Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mariana Loiola

BAIXARIA NA TV

"Respeito é bom e o povo gosta", copyright Rede de Informação para o Terceiro Setor (www.rits.org.br), 4/07/03

"Saímos da ditadura militar, assistimos ao fim da censura e a uma maior participação popular. A liberdade de expressão contribui para uma maior consciência crítica da população; por outro lado, também nos faz questionar os seus limites. Será que os produtores de televisão, por exemplo, têm o direito de transmitir o que bem entenderem? Foi para questionar e debater esses limites que a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados (CDH) e entidades da sociedade civil de várias parte do Brasil, lançaram a campanha ?Quem financia a baixaria é contra a cidadania?, em novembro de 2002. A iniciativa tem como objetivo valorizar os direitos humanos na televisão. Participam da coordenação da campanha organizações como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Grupo Gay da Bahia, Instituto Acatu, Instituto Ethos, Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), entre outras.

A idéia da campanha surgiu em maio do ano passado, durante a Conferência de Direitos Humanos, promovida pela CDH, em Brasília, com o tema ?Violência e criminalidade?. O grupo de trabalho que debateu sobre a questão na mídia, destacou o desrespeito de alguns programas de TV aos cidadãos e a falta de sensibilidade aos apelos da sociedade por mais ética na programação. Ao final dos trabalhos, o grupo concluiu que era necessário desenvolver uma maneira de a sociedade civil organizada fiscalizar a programação, e sugeriu uma campanha de combate aos abusos.

Para acompanhar a programação da televisão, foi criada a Comissão de Acompanhamento da Programação de Rádio e Televisão (CAP), formada por membros das entidades integrantes da campanha. A comissão analisa e indica os programas que, de forma sistemática, desrespeitam convenções internacionais assinadas pelo Brasil, princípios constitucionais e legislação em vigor que protegem os direitos humanos e a cidadania. São algumas das formas mais comuns de desrespeito aos direitos humanos na mídia: apologia e incitação à violência; discriminação racial, de gênero, por religião e orientação sexual; estímulo à precipitação da sexualidade infantil; imputação de autoria de crime a pessoa sem provas; e afronta à dignidade de grupos de pessoas fragilizadas, como portadoras de deficiência física, doentes mentais, dependentes químicos e portadoras do vírus HIV; entre outras.

Após serem identificadas situações de desrespeito em determinado programa, a coordenação da campanha entra em contato com os comunicadores responsáveis, para tentar persuadi-los a modificar a programação. Caso as emissoras não queiram dialogar, a coordenação pretende pressionar os anunciantes a não patrocinarem os programas indicados. Esse boicote é tido pela campanha como uma estratégia eficaz, na medida em que as empresas, preocupadas em preservar a sua imagem diante do mercado (que exige cada vez mais responsabilidade social das empresas), deverão evitar vincular a sua imagem a programas que desrespeitam os direitos humanos e a dignidade dos cidadãos. ?Não adianta se indignar e não fazer nada. Temos que criar problemas para os programas que insistem no desrespeito?, diz Roberto Monte, coordenador da Rede DHnet e um dos integrantes da CAP.

A coordenação da campanha afirma que o seu propósito nada tem a ver com falso moralismo, pois tem como parâmetros princípios fundamentais da democracia e dos direitos humanos e instrumentos jurídicos. Além disso, os organizadores da iniciativa acreditam que, como a TV é uma concessão pública, é necessário que haja uma fiscalização social sobre o que é veiculado para a população brasileira – que, em sua maioria, tem a TV como principal fonte de cultura, lazer e entretenimento. As emissoras têm a possibilidade de diálogo e de defesa, portanto, ?as regras são discutidas, e não colocadas de cima a baixo?, como afirma o coordenador da DHnet.

Denúncias

A campanha também é alimentada por denúncias. Qualquer pessoa que se sentir lesada por algum programa televisivo, pode denunciá-lo. A maior parte das denúncias diz respeito à amplificação e generalização da violência e à inadequação de horários para veiculação de imagens com exagerado apelo sexual. Programas policiais, de auditório e novelas estão entre os mais denunciados. ?São tentativas mais simples e baratas de captar o maior número possível de telespectadores. O programa que consegue aumentar a sua audiência é rapidamente copiado?, diz Laurindo Leal, membro da ONG TVer e também integrante da CAP. Ele ainda ressalta que é preconceituoso justificar o sensacionalismo na televisão com o argumento ?a gente dá o que o povo quer?: ?O povo não tem alternativa, pois as fórmulas usadas nesses programas são iguais?.

A campanha já teve um retorno positivo. Há cerca de um mês, o assessor do Domingo Legal (um dos programas mais denunciados), se encontrou com a coordenação da campanha e se prontificou a reformular os quadros do programa. Espera-se que haja mais acordos como esse e que os resultados venham em forma de melhoria na qualidade da televisão que é feita no Brasil."

 

"Cartão amarelo", copyright Folha de S. Paulo, 6/07/03

"O governo federal está de olho nos chamados programas vespertinos populares, como o ?Hora da Verdade? e o ?Cidade Alerta?, e nas novelas da Globo. Em cumprimento a decisão judicial, o Ministério da Justiça está monitorando a programação que todas as redes de TV exibem diariamente entre 8h e 20h, a faixa dos programas classificados como livres.

Até o ano passado, a principal atividade dos técnicos do Departamento de Classificação Indicativa do ministério era analisar sinopses e fitas enviadas pelas emissoras e determinar, baseados em uma tabela que delimita graus de violência e sexo, quais os horários apropriados para a exibição dos programas.

Nos últimos meses, os 18 técnicos do departamento passaram a acumular a função de monitores da televisão. ?Antes, havia a leitura de sinopses e um monitoramento por amostragem, a partir de denúncias. Agora, temos um trabalho preventivo. Mesmo que não tenha denúncia a gente previne a emissora: ?Olha, está passando do limite?, diz a secretária nacional de Justiça, Cláudia Chagas.

Por conta desse monitoramento, o Ministério da Justiça reclassificou, na semana passada, a novela das oito da Globo, ?Mulheres Apaixonadas?. Antes liberada para qualquer horário, a novela agora é inadequada antes das 21h.

A novela das sete da Globo, ?Kubanacan?, também corre riscos, por causa de suas cenas que insinuam sexo e de ação, muitas vezes com tiros. Segundo a secretária Chagas, está sendo monitorada e pode ser advertida.

O monitoramento já gerou advertências aos programas ?Hora da Verdade? e ?Brasil Urgente?, da Band, e ?Cidade Alerta?, da Record. ?Repórter Cidadão? e ?Canal Aberto?, da Rede TV!, os primeiros advertidos, já se ?enquadraram?, diz o ministério.

A advertência, que precede a reclassificação, tem funcionado, segundo Chagas. ?Sempre a emissora dá uma maneirada.?

Para o segundo semestre, o Ministério da Justiça prepara mudanças nas regras de classificação indicativa. Já há uma proposta em discussão interna. Só depois de estudar bem o assunto a secretária Chagas irá abrir o debate às emissoras de TV.

?Ainda não tenho posição formada sobre a maior parte dessas propostas?, diz Chagas. ?Temos que ter habilidade para que isso [a classificação indicativa] não se torne censura e ao mesmo tempo proteja a sociedade de abusos.?

O terreno é fértil para polêmicas. Dispositivo de portaria editada em 2000, que tornava obrigatório o cumprimento pelas TVs da classificação feita pelo ministério, continua suspenso até hoje, por força de liminar da Justiça."

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"Emissoras negam excessos em programas", copyright Folha de S. Paulo, 6/07/03

"Globo, Record e Band, principais alvos do monitoramento da TV feito pelo Ministério da Justiça, negam haver conteúdos inadequados em seus programas vespertinos e novelas. Dizem que mantêm níveis de qualidade e que sempre negociam ajustes quando provocadas pelo ministério.

Globo e Band, especificamente, revelam preocupação com o controle externo do conteúdo da TV aberta pela classificação indicativa.

?Temos mecanismos de controle de qualidade e um centro de atendimento ao telespectador. É um risco muito grande transferir para o Estado a decisão do que menores podem assistir. Esse tipo de transferência, mesmo que bem-intencionado, se choca com o livre-arbítrio e não pode ser um substituto dos pais de família?, diz Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação.

?Sempre que se discutem medidas restritivas se envereda para rumos que não se sabe onde vão dar, que podem ferir o direito de liberdade de expressão?, afirma Marcelo Parada, vice-presidente da Band.

Já a Record demonstra tolerância: ?Temos um excelente diálogo com o Ministério da Justiça e entendemos isso como classificação indicativa e não como censura?, diz Hélio Vargas, diretor de programação. Manoel Carlos, autor de ?Mulheres Apaixonadas?, não acha ?extravagante? a reclassificação da novela para as 21h."

 

CLOSED CAPTION / TV

"Legendas básicas", copyright Época, 7/07/03

"Muita gente já deparou com aquelas legendas meio esquisitas que transcrevem o que é dito em um programa de TV. A maioria pode não notar, mas faz toda a diferença para quem não ouve. Desde 1997, os portadores de deficiência auditiva contam com um recurso chamado closed caption (CC), ou legenda oculta. O primeiro programa a usá-lo foi o Jornal Nacional, da TV Globo. Trata-se de uma tecnologia que transmite caracteres codificados vistos nos televisores que possuem decodificador. A utilidade do serviço é um fato: existem no Brasil aproximadamente 6 milhões de pessoas com a deficiência, de acordo com o IBGE. Mas a eficácia do sistema é muitas vezes duvidosa. As legendas ocultas são feitas para programas gravados e ao vivo. Para os últimos, existem duas formas: a digitação e o software de reconhecimento de voz. Aí mora o problema. Apesar de tudo, o recurso não trouxe avanços, pois deixa passar erros de significado, causados por tradução literal. As gafes vão de falhas de grafia a frases esdrúxulas. O tenista mais rico da história pode se transformar no mais ?chico?, primeiro semestre vira ?primeiro senai? e uma simples data, como 1962, é traduzida para ?mil na de 62?. As confusões não param por aí, a moda dos anos 60 vira moda do ?exame 60?, o esporte mais caro vira ?as partes do cara? e o assunto sério se converte em palhaçada. Os deficientes não acham nenhuma graça.

Entre as emissoras que dispõem da legenda oculta destacam-se Globo, SBT, TV Câmara Federal e TV Assembléia de São Paulo. Record e Bandeirantes se dizem interessadas em adotar o sistema. A Globo é a única que trabalha com o reconhecimento de voz, mantendo a estenotipia só nas gravações. A Central Globo de Comunicação garante que o software é veloz. A emissora recebe manifestações positivas. O SBT utiliza a legenda oculta em vários programas e os executivos do canal acreditam que a audiência é favorecida. A Steno, empresa que trabalha para a emissora, promete uma margem de erro de apenas 2%. O dono, Wagner Médici, investe em digitação por achá-la melhor que reconhecimento de voz. Para ele o serviço é bom porque atinge um público antes latente. ?Recebo e-mails de regiões distantes e até da Argentina?, orgulha-se.

COMO FUNCIONA

O CC possui dois sistemas

Programas gravados

As legendas são cuidadosamente digitadas e inseridas no material já existente

Programas ao vivo

Duas possibilidades: estenotipia (manual) ou software de reconhecimento de voz

Os deficientes auditivos aprovam a legenda e querem difundi-la. Desejam assistir até a comerciais legendados. A diretora administrativa da Confederação Brasileira de Desportos de Surdos, Geni Fávero, recolhe – em parceria com outras organizações – adesões a um abaixo-assinado a ser entregue ao presidente do Senado, José Sarney. Ele pede a aprovação do projeto de lei 3979/2000, do então senador tucano pelo Ceará Lúcio Alcântara. O documento impõe uma utilização mínima da legenda. Ele sofreu alterações e está com o deputado federal pefelista João Batista. O parlamentar estima que o projeto será votado no segundo semestre. Alcântara pensa que, sem legenda, os deficientes auditivos são relegados à condição de cidadãos de segunda classe. Por enquanto, a situação pouco mudou."