Tuesday, 19 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Nada de novo no controle da informação

LIÇÕES DO EMBARGO

Alberto Dines

O assunto já saiu da pauta porque a imprensa, em geral, não tem fôlego para manter qualquer coisa durante muito tempo. Sobretudo porque a imprensa detesta estar na pauta.

A telenovela dos seqüestros da família Abravanel encerrou-se, mas é preciso reprisar um de seus capítulos para retomar um tema que, na emoção e no calor das coberturas, foi insuficientemente aprofundado.

Nos últimos oito meses, a mídia brasileira protagonizou dois pactos de silêncio. O primeiro foi um embargo clandestino, informal e envergonhado, articulado pelo então senador ACM com o seu vasto círculo de amigos nos altos escalões dos principais veículos de comunicação para abafar qualquer menção ao lançamento do livro de João Carlos Teixeira Gomes, Memórias das Trevas, uma devassa na vida de Antônio Carlos Magalhães. Um caso clássico sobre o coronelismo mediático que mereceria ser estudado por cientistas políticos.

O segundo embargo noticioso ? este ostensivo e assumido ? ocorreu agora, durante o seqüestro de Patrícia Abravanel, quando grande parte da mídia sediada em São Paulo resolveu abdicar da sua função pública e omitir qualquer referência ao episódio [veja remissões abaixo].

Passado o susto, superada a discussão policial e detetivesca que tanto fascina nossos jornalistas, restaram amargas constatações:

** nossa imprensa sente-se à vontade com os embargos noticiosos;

** nossa imprensa digere bem a auto-censura;

** nossa imprensa não estranha quando algo impede o livre curso das informações ? apelos corporativos, pedidos de amigos, listas negras com os nomes dos inimigos.

Juntos ou separados, os dois embargos desvendam uma facilidade generalizada de acomodação com situações de exceção. Generalizada porque enquanto o primeiro embargo (para proteger ACM) funcionou dentro de um grupo de veículos e empresas, o segundo foi furado por outro grupo.

Somados, fazem a totalidade da chamada Grande Imprensa. Somados, indicam uma propensão coletiva e de certa forma prazerosa para cumprir ordens e servir-se da mordaça. O pretexto recente foi humanitário. Amanhã poderá ser cívico ou patriótico. Corporativo ou punitivo.

Entre nós, a defesa da liberdade de expressão é intransigente na teoria, nos panfletos, nos trabalhos acadêmicos e nos abaixo-assinados. Nisto somos imbatíveis. Na prática, na hora de testar os princípios diante da rudeza da realidade, curvam-se todos ? juristas, jornalistas, professores e políticos.

Afinal, o que há de pernicioso no suave e delicado gesto de baixar as cortinas?

    
    
              

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