Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Na mira de hackers patriotas

AL-JAZIRA

Beatriz Singer

Uma das mais notáveis novidades do conflito no Iraque é a quantidade de fontes de informações alternativas, facilmente criadas a partir de um computador e conhecimentos básicos de internet. Esta é a primeira guerra com acesso total à rede. Alguns sítios de notícia, conforme relato da Nielsen NetRatings, ultrapassaram o dobro do número de visitas sobre a semana anterior ao início da invasão americana. Assim como os blogs [veja lista de blogs em artigo desta edição], sítios alternativos como o da emissora al-Jazira, do Catar, são parte do mesmo fenômeno, segundo Dan Ackman em artigo à Forbes.com (26/3/03).

O lançamento do sítio da al-Jazira em inglês, cujo endereço oficial é http://english.aljazeera.net, foi no dia 24/3, segunda-feira. Mal inaugurou, a fonte de informação considerada alternativa foi logo retirada dos milhões de internautas ávidos por notícias da renomada emissora árabe, tida como menos tendenciosa em relação aos meios de comunicação americanos em geral.

Nos dias seguintes, as conversas em grupos de discussão e weblogs giravam em torno de especulações sobre o que teria ocorrido com sítio. Com visitas crescentes, a página de repente ficou incomunicável. Talvez por excesso de acessos, situação a que o sítio não estava preparado, diziam alguns; ou bloqueio por filtro, procedimento comum em ditaduras, diziam outros. Afinal, chegou-se a um veredicto consensual: o sítio fora invadido por hackers.

Na terça-feira, dia 25/3, a al-Jazira sofreu nova invasão, desta vez confirmada por Ayman Arrashid, administrador de sistemas da Horizons Media and Information Services, empresa que hospeda o sítio. Segundo Arrashid, apenas servidores americanos sofreram ataques. Isso é prova de que os hackers provavelmente estavam nos EUA.

Alternativas de acesso ao sítio da emissora surgiram rapidamente. Podia-se acessar a página pelo endereço numérico, 64.106.198.16, por sítios de navegação anônima como The Cloak e Anonimyzer, e pelo endereço www.aljazeerah.info. Sobre esse último endereço, Pedro Doria, em seu blog hospedado no no mínimo, disse em 26/3 que, "numa primeira vista, não carrega o logo da emissora e republica conteúdo em inglês da grande imprensa árabe. Ainda assim, concentra bastante material vindo do Oriente Médio".

Não houve trégua. Na quinta-feira, dia 27/3, o sítio voltou a ser bombardeado por hackers. Desta vez, a coalizão de corruptores virtuais não fez questão de esconder o patriotismo. A página de entrada foi substituída por uma bandeira americana com a mensagem "Let Freedom Ring" (em português, "deixe a liberdade soar") ? recado no mínimo intrigante, uma vez que os perpetradores da invasão não concediam à emissora a liberdade e o direito de compartilhar o espaço infinito do mundo virtual.

Antes disso, outros hackers que se identificaram como um grupo chamado "Freedom Cyber Force Militia" seqüestraram o tráfego do sítio e encaminharam os internautas a uma página armazenada nos computadores de um provedor de acesso de Salt Lake City. A página, que depois foi removida, exibia a frase "Deus abençoe nossas tropas", assinada por alguém que se autodenominava um "patriota". Horas mais tarde, o sítio foi redirecionado novamente, desta vez para uma página onde se lia "dominado por Saimoon Bhuiyan".

"Certamente foi um ataque de hackers", afirmou Jihad Ali Ballout, administrador de comunicação da emissora. Ele descreveu o ataque como uma "afronta viciosa à liberdade de imprensa".

Desde que mostrou fotos de soldados americanos mortos ou presos
no Iraque, a página em inglês da al-Jazira não
tem tido brechas para respirar. A imagem abaixo, capturada em 27/3/03
pela AP, mostra a ação dos hackers sobre o sítio.
[Com informações da Associated
Press e da Forbes.]