CASCAS DE BANANA
Alberto Dines
O Globo, sexta, 13/12, manchete de oito colunas, duas linhas: "Lula põe banqueiro do PSDB no BC e mercado ainda desconfia".
Folha de S.Paulo, mesmo dia, manchete de oito colunas: "Lula põe ex-banqueiro tucano no BC".
O Globo, sábado, 14/12, manchete de oito colunas, duas linhas: "Lula leva para seu ministério dois empresários que apoiaram Serra"
Dos três jornalões de referência nacional, Folha e O Globo excitaram-se mais com as novas indicações do presidente Lula. Exageram na "análise" e forçaram conclusões. Curiosamente, O Estado de S.Paulo, único a assumir apoio ostensivo ao candidato Serra, não participou do show.
Este tipo de excitação pode ser explicada com algumas palavras-chave:
** Malícia com relação às promessas de mudança do candidato Lula;
** Provocação aos setores mais radicais do PT;
** Fazer barulho na entressafra da transição;
** Novo tipo de jornalismo analítico;
** Combinação das anteriores.
Não há nenhuma inverdade nessas manchetes: Henrique Meirelles foi efetivamente eleito deputado na legenda do PSDB; Luiz Fernando Furlan e Roberto Rodrigues efetivamente deram apoio ao candidato Serra, mas os atentos guardiões da veracidade esqueceram que o novo chanceler Celso Amorim ? como o faria qualquer funcionário público de carreira ? também serviu ao governo anterior em postos importantes (entre os quais a representação do Brasil nas Nações Unidas).
E se o nome do jogo é "interpretação", conviria lembrar que Antonio Palocci foi o primeiro prefeito do PT a aderir à idéia da privatização e José Dirceu, um dos esteios do processo de modernização do PT que permitiu a vitória de Lula em outubro passado.
E daí?
Se todos concordam que esta transição é um avanço em matéria de entendimento e democracia, por que aferrar-se aos modelo predatório que sempre caracterizou as trocas de governo?
FHC chamou Francisco Weffort (figura conhecida do PT) para chefiar a área da Cultura e o manteve no cargo ao longo dos dois mandatos. Ninguém estrilou, ninguém maliciou, ninguém provocou. Normal, faz parte do jogo político.
Se José Serra fosse eleito, poderia convocar o sanitarista Eduardo Jorge do PT para o Ministério da Saúde e ninguém estranharia ? seria aplaudido de pé.
Quando o empresário Eugênio "Gradiente" Staub declarou ser tucano de carteirinha mas que votaria em Lula houve debates sobre o teor das suas declarações. Mas quando seu nome apareceu como ministeriável não houve jogadas para desqualificá-lo como ex-tucano.
O processo político é dinâmico, transcende ao "gremialismo" sobretudo quando se trata de partidos com algumas afinidades.
Estranha foi a naturalidade com que a mídia recebeu o apoio a Lula de Antonio Carlos Magalhães e José Sarney ? dois notórios reacionários.
O "neo-interpretativismo" de alguns jornalões em suas manchetes tem algo de caipira e muito de ardiloso. Expressado com tamanho destaque no início do processo de substituições é, no mínimo, precipitado. Tem um quê de provocação.
Dá idéia do que virá depois.