Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O Estado de S. Paulo / Los Angeles Times

SARS NA MÍDIA

“Para Nobel, cobertura da mídia ocidental incentiva histeria”, copyright O Estado de S. Paulo / Los Angeles Times, 1/05/03

“Notícias sobre medicina são parecidas com remédios: seu excesso pode ser tão perigosas quanto quantidades insuficientes. O argumento, persuasivo, é do virologista David Baltimore, vencedor do Prêmio Nobel em 1975, que ganhou espaço esta semana em jornais por criticar o tratamento dado pela mídia americana à Sars. ?Da mesma forma que a mídia nos deu uma nova visão da guerra, muito mais próxima, estamos agora experimentando uma nova situação com a Sars, na qual a preocupação pessoal resultante da cobertura da mídia supera o risco à saúde pública do próprio vírus?, escreveu, num artigo publicado pelo Wall Street Journal.

Baltimore, atualmente presidente do California Institute of Technology, é considerado um dos mais importantes biólogos da sua geração. O cientista foi irônico ao comentar os efeitos do noticiário da Sars nos Estados Unidos, como a queda na freqüência a restaurantes chineses. ?A probabilidade de você morrer de Sars é remota comparada à de morrer no carro a caminho de um restaurante chinês. Mas os vírus da mídia são imunes à racionalidade.?

Para Baltimore, o noticiário sobre o antraz em 2001 serviu de prévia da atual situação. ?Com o envolvimento de Tom Brokaw (âncora de um noticiário de TV) e do Senado, não demorou muito para que mães zelosas comprassem máscaras para suas despensas. O fato de que cinco pessoas morreram em todo o episódio do antraz – quando todo ano acidentes em estradas matam 40 mil americanos e doenças relacionadas ao tabaco causam 400 mil mortes – não bastou para amenizar o pânico.?”

 

CUBA NA MÍDIA

“Cuba está de volta às primeiras páginas”, copyright Copyright Tribuna Livre – ABI (www.abi.org.br/cgi-local/publicacao/index.pl), 28/04/03

“Mais uma vez, Cuba está na ordem do dia ocupando as primeiras páginas dos jornais. Os mais velhos com boa memória lembrarão que o atual momento de alguma forma remete aos primeiros anos da Revolução cubana, quando o país caribenho sofria intensas campanhas orquestradas pelos Estados Unidos, persistentes ao longo do tempo, que nunca se conformaram em ter como vizinho um país que não se submete aos seus interesses. A ascensão do presidente George W. Bush à Casa Branca, e conseqüentemente, o predomínio de setores conservadores e de extrema-direita deixou ouriçados os grupos da comunidade cubana de Miami. Com a ?vitória? militar norte-americana no Iraque, a euforia tomou conta da Flórida, chegando o governador, Jeb Bush, o irmão, a falar em alto e bom som que ?agora está chegando à vez de Cuba?. E isso, na mesma Flórida, onde George conseguiu ?ganhar? a eleição, no tapetão, naturalmente, fabricam-se notícias das mais variadas matizes e com o visível objetivo de preparar a opinião pública, leia-se corações e mentes, para a ?nova realidade?. Diplomatas dos EUA em vários países repetiram as ameaças. Não chega a ser nenhuma surpresa a ?idéia sinistra?, como assinalou recentemente o presidente Fidel Castro, fomentada pelos grupos anticastristas em Miami de provocar um conflito armado entre Cuba e Estados Unidos.

É neste contexto que na ilha caribenha ocorreram fatos que levaram a mídia tradicional a retornar as suas baterias contra o regime de lá, colocando o país na primeiras páginas. Dois episódios ganharam destaque: a prisão e condenação de 75 pessoas a penas entre seis e 28 anos e a execução, em julgamento sumário, de três seqüestradores de um barco que colocaram em risco a vida de dezenas de pessoas.

Os 75 foram acusados de conspirar contra o Estado cubano em conluio com um país estrangeiro, o que fere a lei de Proteção da Independência Nacional e a Economia, um dos instrumentos de defesa da nação. Ou seja, passaram por cima das regras do jogo. Ao contrário do que foi divulgado pelas agências de notícias, só quatro dos condenados eram jornalistas, como ficou comprovado no julgamento. Todos tiveram a mais ampla defesa sendo o juízo publico e acompanhado 3.600 pessoas, segundo a imprensa cubana.

Os fatos não acontecem por acaso ou assim de repente não mais do que de repente. Os Estados Unidos mantêm um escritório de representação em Havana (Seção de Interesses dos Estados Unidos – Sina) , que cuida de questões burocráticas entre os dois países, como a concessão de vistos e eventuais ações conjuntas, como o combate ao narcotráfico etc. Este escritório passou a funcionar graças a um acordo ainda na época do governo Jimmy Carter, no final da década de 70, tendo sido reativado no período Bill Clinton. Pois bem, em outubro de 2002 o atual representante dos EUA em Havana, mister James Cason, que tem o status diplomático, declarou, sem a mínima cerimônia, que faria o possível para unificar os grupos contra-revolucionários cubanos e confirmou que se encontrava com freqüência com os chefes da Fundação Cubano-Americana de Miami, o agrupamento mais extremista do exílio. Cason tinha contato estreito com os 75 condenados, tendo alguns deles recebido passe livre para entrar a qualquer hora no Escritório de Representação. O Estado cubano, segundo a imprensa da ilha, infiltrou entre os protegidos de Cason agentes para investigarem o que estava ocorrendo. Chegaram a conclusão de que conspiravam abertamente contra o regime. Alguns foram pegos em flagrante com milhares de dólares nos bolsos e não puderam comprovar de que forma conseguiram.

Depois de aplicada a legislação, a grita no mundo foi ampla, geral e irrestrita. Governos e personalidades dos mais amplos setores, inclusive de esquerda, condenaram o governo cubano, considerando as penas ?excessivas?. Dois escritores do primeiro time da literatura mundial e engajados na esquerda, o português José Saramago e o uruguaio Eduardo Galeano, foram duros em seus posicionamentos. Saramago foi mais longe ainda, considerando-se rompido com a Revolução cubana, o que é um direito que o assiste.

Galeano, o genial autor do clássico Veias Abertas na América Latina, um amigo de primeira hora da Revolução cubana, posicionou-se a favor do pluripartidarismo nos países e, com base na figura histórica de Rosa de Luxemburgo, defendeu a democracia.

Mesmo respeitando-se as opiniões, vale assinalar que nem sempre os genais são infalíveis em seus julgamentos. No caso de Galeano, é necessário tentar analisar mais a fundo a questão do plupartidarismo, não colocar esse instrumento mecanicamente para as mais diversas realidades. Falar em pluripartidarismo no Uruguai de Galeano, no Brasil, na Argentina, para ficarmos em exemplos de países mais próximos, é uma coisa, faz parte da tradição cultural e política. Não é, entretanto, o mesmo em Cuba. Da mesma forma que se defender um partido único por aqui e na vizinhança seria algo totalmente fora de propósito.

Antes da Revolução, no tempo em que Cuba era considerada o prostíbulo do Caribe, havia pluripartidarismo, só que a maioria dos partidos existentes ou eram legendas de aluguel ou vinculados aos Estados Unidos, não representando os reais interesses do povo, muito pelo contrário. Historicamente, a tradição de luta em Cuba, remete não ao pluripartidarismo. O Partido Revolucionário Cubano da época das lutas de independência, que tem como expoente a figura de José Marti, é a prova concreta nesse sentido. Os cubanos que queriam se livrar do colonialismo espanhol se aglutinaram em torno do ideário de Marti, em um partido único. Depois, a entrada em cena dos Estados Unidos, que intervieram na área, evitou assim uma verdadeira independência, que para os cubanos só aconteceu com a vitória da Revolução em 1 de janeiro de 1959. História é história. Pode ser que cada um tenha a sua interpretação e a sua própria história, mas não se pode fugir dos fatos. E eles estão aí mesmo a demonstrar que pluripartidarismo em Cuba é igual à submissão aos interesses da potência hoje dirigida por George W. Bush e sua entourage petrolífera e armamentista.

A discussão, esta sim, pode remeter a questões de estrutura de um partido único, que não impeça críticas e questionamentos e que não leve ao burocratismo imobilista . Em outros termos, a democracia no socialismo. Esta matéria, claro, não passa por Miami, onde gente como o cubano-americano Otto Reich, personagem da pior qualidade, amigão de Bush, conspirador de sete costados e protetor de terroristas anticubanos (haja vista Orlando Bosch e Posadas Carriles, responsáveis pelo atentado, em 1976, contra um avião comercial da Cubana de Aviação, nos céus da Venezuela, que resultou na morte de dezenas de jovens atletas cubanos que voltavam de uma competição desportiva em Barbados, e que receberam a proteção de Reich) quer a todo custo restabelecer o status dos tempos de Cuba prostíbulo do Caribe com muito pluripartidarismo em cima.

Coincidência ou não, muitos veículos de comunicação, principalmente os ligados (ou os que pretendem fazê-lo), ao magnata do setor, o bushista Rudolph Murdoch, aproveitaram o embalo para tirar um pouco de foco o questionamento do Iraque pós-Saddam, para conceder o maior espaço possível à turma de Miami. Aí é outro papo, que fica para depois…

Ah, sim: sobre a pena de morte. O autor destas linhas é contrário por princípios, pois entende que o instrumento, em todos os níveis, é ineficaz e achar também que nenhum ser humano pode ter poderes de tirar a vida de um outro. A tradição jurídica brasileira inclusive não é a da pena de morte, ao contrário do que acontece nos Estados Unidos e em Cuba. Nos Estados Unidos, por exemplo, a maioria dos condenados a morte é de negros e pobres. Os Bush, seja Jeb ou George, nunca tiveram piedade no sentido de dar clemência a condenados. Com eles sempre foi na base do ?executa-se?.”

“?Cuba é a maior prisão de jornalistas do mundo?, acusa novo manifesto”, copyright Folha de S. Paulo, 3/05/03

“Um grupo de intelectuais franceses e cubanos radicados na França publicou ontem um manifesto no jornal ?Le Monde?, no qual acusa Cuba de ter se convertido ?na maior prisão do mundo para jornalistas?.

?Enquanto todo mundo tinha os olhos postos no Iraque, Fidel Castro aproveitou para lançar uma onda de repressão sem precedentes?, diz a carta, mais uma de uma série divulgada nos últimos dias em resposta à onda repressiva contra os dissidentes políticos promovida pelo regime do ditador Fidel Castro.

Em abril, cerca de 75 opositores foram condenados a penas altas de prisão por supostamente ?conspirar contra Cuba com os EUA?, e três acusados de sequestrar um barco para fugir aos EUA foram executados, pouco mais de uma semana após sua prisão.

A carta de ontem é assinada pelos cineastas Jean-Jacques Beinex e Romain Goupil, pelos escritores Pascal Brukner, Marek Halter e Yves Simon e pelo filósofo Andre Glucksmann, além dos escritores cubanos Eduardo Manet e Zoe Valdés.

O escritor peruano Mario Vargas Llosa acusou ontem o colombiano Gabriel García Márquez de ser ?um cortesão? do regime de Fidel e de ?se acomodar diante dos abusos e atropelos contra os direitos humanos em Cuba?. García Márquez, Nobel de Literatura de 1982, foi um dos 165 signatários de outro manifesto, lido anteontem em praça pública em Havana, denunciando uma ?perseguição a Cuba? visando criar ?um pretexto para uma invasão?.”