LIPOESCULTURA
Geneva Overholser (*)
No primeiro semestre de 1999, uma campanha da Associação Nacional dos Jornais anunciava aos quatro ventos uma redução de 2,54 centímetros (uma polegada) na largura dos jornalões brasileiros, como forma de torná-los mais modernos, leves e adequados a leitores e anunciantes. À época, este Observatório tratou do assunto e mostrou que a lipoaspiração então promovida influia, sim, no conteúdo dos veículos [veja as remissões abaixo].
No artigo abaixo, escrito por Geneva Overholser para o Writers Group do Washington Post, publicado em 13/2/01 e do qual reproduzimos os principais trechos, a tese então defendida pelo OI ganha uma confirmação. Lá como cá, só se pensou nos custos e não no conteúdo.
Cerca de 200 jornais americanos cortaram, em média, uma polegada da largura [2,54 cm] de suas páginas nos últimos anos. Do Washington Post ao Los Angeles Times passando pelo USA Today todos fizeram a conversão de tamanho, economizando em torno de 8% nos custos de impressão. O Boston Globe espera poupar 4 milhões de dólares este ano.
Cada jornal, ao fazer a mudança, percebe que os leitores aprovam a página menor e "mais conveniente", que dá um "look mais moderno". Mas muitos jornais não dizem que o conteúdo total está encolhendo junto com a página.
Alguns jornais aumentam o número de páginas, consertando parte da perda. E outros reduzem o tamanho da fonte, o que pode incomodar os leitores. Geralmente, no entanto, o mais provável é que você acabe recebendo menos notícias. "Uma bênção encoberta", foi como o editor-chefe do Philadelphia Daily News descreveu a mudança, realizada na semana passada.
Preço volátil do papel de imprensa é uma razão para que a indústria do jornal seja tão cíclica. Outra é o faturamento publicitário, que também tem seus sobes-e-desces. No momento estão descendo – ao mesmo tempo em que o preço do papel sobe –, e assim jornais atravessam um de seus recorrentes terrores.
Mais do que papel de imprensa será cortado. A Hollinger International demitiu cerca de 60 funcionários da região de Chicago no mês passado, em razão dos preços altos do papel. O Akron Beacon Journal de 2 de fevereiro anunciou planos de mandar embora "um número indeterminado de empregados, incluindo até 10 da redação". Em cobertura admiravelmente franca, uma reportagem conta que o publisher John Dotson garantiu que o jornal "permanece saudável e lucrativo, mas demissões eram necessárias para atingir objetivos financeiros implantados pela Knight Ridder em San Jose, Califórnia". Ele se recusou a divulgar qual margem de lucro o jornal mantém ou qual espera atingir.
Provavelmente é um lucro com o qual a maioria dos varejistas só pode sonhar, pois a maior parte dos jornais vai muito bem. O problema é se você for fisgado por esses lucros. A maioria das companhias faz o que for necessário para mantê-los, estejam em períodos negociáveis ou não. Quando originais, as reportagens investigativas são caras, requerendo repórteres experientes e bem treinados, além de tempo e espaço para o trabalho. Substitua esse tipo de jornalismo por séries de pílulas sobre crimes, ou "reportagens" baseadas em releases de funcionários públicos e as notícias sairão bem mais baratas.
Administrando custos
Considere o Asbury Park Press, segundo maior diário de Nova Jersey, comprado pela Gannett em 1997. A equipe de reportagem diminuiu de 240 para 180 funcionários em tempo integral, de acordo com a revista New Jersey Monthly. A cobertura do governo municipal e da Assembléia Legislativa foi cortada. Assim como o tamanho das reportagens e o espaço total para notícias.
Essa "redução de madeira morta", essa "administração para melhorar custos", jaz nas veias da indústria noticiosa como um vírus. Quando os problemas aparecem – como hoje, com a retirada de anúncios de pontocoms e grandes varejistas como Montgomery Ward morrendo – o vírus se fortalece. E não se vêem apenas cortes, mas também "inovações".
Um memorando recentemente enviado pelo editor-sênior do Arizona Republic para a editoria que cobre os subúrbios indicou diversas "possibilidades de rendimentos": um rodapé de anúncios na primeira página de cada seção, "noivos contando suas histórias românticas e para isso pagando uma taxa", casamentos, aniversários e nascimentos que passem de gratuitos a pagos (óbitos já o são), e aviso aos anunciantes de quando diversas colunas serão publicadas para que se possa comprar anúncios com conteúdo complementar.
Esse memorando veio no calcanhar dos anúncios de primeira página do Republic. Tudo isso por um jornal que, de acordo com o semanário alternativo Phoenix New Times, já tinha margem de lucro de 32% quando a Gannett o comprou no ano passado. Pelo menos com anúncios na primeira página, leitores saberão exatamente o que estão comprando. Mesmo quando repórteres experientes se deixam levar por matérias mal pagas, treina-se cortando ou reduzindo o espaço do jornal – e a maioria dos veículos não lhe conta isso.
O que está em perigo hoje em dia é o compromisso dos jornais com as necessidades dos cidadãos por um regime de informações substanciais e o desconhecimento sustentado de negócios públicos. Quando Donald Graham, diretor de redação do Washington Post, foi a Wall Street, fez algo incomum. Conversou sobre jornalismo. "Nosso jornalismo – o que, eu sei, não é o foco de seus interesses, mas é o foco dos meus – está melhor que nunca", disse a analistas, em dezembro.
Graham acha que "construir o valor de nosso negócio" o pagará a longo prazo. Muitas companhias jornalísticas, em vez disso, administram com olhos nos custos, à sua maneira, ao sabor dos ciclos. Eles podem estar administrando os custos e cortando fora o que você deveria saber – sem mencionar o próprio fato de estar administrando custos, em vez de jornais.
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