ELEIÇÕES 2002
"No ar", copyright Folha de S. Paulo
"13/09/02 – Em xeque
A cena de Fernandinho Beira-Mar vitorioso, andando livremente, mascando chiclete, sem camiseta, em momentos até rindo, deve ampliar ainda mais o estrago que a realidade já fez na campanha.
Boris Casoy perdeu a paciência. Não escondeu que considera a petista Benedita da Silva responsável. Recordou um a um os sinais que vinham de semanas, no presídio, e bradou:
– É muita incompetência! 46 presos colocando um governo estadual em xeque.
Benedita não fez muito para melhorar a situação, ela e seu secretário de Segurança, ao reclamar sem parar nos telejornais a transferência do traficante ?para outro Estado?.
Foi a expressão que o Jornal Nacional usou, sublinhando que as passagens por presídios de Minas e Brasília também não conseguiram limitar o poder de Beira-Mar.
Um momento especialmente infeliz do governo petista foi a entrevista da Globo com o secretário, logo cedo:
– Terminou a rebelião?
– Terminou. Os reféns foram soltos e nós estamos dentro do presídio. O povo do Rio pode ficar em paz, porque o sossego foi reinstalado.
William Bonner, no tom de indignação da cobertura do JN, voltou a lembrar a morte de Tim Lopes e bradou em editorial, como um udenista:
– Intolerável!
A diferença para Casoy foi que, além do ?governo estadual?, Bonner cobrou o ?governo federal?, ainda que somente para ?ajudar?.
Benedita, entre muitas frases infelizes, disse à Globo:
– Nós vamos repudiar todo o uso eleitoral que se possa fazer disso.
Pois uso eleitoral foi o que o próprio PT tratou de fazer, o dia todo, ainda que mais para dividir o estrago com terceiros do que para recusar a própria responsabilidade.
É claro que Garotinho -em seu site- foi ao ataque, dizendo que a rebelião foi ?o coroamento da política fracassada de segurança do PT?.
Mas foram os líderes petistas que mais recorreram ao tema, a começar de Lula.
O presidenciável já saiu declarando seus ?parabéns? à governadora. Partiu daí para dizer que a rebelião não era um problema ?específico? do governo petista.
E encerrou afirmando que é preciso deixar criminosos mais perigosos sob responsabilidade federal.
Ciro Gomes consegue se emaranhar ainda mais.
Apelar no horário gratuito, com os olhos na câmera, para a ?saúde? de Patrícia Pillar é um acontecimento único na história eleitoral do país.
12/09/02 ? Dia de Garotinho
O plantão da Globo surgiu na tela, no meio da manhã, em pleno 11 de setembro. Mas não era o anúncio urgente do início da guerra ou de um novo atentado.
Era a rebelião em Bangu 1, presídio do Rio. Horas depois, Luiz Datena, apresentador do Cidade Alerta, comentaria, em meio à cobertura:
– 11 de setembro é todo dia no Brasil. Temos até um Osama bin Laden, que é o Fernandinho Beira-Mar.
E assim as cenas do distante drama norte-americano deram lugar à tragédia nacional de morros e favelas.
Benedita da Silva, governadora petista candidata à reeleição, foi ao presídio e deu a autorização para a invasão, bradaram os telejornais.
FHC anunciou pelo porta-voz, também pela televisão, que ele ?respalda as medidas no sentido do restabelecimento da ordem no presídio?.
Até um presidiário de Bangu 1, supostamente do Comando Vermelho, apareceu via celular para dar a versão de Beira-Mar, no Brasil Urgente, de Roberto Cabrini.
Mas foi o presidenciável Garotinho quem fez a festa, na televisão, em cima da petista, do tucano e do traficante.
Ele responsabilizou a governadora que apóia Lula e o presidente que apóia José Serra pela transferência de Beira-Mar para Bangu 1. Disse que foi feita dois dias depois que ele, Garotinho, deixou o governo. E que ele jamais permitiria.
Foi o que disse já no final da tarde, em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Mas desde a manhã ele vinha explorando todas as oportunidades para tratar de Bangu 1.
Em sabatina no próprio Rio de Janeiro, por exemplo, ensinou que ?para controlar o poder paralelo é necessário autoridade?. E descreveu sem parar como deixou o Estado com segurança pública em ordem, contratou policiais, reformou delegacias, presídios etc.
Foi o dia de Garotinho na campanha.
Por toda parte, com cobertura dos telejornais e da CBN, falava de supostas pesquisas internas, de sua campanha, que já mostrariam que ele está em terceiro lugar, três pontos à frente de Ciro Gomes.
De seu lado, como se viu nos telejornais, Ciro passou o dia dizendo que as pesquisas, não a de Garotinho, mas todas, são parte de uma conspiração contra sua candidatura.
William Bennett, que foi assessor de Ronald Reagan, falando sobre o 11 de setembro e a nova guerra, na CNN:
– Entrar sozinho (na guerra) é a tradição americana. Este é o país que importa.
Os outros, disse, vêm depois.
11/09/02 ? Paz e amor no tiroteio
Era para José Serra começar a bater em Lula -e isso de fato aconteceu, ontem na propaganda.
O inesperado foi ver nos telejornais que Ciro Gomes e Garotinho também se voltaram contra o petista, que ameaça levar a eleição no primeiro turno. De Garotinho:
– Em vez de Lula ?paz e amor?, devia ser ?tudo é tudo e nada é nada?.
E Ciro, sempre mais rude, também questionando ?o Lulinha paz e amor?:
– O Lula perdeu autoridade moral.
De seu canto, na Globo, ?Lulinha? só repetia:
– Estou na fase paz e amor, é verdade. Ou seja, eu não estou disposto a baixar o nível da campanha.
Evitou responder (?não falo de meus amigos da oposição?) e se descreveu como um oposicionista que está em campanha ?para ser governo?.
Lula é experiente de três eleições presidenciais e não quer perder a quarta reagindo aos ?amigos? que têm um terço de intenções de voto.
Mas talvez seja obrigado a reagir a Serra. O tucano não é especialmente agressivo, mas já começou a bater, com tempo sem fim.
O bordão é quase o mesmo que Nizan Guanaes usou contra Lula, duas vezes:
– Quem é mais preparado?
Para reforçar a polarização, a imagem de um sinal de interrogação, mais a questão ?Lula ou Serra??, passou a dominar o programa tucano.
E Lula, como Ciro, não reage. Apresenta-se olímpico tanto na propaganda, criticando no máximo o governo FHC, quanto na cobertura.
O conflito entre o tucano e o petista vai se desenhando em torno das promessas de emprego e, em menor grau, da reforma agrária.
No horário eleitoral, Serra se disse ?mais preparado? para gerar milhões de empregos. E Lula mostrou milhões de desempregados de FHC.
Quanto à reforma agrária, Serra cobrou transparência de Lula. E Lula foi ao Nordeste prometer uma reforma ?pacífica?. Paz e amor.
Até Garotinho já começou a tratar Ciro Gomes com uma certa negligência.
Em Minas, na Globo, comentou que o colega de terceiro lugar ?caiu muito e abriu uma brecha grande? para ele, Garotinho, crescer.
Mas Ciro não desiste, embora ultimamente use ?boa parte do tempo?, como notou um repórter da Record, ?para explicar declarações?.
Isso vale para a propaganda e para a cobertura, por exemplo, da sabatina de ontem. Ele já não sabe mais o que fazer para se desculpar com as mulheres."
"Painel do Leitor", copyright Folha de S. Paulo, 11/09/02
12/09/02 – Patrimônio
?A Folha de 10/9, no texto ?Só 10 políticos têm 23,8% do patrimônio declarado? (Eleições 2002, pág. Especial 7), estampa o meu nome como um dos dez políticos com maior patrimônio declarado. Tendo em vista que o qualificativo político tem hoje conotação negativa, informando o público apenas sobre o montante do patrimônio de alguns políticos, esse jornal pode levar à ilação de que esse patrimônio foi obtido na atividade política. Essa conclusão -e provavelmente não apenas em relação ao meu caso- não vale para o patrimônio que venho declarando ao Imposto de Renda, cujas cópias entreguei à Câmara dos Deputados nos oito anos de mandato que exerci e, mais recentemente, quando ofereci meu nome como candidato pelo PT à vice-prefeitura de São Paulo. O meu patrimônio continua o mesmo, construído em mais de 40 anos de trabalho. Não teve alteração desde que me elegi deputado, em 1990, a não ser pelas atualizações permitidas pela legislação que disciplina a matéria. Não tive ganhos financeiros no desempenho dos mandatos que exerci e exerço. É isso o que realmente importa. A transparência pretendida pela Folha com a divulgação dos dados constantes da referida edição somente teria alcance se fosse feita uma comparação entre os dados relativos aos bens no início e no final dos mandatos. Sem isso, fica-se na intriga pequena, sem nenhuma objetividade, e permitem-se conclusões que nada têm a ver com a realidade.? Hélio Bicudo, vice-prefeito de São Paulo (São Paulo, SP)
11/09/02 – Opiniões equivocadas
?Contesto as opiniões equivocadas emitidas por Barbara Gancia (?Tem um Inocêncio no meio do caminho…?, Cotidiano, pág. C2, 6/9), que denigrem a minha imagem, ferem a minha reputação de homem público e agridem a realidade dos fatos. Estou sendo vítima de um bombardeio de acusações inverídicas, mesquinhas e perversas, que atribuem a mim responsabilidade por trabalho servil na fazenda Caraíbas, que me pertencia e foi vendida em junho deste ano. As acusações são mentirosas, porque o ex-ministro Francisco Dornelles e o atual ministro Paulo Jobim testemunham serem improcedentes e manipuladas as informações veiculadas pela revista ?Veja? com base em suposto relatório do Ministério do Trabalho. São mesquinhas porque foram geradas por interesses escusos de um veículo de comunicação que se sente contrariado em suas jogadas de mercado. São perversas e preconceituosas porque chafurdam a honorabilidade de quem possui uma vida limpa e porque usam como pretexto o combate aos fantasmas de um inexistente coronelismo regional. São covardes porque agridem a honradez e sonegam o direito de defesa às suas vítimas. Gostaria de lembrar que essas acusações ocorrem, não por coincidência, no curso do processo de sucessão presidencial, algum tempo depois de ter eu anunciado apoio à candidatura de Ciro Gomes e também em meio a cogitações em torno do meu nome para ocupar novamente a presidência da Câmara. Não existe trabalho escravo na fazenda Caraíbas. O que existe na região é uma pobreza secular, que não poderá ser redimida pelo voluntarismo de fazendeiros nem pelo acirramento de hostilidades entre patrões e empregados. A contratação dos trabalhadores na fazenda era terceirizada, e a responsabilidade por eventuais irregularidades cabia aos contratantes. Após fiscalização do Ministério do Trabalho, os empreiteiros atenderam às exigências e foram pagas indenizações reclamadas. Trabalhadores às vezes são contratados para tarefas temporárias, e muitos deles não possuem carteira de trabalho nem outros documentos, o que dificulta o cumprimento das normas trabalhistas. Nessas condições de pobreza, também ocorre de pessoas inescrupulosas utilizarem trabalhadores como massa de manobra para atiçar conflitos na Justiça. O conceito de trabalho servil é incompatível com o mínimo de consciência sobre a dignidade humana. Somente uma pessoa de formação medieval poderia conceber a exploração do trabalho escravo numa sociedade moderna e aberta aos controles do Estado democrático de Direito. A acusação de explorar trabalho escravo constitui uma afronta aos valores que represento como cidadão, político, cristão e pai de família. Nascido de uma família humilde do sertão de Serra Talhada (PE) e formado em medicina, ascendi na vida com o fruto do meu trabalho. Atribuir-me a pecha de explorar o trabalho escravo constitui uma leviandade inconcebível. Inocêncio Oliveira, deputado federal -PFL-PE (Recife, PE)"