TRIBUNA DA IMPRENSA
Nascimento e morte de um jornal
Luís Edgar de Andrade
Pouca gente sabe. Quando o repórter Carlos Lacerda, já famoso no Rio de Janeiro, largou em 1949 o Correio da Manhã, em divergência com a direção do jornal, a primeira idéia que lhe passou pela cabeça foi pedir um emprego de novelista na Rádio Mayrink Veiga. Diante do sucesso que fazia na Rádio Nacional a novela cubana O Direito de Nascer, sentiu-se tentado a abandonar o jornalismo, embora sua experiência na ficção fosse um livrinho muito fraco, de que se envergonhava ? Bailarina Nua Solta no Mundo.
Façamos de contas que, nessa ocasião, ao invés de fundar a Tribuna da Imprensa, como aconteceu, Lacerda tivesse optado mesmo pela radionovela. Como seria o Brasil de hoje? Claro que diferente. Sem as denúncias de Lacerda, Getúlio Vargas não teria se suicidado. E, muito menos, Jânio Quadros renunciado. Sem a renúncia de Jânio, é provável que não tivesse havido a ditadura. Seríamos todos mais felizes.
No final dos anos 40, Lacerda escrevia no velho Correio a coluna política "Da Tribuna da Imprensa". Nela havia coberto, com muito sucesso, a Assembléia Constituinte de 1946. Mas pediu demissão quando o dono do jornal, Paulo Bittencourt, o proibiu de criticar o grupo econômico Soares Sampaio, que tinha ganho, no governo Dutra, a concessão para instalar uma refinaria de petróleo.
Dezenas de amigos foram a seu apartamento para prestar solidariedade. No meio deles, um deputado de 25 anos, Aluizio Alves, eleito pela UDN do Rio Grande do Norte, no 2? ano de Direito. Achando que nenhum jornal lhe daria emprego, Lacerda tinha decidido tentar a radionovela. Foi Aluizio que sugeriu a alternativa: "Por que não monta um jornal?" O outro abriu a boca: "Eu? Com que dinheiro?" Na manhã seguinte foram juntos ao escritório do milionário Lauro Carvalho, dono da loja de roupas "A Exposição", que se ofereceu como acionista: "A idéia pode ser ousada, mas nada tem de maluca".
Assim nasceu a Tribuna da Imprensa ? o primeiro jornal brasileiro, talvez o único, cujo capital foi levantado em subscrição popular. Em poucos meses, milhares de cariocas de todas as classes, unidos pela admiração a Lacerda, compraram ações do futuro jornal. Até que, um dia, o jovem autor da idéia recebeu um telegrama, em Araxá, Minas Gerais, quando representava a Câmara de Deputados num Congresso das Classes Produtoras: "Convoco redator-chefe Tribuna da Imprensa vir assumir seu posto. Abraço fraternal, Carlos Lacerda".
O jornalista Aluizio Alves, que chefiou a Tribuna de 1949 a 1958, contou a movimentada história do jornal na quinta-feira, 4/5, na Associação Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro, durante o lançamento do seu livro de memórias O que eu não esqueci (Leo Christiano Editorial, 239 páginas, R$ 30,00). O mundo dá muitas voltas. No meio da palestra chegou à ABI a notícia divulgada na internet pelos jornais online: oficiais de justiça estavam lacrando, na rua do Lavradio, a redação do antigo vespertino, para executar o decreto de falência. Quem te viu e quem te vê.
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