Mst vs. folha
Luiz Antonio Magalhães
Em novembro do ano passado, o diretor da sucursal de Brasília
da Folha de S.Paulo, Josias de Souza, envolveu-se em
uma polêmica com o Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) e com a Comissão Pastoral da Terra.
As duas entidades acusaram o jornalista de ter escondido do
público as condições em que realizou reportagem
na qual denunciou a existência de um "pedágio"
cobrado pelo MST junto aos assentados. Na época, os sem-terra
apresentaram documentos provando que o diretor da Folha
teve a viagem aos assentamentos do MST no Paraná e as
despesas com hotéis custeadas pelo Incra, órgão
público em permanente litígio com o movimento.
O jornalista reconheceu o fato, mas alegou que a Folha
tentou sem sucesso pagar o valor das despesas. A ombudsman do
jornal escreveu sobre o episódio, condenando a falta
de transparência da Folha, que, segundo ela, deveria
ter informado os leitores sobre as condições em
que a matéria havia sido apurada. Desde então,
é possível notar que o jornal tem sido mais cuidadoso
com esse tipo de ocorrência, informando quando as reportagens
sobre o MST resultam de convites ou de viagens pagas por terceiros.
Quase três meses depois da primeira polêmica, Josias
de Souza está envolvido em novo embate com os sem-terra.
Desta vez, os sem-terra têm ainda mais razão para
reclamar. O jornalista da Folha publicou na edição
de domingo, dia 4/2, alentada reportagem que levou o título
"Mais um facho de luz nos porões do M$T". O
texto contém 22 denúncias de supostas falcatruas
envolvendo as cooperativas dos sem-terra, que negam todas as
acusações.
Sem entrar no mérito da questão, é possível
dar razão aos sem-terra em pelo menos um ponto: ao utilizar
um recurso gráfico irônico (na reportagem, o MST
é sempre tratado por M$T),
o jornalista passou dos limites. Certamente não é
ofendendo os acusados que as acusações ganham
força. O cifrão no lugar do S induz um pré-julgamento
e é em si um desrespeito não só ao movimento
mas sobretudo aos leitores da Folha, que têm discernimento
tirarem suas próprias conclusões a partir do que
lêem.
No fundo, o diretor da Folha quis fazer graça
e se deu mal: o cifrão não acrescenta coisa alguma
ao texto, mas subtrai o que os jornalistas mais deveriam prezar:
a credibilidade.
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