Tuesday, 19 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Mino Pedrosa e

FARSA DA FITA

"Na sexta-feira 17 o foneticista Ricardo Molina pôs fim a uma dúvida que mobilizou a Comissão de Ética do Senado nas últimas três semanas. Ele concluiu que a fita contendo uma suposta conversa telefônica entre o deputado estadual Mário Frota (PDT-AM) e o empresário David Benayon, envolvendo o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) em um esquema de propinas na Sudam foi montada. A voz gravada não é a de Frota, mas, sim, a de seu ex-assessor Nivaldo Marinho. ?O laudo esclarece a verdade: a voz não é minha. Mas é preciso que as investigações sobre a Sudam não parem. A Sudam era uma podridão?, diz o deputado, com o conhecimento de quem coordenou o escritório do órgão em Manaus. ?No Amazonas nada podia ser feito, pois tudo era centralizado em Belém com o superintendente José Arthur Tourinho.? O delegado da Polícia Federal Nilson Antunes Silva, responsável pelo inquérito que investiga a Sudam no Amazonas, concorda. Segundo ele, apesar de a fita ser fraudada, a maior parte do conteúdo da gravação continuará a ser investigada. A fita, revelada por ISTOÉ, aponta para a existência de corrupção em dois projetos da família Benayon na Sudam. Em um deles, a Bipacel, Benayon Papel e Celulose, há suspeitas de que foram desviados quase R$ 9 milhões liberados pela Sudam entre 1994 e 1995.

Há indícios de que a Bipacel falsificou extratos bancários. Em outro, a Amazombac, foram liberados mais de US$ 4 milhões, mas o projeto não saiu do papel.

Na última semana, ISTOÉ apurou como a fita foi montada. Em março, Marinho encontrou-se com o deputado Pauderney Avelino (PFL-AM), inimigo político de Mário Frota, e reclamou da vida. Disse que o salário, cerca de R$ 400, que recebia no gabinete de Frota era insuficiente e comentou que ouvira várias vezes o patrão conversar com Jader sobre liberação de recursos na Sudam. ?O deputado disse que eu tinha uma boa história, que poderia ser contada através de uma fita, porque minha voz era muito parecida com a do Frota. Com isso, eu poderia ganhar um dinheirinho?, afirmou Marinho. Dias depois, ele foi procurado por João Coelho Braga Júnior, filho do presidente do Tribunal de Contas do Amazonas e secretário estadual de Obras. Braga Júnior é considerado o menino de ouro do governador Amazonino Mendes. Pauderney e Braguinha são velhos conhecidos. O deputado é sócio da empreiteira Capital, que detém diversas obras do governo estadual, e Braguinha é quem cuida das licitações. ?O Braguinha me prometeu duas casas, um dinheiro para viver bem e garantiu que nada seria descoberto, mas nada disso foi cumprido?, lembra o ex-assessor. ?Ele falava constantemente como uma pessoa no telefone e a chamava de chefe.? Marinho conta que de março até a semana passada recebeu R$ 12 mil: ?Braguinha sempre me pagou em dinheiro. A primeira vez me deu R$ 2 mil, depois me deu duas parcelas de R$ 5 mil.?"

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"A fita foi gravada na casa de Marinho em abril deste ano, quando começaram a ganhar destaque na mídia os indícios da participação de Jader no esquema Sudam. ?Usei parte do dinheiro para comprar o gravador e a fita?, afirma. Disse que o teor da conversa simulada é, na sua maior parte, verdadeiro. O texto foi preparado por ele mesmo e revisado por Pauderney, que já esteve envolvido com gravações no escândalo da compra de votos para a aprovação da reeleição. ?Gravei a fita, entreguei ao Braguinha e, por orientação dele, destruí o gravador?, diz Marinho.

O ex-assessor afirma que passou a ter contatos diários com Braga. Lembra que, depois de a fita ser divulgada por IstoÉ, o secretário alugou uma casa para ele em Manaus. ?Quando o deputado disse que a voz não era dele, Braguinha me orientou a confirmar tudo para a imprensa. Disse que eu deveria manter a calma, pois já estava tudo acertado e o laudo de comprovação da voz ia confirmar a história?, conta. ?Por causa disso, fui prestar depoimento na Polícia Federal.? Marinho afirma que começou a sentir medo quando a Comissão de Ética desembarcou em Manaus. ?Fiquei apavorado quando disseram que o Molina faria uma reconstituição na casa do Frota.? Braguinha tranquilizou-o: ?Ele disse que tinham conversado com o senador Romeu Tuma e só me fariam três perguntas. Garantiu que não teria nenhuma reconstituição. Mas não foi isso o que aconteceu.?

Depois do depoimento de Marinho na Comissão de Ética, Braga lhe entregou os últimos R$ 5 mil. ?Comprei uma passagem e fui para Porto Velho?, explica. Na quarta-feira 15, ao tomar conhecimento do que seria o resultado do laudo de Molina e sentindo-se abandonado pelos demais autores da armação amazônica, Marinho resolveu entregar todo o esquema para a PF e pedir garantia de vida. ?Esse rapaz de fato corre risco?, diz o delegado Nilson Antunes Silva. Na PF, o depoimento de Marinho foi recebido como digno de credibilidade. O que pesa a favor disso é uma suposta declaração do dono da Amazonáutica, repassada à imprensa durante os depoimentos tomados pelos senadores. O documento dizia que os motores do barco de Frota teriam sido pagos pelo próprio deputado e por David Benayon, o que confirmaria parte da armação protagonizada por Marinho. O problema é que na segunda-feira 13 o dono da Amazonáutica compareceu à PF e negou ter redigido tal declaração, o que foi confirmado por exame grafotécnico. Quem entregou o documento a ISTOÉ foi Braguinha.

Durante as quase três horas de depoimento de Marinho à PF, por diversas vezes seu telefone celular tocou. Do outro lado da linha falava Braguinha. Marinho não dizia onde estava, mas a conversa foi gravada pela polícia, com a autorização dele. Para finalizar, o ex-assessor entregou ao delegado os números dos telefones que usava para conversar com Braga e com Pauderney. Nessa semana, a PF começará a fazer os respectivos rastreamentos telefônicos."

    
    
                     

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