, o Homem do Sapato Branco.
Um dos episódios mais estranhos foi uma determinação dos militares para que as novelas não tivessem mais 300, 200, 120 capítulos. O governo militar, chefiado por Geisel, exigiu que os folhetins tivessem apenas 60 ou 70 capítulos. Nem Borgerth nem ninguém, segundo ele, sabia explicar na época o motivo da determinação. Segundo o autor, o boato indicava que a causa foi a esposa de algum militar que, ansiosa por saber o desfecho das tramas, estava cansada de esperar meses por isso. Borgerth brinca com a situação.
?O exército queria lançar a minissérie e nós não entendemos isso na época?, diz .
Tem também a história da famosa greve dos escravos na Globo. O núcleo de atores de São Paulo que vivia os escravos na novela A Cabana do Pai Tomás resolveu não gravar porque estava sem salário. ?Foi o 13 de maio dos escravos chefiados por Sérgio Cardoso?, brinca o autor.
Entre esses relatos divertidos de Borgerth também há fotos históricas dessa trupe, quase todas de arquivos pessoais, como as dos times de futebol da emissora e as de Roberto Marinho com amigos. Há ainda relatos emocionados como aquele sobre a derrocada de Walter Clark e outro sobre o incêndio que destruiu a Bandeirantes e parte das esperanças de seu dono, João Saad, um homem ?bom de verdade?, como diz o autor, que dias antes tinha oferecido ajuda à Globo, que também tinha sido incendiada.”