Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nas mãos de muito poucos

VIDEOJORNALISMO

Angelo de Souza (*)

É impossível não concordar com o professor Antônio Brasil quando ele apresenta o jornalismo (até mesmo o telejornalismo e seu espetáculo de "luzes, cor e magia") como vocação dos que questionam o poder e os poderosos [ver remissão abaixo]. A esperança de que continue sendo assim na idade digital não morre facilmente.

No entanto, o que nos é oferecido em telas de cristal e satélites, ilhas não-lineares e lentes microscópicas, além de velocidade e irreflexão?

Não muito. A qualidade estética da imagem caiu e a ética do conteúdo, desabou.

A culpa não é da tecnologia, nem do tempo e seus costumes: uma só tem evoluído, os outros permanecem mais ou menos os mesmos desde que o mundo é mundo. Estão aí os tais poderosos, em Londres ou nos sertões, e os que com eles compactuam, a desmentir antigas e novas promessas de democracia.

Idéias na cabeça

O professor não nos deixa esquecer que a TV é provavelmente o meio de comunicação menos democrático que existe, e ainda talvez o mais fascinante. Por conta desse fascínio, tantos se submetem a salários, jornadas e condições de trabalho indignas de um jornalismo digno. E o que resta de democracia ? digo, de compartilhamento de responsabilidades ? parece diretamente ameaçado pelo videojornalismo.

Em seu A notícia na TV (São Paulo, Alegro, 2002), Olga Curado lembra que a atenção auditiva fica prejudicada quando o cérebro do jornalista se ocupa daquilo que o visor traz aos olhos. Ou seja, duas cabeças ? pelo menos ? pensam melhor do que uma na captação do material audiovisual bruto.

A experiência da telerreportagem ensina o valor inestimável da parceria com o olhar especializado do repórter cinematográfico. E não há como diminuir a importância da retaguarda de apuração, pauta, produção, chefia, assim como a das etapas seguintes na linha de montagem, da edição à apresentação. Mobilidade, autonomia, por mais que aumentem no novo modelo, não justificam a eliminação do antigo na maioria das circunstâncias que exigem elevação do padrão em termos de imagem, de rigor na coleta de dados, de criatividade no texto, de respeito pelo telespectador.

Nada do exposto até aqui foi desconsiderado pelo professor Brasil, que tampouco é entusiasta gratuito da videorreportagem. Sabemos que no Brasil ela pode servir para apenas cortar custos, assim como a câmera oculta tem feito pouco mais do que flagrar alvos de denúncia. Nenhuma das duas fórmulas pode, por si só, contribuir para a melhoria da qualidade do jornalismo em televisão.

Corações e mentes de qualidade, por trás das câmeras e à frente delas. Idéias na cabeça ? é disso que precisamos, creio que mais do que de câmeras em mais e mais mãos, todas a serviço dos mesmos donos. Não há motivos para crer que equipes maiores ou mínimas façam a diferença de que precisamos, como profissionais e como público, se a diferença pretendida for só de quantidade.

(*) Jornalista, professor da UFPA

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