Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mino Carta

COBERTURA DO TERROR

"Irados comunicadores nativos", Editorial, copyright Carta Capital, 26/09/01

"Editorialistas, colunistas… Só falta pegarem em armas e partirem para a cruzada antiterrorismo.

Domingo 16 de setembro, noite. No vídeo, close da expressão histórica do presidente. Não é que a fisionomia do imperador se caracterize pela mobilidade e pela intensidade, mas o tom da sua fala expõe a imponência do momento. Frederico Barba-Roxa não seria mais convincente ao partir para sua Cruzada. A terceira. Na qual morreu afogado, ao atravessar um rio, de armadura e tudo.

Bush, de fato, anuncia mais que a guerra, a cruzada contra o terrorismo. E garante: ?Mostraremos que somos a mais forte nação do mundo?. Como duvidar dele? Corte para Manhattan Connection, o célebre programa global. Ali, pelo jeito, ninguém duvida.

É certo, ao menos, que dois dos protagonistas do programa estão mais irados do que o próprio presidente dos Estados Unidos, mesmo porque dispõem de maior mobilidade facial e sabem usá-la com mestria consumada. Não são exemplos isolados da cólera que se apossou de vários comunicadores nativos diante dos atentados de Nova York e Washington.

Corte para as páginas mais cotadas da imprensa brasileira no fim de semana passado. A leitura revela que o Grande Irmão do Norte e seu presidente contam com algo além, bem além, da solidariedade da maioria dos editorialistas e colunistas verde-amarelos. É dedicação pronta e irrestrita, adesão comovida, apoio total. Não ficaríamos surpresos se alguns tomassem em armas e partissem para a cruzada.

Há também quem se insurja contra a suposição de que extremistas de direita americanos tenham participado dos atentados. Não há provas a respeito, talvez se trate de hipótese muito apressada. Mas faltam provas a respeito de coisas mais, e neste nosso mundo cada vez mais aparentado com o cinema dos efeitos especiais aconselha-se avaliar todas as possibilidades.

Por exemplo: não soa estranho que os serviços secretos americanos tenham sido tomados de surpresa – tão de surpresa, digamos assim? Não faltaram as comparações com o ataque japonês a Pearl Harbor. Investigações recentes revelaram, entretanto, que uma agressão nipônica era esperada pelo governo de Roosevelt.

Por que nada se fez para impedi-la? Eis aí uma grave pergunta, cuja resposta poderia ser a seguinte: Washington preferiu conveniências políticas ao sacrifício de tantas vidas e a ingentes danos materiais. A história conta inúmeros episódios semelhantes, e neles naufragam os chamados valores éticos.

Vale, de todo modo, encarar os fatos atuais de um ponto de vista jurídico, à luz de uma visão que deve pesar nas análises das chancelarias ocidentais. Se esse enredo acabasse em um tribunal, por enquanto não seria possível condenar Osama bin Laden. Ninguém pode ser alvejado pela Justiça na base da probabilidade, por mais forte. Até quando não aparecerem provas, in dubio pro reo.

É admissível que as provas surjam. Mas haverá outros motivos de resistência à adesão militar do Ocidente à cruzada de Bush. Os principais países europeus hospedam grandes comunidades de origem árabe, têm boas relações com o Oriente Médio e o Norte da África, inquietam-se com a incógnita chinesa. Etc., etc.

As Cruzadas se estabeleceram em cima do consenso. Entre o Sacro-Romano Império e o papa, com o apoio dos soberanos europeus e de suas cortes feudais. A tarefa de Bush é bem mais difícil. Até por causa disso, um punhado de bravos comunicadores, a bem da melhor informação, quem sabe devesse moderar a sua cólera."

"A origem dos atentados", copyright Época, 24/09/01

"Enquanto na parte mais iluminada do palco brasileiro uma procissão de desinformantes profissionais e idiotas amadores continua a alertar contra a ?paranóia? de George W. Bush, como se as explosões do dia 11 fossem imagens de delírio sonhadas pela direita para inventar um pretexto de maltratar indefesos esquerdistas, as análises feitas por pessoas que estudaram o assunto são mantidas rigorosamente fora do alcance de nosso povo, convidado assim a não entender nada dos acontecimentos que vão moldar sua vida, talvez de maneira trágica, ao longo dos próximos anos.

Uma dessas pessoas é o coronel Stanislav Lunev, um nome completamente desconhecido nesta parte do mundo. Membro do Estado-Maior do Exército russo, ele foi, ao longo da História, o mais graduado desertor da espionagem militar soviética, o GRU. Hoje é consultor de segurança do governo americano.

No início dos anos 90 ele alertou a CIA que a Rússia, em plena desmontagem do sistema econômico socialista, conservava intactos os chamados ?órgãos especiais? – especialmente o GRU – e que ali se desenvolviam planos meticulosos para uma guerra contra os Estados Unidos. Ele informava que ?essa guerra pode começar com uma operação diversionista algum tipo de ataque terrorista?.

Hoje, diante dos atentados, ele afirma: ?Não tenho dúvidas de que a Rússia esteja por trás desses grupos terroristas, financiando-os e equipando-os?. É verdade que o governo de Moscou declarou sua solidariedade aos EUA, mas ele também fez isso na Guerra do Golfo, ao mesmo tempo que enviava técnicos e equipamentos para ajudar Saddam Hussein. Sem uma aliança secreta russa com os afegãos, como explicar que esse povo, após ter 1 milhão de seus filhos mortos por tropas soviéticas, só sobrevivendo como nação livre graças à ajuda americana, de repente apagasse todas as mágoas contra seus agressores e se voltasse, com ódio insano, contra seu benfeitor?

É igualmente verdade que a Rússia, de maneira aparentemente despropositada e contrariando o consenso internacional, adotou em julho o padrão-ouro. Por que faria isso, se não soubesse que o dólar ia cair junto com as torres do World Trade Center?

Mais ainda, o comandante militar afegão Gulbaddin Hekmatiyar sempre esteve metido até a goela no esquema soviético de incentivo e aproveitamento do tráfico internacional de drogas, revelado às autoridades americanas, já em 1968, pelo general Jan Sejna, desertor do Ministério da Defesa tcheco onde era o porta-voz do Comitê Central do partido. Sejna foi testemunha direta dos acordos entre soviéticos e chineses, desde os anos 50, para inundar de cocaína os EUA e fazer do tráfico de drogas o suporte econômico da revolução comunista na América Latina, hoje em franca ascensão na Colômbia.

Por tudo isso é que o coronel Stanislav Lunev adverte, agora, que a escalada da violência antiamericana mal começou e que só uma resposta enérgica e decidida pode abortar os planos de uma guerra destinada, segundo declaração da Ulema-i-Afghanistan, a assembléia dos líderes religiosos afegãos, a promover nada menos que ?a total eliminação da América pela força?. Essa assembléia não tem nenhuma autoridade para convocar ao jihad todos os islamitas, como vem fazendo, pois essa convocação, segundo a lei corânica, só vale quando aprovada por toda a umma, a comunidade internacional dos letrados muçulmanos, e a maioria destes está decididamente contra a idéia monstruosa de uma guerra de extermínio. Mas, como explicarei num dos próximos artigos, os chamados ?fundamentalistas islâmicos? estão pouco se lixando para os fundamentos do Islã: sua ideologia não é islâmica, é uma espécie de ?teologia da libertação?, uma politização abusiva e macabra da mensagem do Corão. Por isso eles não têm escrúpulos de aliar-se aos assassinos de seus correligionários contra o país que, no momento da agonia, estendeu a mão salvadora aos combatentes muçulmanos."

 

"Entrevista com líder dos talibãs é censurada", copyright O Globo / Washington Post, 24/09/01

"A Voice of America (VOA) – A Voz da América – uma organização internacional de radiodifusão que tem o apoio do governo americano, decidiu não levar ao ar, na última sexta-feira, uma reportagem que incluía trechos de uma entrevista inédita com o líder do regime Talibã no Afeganistão, o mulá Mohammed Omar, segundo informações oficiais divulgadas ontem.

A decisão foi tomada depois que o secretário de Estado do Congresso, Richard L. Armitage, e membros do Conselho de Segurança Nacional entraram em contato com integrantes da junta de diretores da VOA para expressar suas preocupações. Para eles, a divulgação da entrevista poderia servir de plataforma para os terroristas.

– Nós explicamos aos diretores da rede que não achávamos apropriado difundir, na VOA, a voz do Talibã no Afeganistão. Além do mais, não era coerente com o seu estatuto – afirmou o porta-voz do Departamento de Estado americano Richard A. Boucher.

A reportagem, de quatro minutos, enfocava a reação afegã ao discurso do presidente Bush e incluía breves depoimentos de Omar. A decisão de não veicular a reportagem irritou a equipe:

  • Fiquei completamente chocado. Isto vai contra cada princípio da ética jornalística – disse um jornalista da VOA, que não se identificou."

    
                         
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