Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Merval Pereira

INTERNET

“Boatos cibernéticos”, copyright O Globo, 12/10/03

“Todos, ou quase todos que usam a internet com freqüência, já estão acostumados com os hoaxes (boatos) que nela circulam com a desenvoltura que só um meio tão livre de controles pode ter. Essa característica transforma a internet, uma ferramenta de pesquisa insuperável, também no maior instrumento propagador de boatos em nível planetário.

E não são apenas as ?lendas urbanas? que se espalham pela rede, como aquela história do sujeito que acorda em uma banheira cheia de gelo e descobre que, depois de uma noitada de farra, lhe roubaram um rim.

Ou os textos literários atribuídos a Gabriel García Márquez (quem não se lembra do suposto texto de despedida atribuído a ele?), ou ao Verissimo, ao Jabor, ou ao Zuenir.

Existem circulando pela rede inúmeros boatos políticos, teorias conspiratórias rocambolescas e até mesmo previsões de Nostradamus a respeito da chegada de Lula ao poder.

Há uma mensagem circulando pela internet que pretende provar que a derrubada das torres do World Trade Center, em 11 de setembro de 2001, foi obra dos próprios americanos.

Aponta algumas ?evidências?, tais como: os atentados aconteceram antes das 9h, hora local, quando a maioria dos funcionários nem tinha chegado ainda, já que nos EUA a hora de trabalho começa por volta das 10h. (O que não &eeacute; verdade, já que o trabalho lá normalmente obedece ao horário das 9h às 17h).

Há uma outra ?evidência? listada que não explica nada, embora pareça importante. Como as datas, em inglês, são escritas com o mês na frente do dia, o 11/9 é escrito como 9/11. Este número coincide com o número 911, o número de telefone para chamadas de emergência nos Estados Unidos. O que isso quereria dizer exatamente, não está explicado na mensagem.

A última teoria diz respeito à área das torres que, segundo a mensagem, ?desde há muitos anos já era deficitária economicamente?. Pois não apenas derrubaram as duas torres com uma implosão, garante a mensagem anônima, como também o terceiro prédio da área que ?simplesmente estava atrapalhando a área física do terreno das torres?. Portanto, tudo não teria passado de um grande golpe imobiliário.

Outra denúncia ?gravíssima? que circula na internet é quanto à cobiça norte-americana em relação à Amazônia. Uma mensagem reproduz a página de um livro didático, com um mapa da América do Sul onde aparece a região amazônica desligada do Brasil, descrita como área sob a responsabilidade dos Estados Unidos.

?É só conferir na página 76 do livro didático norte-americano ?Introdução à geografia?, do autor David Norman, utilizado na Junior High School?, afirma a mensagem.

Uma rápida busca no Google, ou no site da Amazon, a maior livraria virtual do planeta, e encontramos dezenas de David Norman: cientistas, técnicos de futebol, artistas, escritores. Mas não é possível descobrir essa ?Introdução à geografia?, título tão comum quanto o nome de seu autor. E nunca ninguém conseguiu colocar a mão num exemplar desses.

O comentarista político Franklin Martins, da TV Globo e da CBN, pena há anos com um artigo que circula na rede atribuindo a ele críticas severíssimas ao deputado federal Jutahy Junior, líder do PFL, que estaria tentando aprovar um projeto para impedir o Ministério Público de investigar o Executivo.

O texto parece um panfleto que teria sido lido por Franklin na CBN, onde ele conclama seus leitores a espalhar a acusação por toda a rede ?para acabar com mais essa maracutaia?. Nem Franklin escreveu isso, nem Jutahy propôs tal lei.

O mais recente boato a circular na internet dá conta de que foram encontrados em escavações em Dublin, na Irlanda, vários manuscritos de ninguém menos que Nostradamus. E sobre quem já falava ele? Sobre a chegada de Lula ao poder. Vejam esse trecho:

…?e o próximo do terceiro ano do terceiro milênio uma besta barbuda descerá triunfante sobre um condado do hemisfério sul espalhando a desgraça e a miséria. Será reconhecido por não possuir seus membros superiores totalmente completos. Trará com ele uma horda que dominará e exterminará as aves bicudas de bem e implantará a barbárie por muitas datas sobre um povo tolo e leviano?…

E a mensagem diz que quem quiser conferir a veracidade pode consultar o livro: ?Visão das trevas, grandes catástrofes da Humanidade?, página 102, da Editora Record.

Pois bem: pedi a minha amiga Cecília Costa, editora do Prosa & Verso, para checar, e ela achou 11 títulos com a palavra ?visão? no catálogo da editora, e nenhum deles é de Nostradamus. E nenhuma nova descoberta de seus escritos foi feita em Dublin recentemente. Se fosse verdade, pelo texto Nostradamus seria um tucano empedernido.

Para quem se interessar por esses hoaxes na internet, o site www.e-farsas.com tem uma boa coleção deles.

E o pessoal do Informáticaetc sugere os seguintes sites internacionais: para informações sobre a origem das lendas urbanas, vale ir até o Urban Legends Reference Pages <www.snopes. com> e o Urban Legends Archive <www.urbanlegends.com>. Já o Ring of Folklore & Urban Legends <www.geoci ties.com/Athens/1401/urbanlegends.html> oferece uma abrangente lista de sites sobre hoaxes.”

“Produção de conteúdo para outras mídias”, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 7/10/03

“Lendo essa semana o weblog Tid Bits, um post da jornalista alemã Katja Riefler me chamou a atenção. Ela comentava sobre um site noticioso de seu país que estava produzindo conteúdo para as mídias impressa e radiofônica. O site, de Berlim, se chama Netzeitung . Ele produz para o Dresdner Morgenpost – um tablóide com circulação de cerca de 70 mil – uma seção diária chamada ?Geld? (em alemão, dinheiro) com notícias econômicas.

Segundo dados de Riefler, a seção foi publicada pela primeira vez há pouco mais de um mês. E há cerca de seis meses, oito estações de rádio alemãs estão também utilizando o conteúdo do site. O Netzeitung planeja expandir esse tipo de serviço – venda de conteúdo para outras mídias – que, de acordo com ele próprio, já representa uma quantia apresentável de sua renda.

Baseado nesse exemplo, comecei a pensar um pouco nesse mercado e cheguei a conclusão que, por incrível que pareça – pelo menos para mim, que quase todo dia leio notas a respeito de conteúdos impresso e online – a produção de material noticioso feito por um veículo online para outras mídias não é algo muito comum. Procurei por exemplos aqui no Brasil e só esbarrei com o modelo de vendas de conteúdo, que muitos sites costumam fazer. Mas quanto a um veículo assinar uma seção em um jornal impresso, não me veio nenhum exemplo à cabeça.

Um ponto positivo é que, se o mercado de conteúdo produzido por veículos online para as mídias impressa, televisiva e radiofõnica crescesse, talvez a falta de credibilidade das pessoas em relação ao meio online pudesse diminuir. Para André de Abreu, Colunista do Jornal do Brasil e arquiteto de informação da Universidade Anhembi Morumbi, o papel, que ainda tem um grande peso, poderia contornar a situação: ?Por incrível que pareça, o fato de sair algo em papel (como um jornal ou livro) ainda apresenta mais credibilidade do que se saísse em meio digital. No tal ?inscosciente coletivo? tem-se a idéia de que no papel o conteúdo passou para várias mãos e, por conseqüência, aquilo que sai publicado é o melhor do melhor. Já no online, ainda se tem aquela idéia de ?qualquer um faz e publica?. Portanto, a publicação no impresso de conteúdos digitais com certeza pode ajudar a aumentar a credibilidade de qualquer veículo online. Entretanto, é preciso saber se os leitores vão conseguir relacionar que o texto que estão lendo no jornal pertence a um site, e descobrir isso só com pesquisas?, comenta.

Um site noticioso assinar uma coluna ou uma seção em um jornal impresso pode parecer uma coisa utópica para alguns. Mas quem trabalha com jornalismo digital ou impresso sabe que entre essas duas mídias, as possibilidades de relacionamento em termos de conteúdo são muitas e perfeitamente viáveis. O buraco pode estar mais embaixo, no bolso. Para André, os jornais vêem o preço do conteúdo ainda como prioridade: ?o modelo de um site noticioso assinar uma seção para um jornal impresso pode pegar. Basta o site ter a qualidade de conteúdo das agências internacionais e cobrar mais barato. Infelizmente, o que manda ainda nas redações é o ?quanto custa? e não o ?quanto é bom?. Se o site tiver um bom conteúdo e for caro, pode ter certeza que o caro vai pesar muito mais que o conteúdo e aí a negociação pode não vingar. No entanto, se for bom o conteúdo a um preço acessível para os dois lados, as chances são grande do acordo dar certo. Obviamente, há excessões, mas na maioria das vezes o dinheiro acaba influenciando mais em qualquer decisão.?, diz André.

Gostaria de saber a opinião de vocês, leitores do Comunique-se. Histórias como o do Netzeitung podem se repetir? O modelo de um site noticioso produzir material periódico para outras mídias pode crescer? Vocês conhecem algum exemplo? Utilizem o formulário abaixo e registrem suas opiniões. Essa informação também me interessa. Até a próxima! 😉

Em tempo:

Quem souber alemão e quiser buscar mais informações sobre a parceria do NetZeitung com o jornal Dresdner Morgenpost, vale dar uma olhada no site Berliner Zeitung .”