Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Nelson de Sá

CRÍTICA DIÁRIA

"Tudo e nada", copyright Folha de S. Paulo, 18/01/02

"De um lado, ?nada contra a estabilidade?. Do outro, ?tudo contra a desigualdade?. No meio do caminho de seu slogan supostamente de impacto, sem abraçar nem questionar o governo de Fernando Henrique, o discurso de José Serra não aconteceu.

Quem conseguiu ouvir pelo rádio, já que o lançamento não foi transmitido nem pelos canais de notícia Globo News e Band News, esperou e esperou, mas as palavras do pré-candidato soavam quase sempre constrangidas.

Tão constrangidas quanto estavam as fisionomias dos líderes tucanos sentados ao seu lado, na mesa, como se viu depois nos telejornais.

A retórica de Serra estava sempre ameaçando avançar pela crítica à política econômica -mas parava a um passo de realizar o desejo.

O tucano, como se sabe de incontáveis campanhas pela televisão, já não é candidato nato, não tem empatia. Sem dramaturgia que o sustente, com conflito bem definido, parece desaparecer na tela.

Sobra a sua obstinação, que ele tratou de sublinhar em seu próprio discurso -e da qual vai depender, ao que parece, sua campanha.

Se Serra anda sem dramaturgia, a campanha de Roseana Sarney, pelo jeito, anda sem idéias novas.

Um dos comerciais que o marqueteiro Nizan Guanaes jogou no ar, para fazer frente ao lançamento tucano, é uma cópia mal disfarçada dos comerciais que ele mesmo criou para os produtos da Parmalat.

São os bichinhos da Roseana, agora.

Eles eram ótimos para vender laticínios com emoção e são também muito promissores na venda de candidatos, que ninguém duvide.

Mas não foram os comerciais de Roseana Sarney a maior concorrência de José Serra na televisão, ontem. Pelo menos nos telejornais, o que mais marcou em toda parte foi o resgate de presos em Guarulhos.

Um dos programas policiais de início de noite, Brasil Urgente, foi transmitido diretamente da cidade, com o âncora na porta da cadeia.

Globo e Record fizeram reconstituição com desenhos animados elaborados, do helicóptero descendo no pátio e resgatando os dois presos.

Uma expressão correu os vários canais:

– Fuga espetacular.

Certamente, um espetáculo bem mais emocionante do que o que José Serra encenou, ontem em Brasília."

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"Crítica nenhuma", copyright Folha de S. Paulo, 17/01/02

"Foram meses de vaivém, de recusa do óbvio, para chegar ao meio-dia de hoje e José Serra anunciar-se presidenciável.

Deve ser o que mais irritou Tasso Jereissati. Não houve disputa nos meses e meses em que ele tentou se apresentar como alternativa tucana.

Anuncia-se agora, na Globo News, na CBN, que a sua entrada na cerimônia de lançamento da candidatura será de impacto -ao lado de Renata, filha de Mário Covas, e de tucanos que o apoiaram.

Jereissati pode até roubar um pouco a cena, mas, como dizia ontem Franklin Martins, no dia seguinte o candidato tucano será José Serra.

A cena de hoje promete muita ?união?, diz Alexandre Garcia:

– Vai ser um discurso de união. Por união, entenda-se que Serra não vai fazer crítica nenhuma aos companheiros da aliança governista, como Roseana Sarney e Itamar Franco, e muito menos a seus companheiros, como Pedro Malan e Tasso Jereissati.

Pelo tortuoso raciocínio de Garcia, é como se Itamar apoiasse o governo e Malan fosse tucano. Como se todos fossem muito unidos.

Mas talvez sejam, mesmo. Por exemplo, Pedro Malan já anuncia através do Bom Dia Brasil que vai se engajar no debate eleitoral, supõe-se que em favor do candidato de FHC.

Serra já tem inauguração marcada para amanhã, como ministro da Saúde, mas também já ?oficialmente? como presidenciável, no Nordeste de Roseana Sarney.

De outro lado, más notícias na área da saúde começam a se apresentar. Por exemplo, na Jovem Pan, que registrava ontem que ?a dengue começa a apavorar o carioca?.

Existe ?risco de epidemia?. Em 2002, está sendo registrado um novo caso de dengue a cada hora, no Rio.

Em sua cobertura agora cotidiana da campanha, o Jornal Nacional trata até mesmo Pratini de Moraes como presidenciável.

Mas nada de Eduardo Suplicy, o ex-marido de Marta. Ele que ontem surgiu, sempre quixotesco, dizendo ter mais chances eleitorais do que Lula, no Jornal da Record.

Ano eleitoral -e a Polícia Federal de FHC vai mesmo ?entrar em guerra? com os donos de postos de gasolina ?cartelizados?, diz a Globo. Foi manchete no JN, ontem:

– A Polícia Federal cria uma delegacia para investigar preço de gasolina."

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"Inquestionável", copyright Folha de S. Paulo, 16/01/02

"O Jornal Nacional entrou na cobertura eleitoral, ou ainda, na campanha. Alexandre Garcia, velho conhecido, apresentou um longo painel dos presidenciáveis.

Primeiro, José Serra. Garcia falou do lançamento e da disputa no PSDB, mas lembrou ter conversado pouco antes com Tasso Jereissati:

– Ele disse que será inquestionável o apoio dele.

Depois mencionou rapidamente, em sequência, Roseana Sarney, Pedro Simon, Itamar Franco e Raul Jungmann, dos partidos da ?base?.

Depois, Lula e, de passagem, os demais da oposição.

Encerrado o painel, entra uma reportagem sobre como Hugo Chávez prometeu uma revolução na Venezuela e entregou um país em ?crise?.

Para quem não conhecia, isso é só o começo.

Roseana Sarney voltou aos intervalos comerciais, ela que parece nem ter saído.

E agora com um discurso que parece ter encontrado seu novo alvo, seus antagonistas não-declarados, nos divididos tucanos. Em José Serra.

Numa inserção, busca escapar da imagem de presidenciável nordestina -ela que ?morou em São Paulo?, como diziam seus primeiros comerciais.

Um presidente, diz Roseana na nova inserção, cercada por uma guarda militar, sob a bandeira brasileira, deve cuidar de todas as regiões, ?sobretudo as mais pobres?. Não, não se trata do Nordeste: ?mais pobres? são ?as grandes cidades?.

Diz ela que ?presidente não pode se preocupar só com uma região?, ou ainda, ?não pode ser presidente de São Paulo?.

A escolha de Serra como novo antagonista não é à toa, na estratégia do PFL. Até maio, até a Copa, Serra e Roseana estarão disputando uma eleição particular, só deles, nas pesquisas. Lula é para depois.

Na Record, uma repórter em Salvador narra:

– Sorridente, Popó chegou ao gabinete de ACM, para agradecer o apoio recebido.

ACM fala:

– [Popó? levou o nome da Bahia a campeão do mundo na sua categoria. Isso é motivo de orgulho para todos os baianos.

Da repórter, para Popó:

– Você é candidato?

Popó:

– Ainda não, eu só dependo do meu chefe aqui [ACM] para botar certinho no PFL, que esse é o meu partido.

O apresentador Luiz Datena, boquiaberto, só disse:

– Nas vezes em que o esporte foi usado por políticos no país, a experiência não foi boa. Popó, continue lutando que é o que você sabe fazer."

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"Rota petista", copyright Folha de S. Paulo, 15/01/02

"O primeiro serviço que Duda Mendonça prestou para José Genoino foi na campanha para deputado, há quase quatro anos.

Foi a produção de uma foto -usada para vários fins- em que o ex-guerrilheiro surgia de barba grisalha, cabelo alinhado, um terno dos mais respeitáveis. Um personagem rigoroso, quase severo.

O segundo serviço de Mendonça, já contratado pelo PT e não mais por Paulo Maluf, foi há quatro meses, num programa protagonizado por Genoino.

O personagem já se apresentou mais aprofundado. Foi chamado de ?maduro e responsável?, visitou canteiro de obras, usou terno preto.

E ele próprio, Genoino, disse ao fechar o programa que ?o maior? problema de São Paulo ?é a insegurança?. Prometeu ?autoridade e comando?.

O terceiro serviço ainda não foi ar, mas o personagem, ao que parece, aprofundou-se mais.

Em entrevista anteontem, saiu dizendo que ?uma política de direitos humanos não deve impedir a Rota de agir com energia e força?.

Pode-se afirmar que o petista está jogando para a geral. Que sua repentina descoberta do valor da Rota é só influência temporária do marketing eleitoral.

Mas as palavras -a retórica, ou ainda, a dramaturgia- têm por vezes o poder de tornar-se realidade.

Engatinhando na cobertura, a Globo registrou que José Serra começa a se mostrar candidato ?oficialmente? esta semana. E que o PT de Lula faz prévia.

Todos engatinham, enquanto Roseana Sarney e os profissionais do PFL já têm comerciais programados -e aprovados por grupos de discussão- de hoje até segunda.

De sua parte, esquecido pela TV, Ciro Gomes cavou seu espaço ontem com o que sabe fazer melhor. Distribuiu xingamentos, de ?palhaço? para um, de ?canalha? para outro. Conseguiu, apareceu.

A CNN, a exemplo do que se viu por aqui com Soninha, está fazendo a farra com o príncipe que fumou maconha.

Mas a correspondente inglesa não consegue se adequar à severidade do âncora americano da CNN. Depois de ouvir uma pergunta do tipo ?como é que pode?, ela falou:

– Ir ao pub é o que os jovens fazem aqui. E o que Harry fez, durante a maior parte do tempo, foi perfeitamente inocente.

Pausa. E ela diz:

– Na verdade, eu acredito que durante todo o tempo ele foi perfeitamente inocente."