Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Novas trilhas na Galáxia Gutenberg

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ARMAZÉM LITERÁRIO

Autores, idéias e tudo o que cabe num livro

LIVROS & INTERNET

Deonísio da Silva

O sociólogo canadense Marshall McLuhan, falecido em 1980, profetizou que a era do livro havia terminado. Para anunciar ao mundo que o livro tinha chegado ao fim, escreveu o livro A Galáxia de Gutenberg, publicado em 1962, onde revela seu encantamento com a nova era, a da comunicação audiovisual. Por piedosos que sejamos com o pesquisador, não podemos deixar de concluir que ele precisou de um livro para defender o fim do livro e isso já seria suficiente para negar sua tese.

Entretanto, sua ousadia levou-o a arriscar idéias novas sobre o novo mundo que nascia das conquistas tecnológicas e como elas alterariam a palavra escrita dali por diante. É uma pena que esse livro, à semelhança de outras obras fundamentais, seja de difícil acesso nos catálogos de nossas editoras, que de resto, com as exceções de praxe, parecem mais casas de moda, preocupadas em publicar apenas as coisas mais recentes, o dernier cri.

Ao contrário do que previam suas teses, as novas tecnologias audiovisuais vêm proporcionando um renascimento permanente do livro e inegáveis reforços à palavra escrita. A internet é hoje o grande exemplo desses novos caminhos abertos na Galáxia Gutenberg, constituindo-se também em sua vanguarda, ao romper regiões inóspitas ao livro e à imprensa.

Exemplo gratuito: é possível viver sem computador e sem e-mail na Galáxia Gutenberg, mas a vida fica muito mais complicada sem esses dois recursos do que com eles. É fácil para um schollar criticar num paper suposto desperdício de verbas com computadores em escolas e residências, mas, acoplados a uma linha telefônica ou a um cabo de televisão, eles nos permitem convivências extraordinárias com uma pluralidade de culturas e acesso instantâneo a jornais, revistas, periódicos e livros.

Renascimento do livro

A internet nos leva ao livro e à palavra escrita por ínvios caminhos. Não apenas à leitura dos livros e textos, mas a sendas que se bifurcam e sugerem novas formas de aquisição. O leitor já não depende exclusivamente das livrarias, ainda raríssimas entre nós. A internet abriu-lhe novo caminho: a conexão com editoras e livrarias. Elas podem fazer chegar o livro às mãos do leitor em poucos dias. Sim, sim, ainda dependemos muito do poder aquisitivo, claro, mas fiquemos no óbvio: antes, agora ou depois, o livro foi, é e será um produto elitista. Em alguns países, bem menos elitista do que entre nós, claro. Mas a internet é força inegável na democratização da leitura. Quem queria ler e não podia ? ou porque revistas, jornais e livros demoravam a chegar ou não chegavam aonde os leitores estavam ? agora pode.

A autoridade que hoje põe um computador e uma linha telefônica numa escola, proporciona a professores, a alunos e à comunidade que a freqüenta o acesso e a partilha de jornais, revistas e visitas a livrarias. Tal modernidade é de importância decisiva na democratização do saber. Não substitui a biblioteca, não dispensa o livro, antes estimula a busca por livros e leituras.

É quase uma irresponsabilidade tratar de assunto tão complexo num simples artigo, mas o signatário quer fazer sua parte de abelha, com mel e ferrão, na boa metáfora do Talmud, para que internautas possam refletir sobre novas formas de cooperação entre a palavra escrita nas telinhas e aquelas outras, escondidas de outros modos, em outros nichos. Considerando a população mundial, nós, habitantes pioneiros da internet, ainda somos todos clandestinos, mas cada vez menos clandestinos. E é indispensável a parceria entre a tela audiovisual e o documento.

Em resumo, McLuhan tinha razão, mas por outros caminhos. Ao pregar o fim do livro, ele nos abriu os olhos para seu renascimento. O Brasil é um caso muito especial neste particular: somos o segundo mercado editorial das Américas, tendo ultrapassado o México e o Canadá. Ainda não foi examinada em profundidade a contribuição da internet para este notável avanço, mas há claros sinais de que o audiovisual, na rede e fora dela, vem dando novos impulsos ao livro, à palavra escrita.

(*) Escritor e professor da Universidade Federal de São Carlos, colaborador regular desta página, das revistas Caras, Época e do sítio <www.eptv.com.br>. Seu livro mais recente é o romance Os Guerreiros do Campo (Siciliano/Mandarim)

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