MÍDIA & POESIA
Gustavo Lucas de Oliveira (*)
Jornais diários e revistas semanais vêm desvalorizando a literatura e, mais especificamente, a arte poética desde a década de oitenta, trocadas pelas embalagens de mercado. Há uma dissociação drástica entre jornalismo e literatura. Uma barreira inexistente, já que um se faz pelo outro e vice-versa. Um bom texto jornalístico sempre contém elementos “literários”. A palavra, em seu sentido estrito, por si só já significa e comunica, como dissociar? Sendo assim, por que o ocaso da poesia nos jornais?
O jornalismo contemporâneo criou os cadernos B de arte e cultura que, hoje, são um guia de eventos e cinema. Quantas críticas de livros ou teatro falam de arte propriamente? São mais coberturas de eventos, como lançamento de livro de autor famoso e “mais um novo espetáculo do Falabella”. Onde está o espaço para a cultura afinal, a arte feita na periferia, a arte marginal dos artistas negros? Temos exemplos isolados, como o afro-reggae no Rio e a timbalada na Bahia. Onde estão os poetas? Com suas indagações sobre a vida e a morte, suas rimas e desrimas, seu contentamento de viver sentindo tudo ao redor, sempre sorrindo, provocando e acreditando na vida?
Celebração da beleza
A poesia, segundo o filósofo Heidegger, está na origem e na essência da linguagem. Para ele, arte é a experiência da verdade. Então, a obra de arte tem o “poder”, ou a capacidade, de transformar todo aquele que a experimenta. Não poderia ser diferente com a poesia, que contém em sua natureza estética a origem do pensamento e a dignificação da verdade sentida dum mundo em desajuste.
Leonardo da Vinci, em seu Tratado, explica que o artista deve entender para além da situação humana, que deve intuir e pensar os aspectos mais íntimos da natureza. Que jornal, hoje, se preocupa em entender algo além? Em refletir sobre sua atividade, seus prós e contras? Quem está preocupado com a alma e a sensibilidade? Machado de Assis, em 1? de setembro de 1879, escreveu: “Pobre espírito! Quem pensa em ti nessa dança macabra das coisas sólidas.”
Deveríamos exercer um jornalismo assim como Machado sonhou. Uma República do Pensamento, onde todas as idéias, ideais, pontos de vista e moral possam ser discutidos livremente. Onde a poesia (além) tenha espaço e celebre a beleza e a sensibilidade humanas.
(*) Poeta e jornalista em Brasília