BILLY-WILDER (1906-2002)
Alberto Dines
O famoso cineasta austro-americano chegara aos 95 anos de vida. Mesmo considerando corriqueira a casa dos 100 anos, Billy Wilder estava numa faixa de risco, não apenas médico como jornalístico. Isso significa que, considerando a vulnerabilidade da condição humana, sua biografia e necrológio já deveriam estar prontos ou mesmo compostos ? prontos para a divulgação. Esta antecipação tem a ver com um dos fundamentos da atividade jornalística ? enfrentar os imprevistos.
Obituários, ao contrário do que parece, não são manifestações mórbidas nem se destinam ao público inclinado para o macabro. Lembrar os mortos é uma forma de ressuscitá-los e vencer a morte ? primeiro dever dos vivos.
A seção dos obituários tem sido na imprensa anglo-saxônica uma escola para a formação de biógrafos e a biografia consagrou-se como parceira privilegiada do jornalismo no ferramental da historiografia.
Não se justifica, portanto, a pobreza dos obituários sobre Wilder aparecidos na imprensa brasileira, durante a Semana Santa. Pródigos no espaço, destaque e devoções, mas o teor foi insatisfatório. A fonte consultada foi praticamente a mesma ? a versão brasileira da biografia Billy Wilder, o resto é loucura, de Helmuth Karasek (DBA,1998), deliciosa porém superficial. E o trecho preferido pela maioria foi a orelha assinada por um jornalista brasileiro. Tudo muito anedótico, folclórico e linear, no bom estilo das editorias de variedades que hoje domina os suplementos culturais.
A bibliografia sobre os anos dourados de Hollywood é riquíssima, assim também sobre a cultura vienense da qual Wilder foi legítimo herdeiro. Pouco foi aproveitado.
Graças à longevidade e sua capacidade de reaparecer periodicamente, Wilder ofereceu aos obituaristas a chance de preparar com esmero seu perfil biográfico que é, ao mesmo tempo, um retrato do século 20. Penhorados, retribuíram à altura. Menos os nossos.