MÍDIA NA COPA
Berto Oliveira (*)
Na final da Copa do Mundo não teve para ninguém. O Brasil ganhou da Alemanha de dois a zero, mas quem venceu de goleada foi a Rede Globo. Na prática, 100% de audiência. Tecnicamente o Ibope vai dizer que não, é claro. Por certo, o número de aparelhos desligados deve ter superado o de não-sintonizados no jogo. Talvez nem os camaradas que colocam as fitas de vídeo e apertam os botões lá nos outros canais deviam estar vendo o que estava passando na sua própria telinha. Enquanto a Globo chutava cachorro morto transmitindo o jogo ao vivo, as outras emissoras de TV aberta dividiam os traços da audiência exibindo coisinhas bem low profile, tão comuns numa enfadonha manhã domingueira: um culto evangélico aqui. um programinha sertanejo ali, um desenho animado acolá, uma televenda de cinto de emagrecimento mais adiante. Usando um termo bem futebolístico, diríamos que só para cumprir a tabela, ou melhor, a grade.
A Globo arrebentar com a audiência nessa Copa não surpreendeu ninguém. Estava mais do que óbvio que isso aconteceria. Assim como havia espantado a ninguém o fato de ela ter comprado a peso de ouro a exclusividade de transmissão dos jogos e oferecido, por valor também aurífero, as mesmas imagens a suas co-irmãs. Just business! Tio Patinhas das TVs brasileiras, a emissora jogou pesado para fazer do seu narrador oficial um animador de estúdio via satélite, uma espécie de novo guerreiro do Oriente. Afinal, querer ganhar sempre faz parte de sua natureza.
Deu certo. Chacrinha evoluiu. Agora não se veste como palhaço, não joga bacalhau no auditório, não berra pela Terezinha e não toca a buzina no ouvido de ninguém. Ele hoje veste Armani, chama pelo Bial e coloca roupa seca no varal. Embora divididos entre o Oriente e o Brasil, seus novos jurados bem que nos fizeram recordar os de outrora. Dadá Maravilha, indeciso, uma hora queria ser Elke, noutra, Pedro de Lara. Entalado atrás de uma mesa enorme, Sergio Noronha mais parecia uma Araci de Almeida bronzeada pelo sol de Ipanema. Um Zagalo taciturno e com mau humor de fazer inveja nos fez lembrar de José Fernandes como uma flor de simpatia. E Fátima Bernardes, mais do que nunca, foi a versão revista e atualizada da queridíssima Márcia de Windsor. Nota 10 para ela!
Vale até programa eleitoral
Entre chutes, caneladas e pedradas, a procissão da Globo foi passando, amada por gregos e troianos, mas odiada por turcos, ingleses e alemães que, mesmo rezando a missa como manda o figurino, acabaram condenados ao purgatório por mais quatro anos. Apesar da transmissão arrasa-quarteirão, unilateral e com cheiro de A Voz do Brasil, bem na contramão da pluralidade informativa tão benéfica à democratização dos meios de comunicação, não podemos negar a excelente qualidade do trabalho técnico desenvolvido pelos profissionais das Organizações Globo lá na Coréia… Corpão… Jaréia… Japão. Enfim, seja lá onde tenha sido essa Copa absurda de custos astronômicos, horários estapafúrdios e muitas surpresas.
A evolução do time do Felipão e a conquista da taça foram uma surpresa para todos, nós diante do vaticínio cataclísmico das pitonisas e gurus de plantão nas resenhas radiotelevisivas. Consumada a vitória canarinho, só podemos concluir que o nadar contra a maré dos náufragos da crônica esportiva não passou de torcida a favor. Afinal, desde os velhos tempos dos coleguinhas das latinhas, passando pelos amigos do tinteiro, massacrar a Seleção e preparar a opinião pública para o pior virou esporte nacional.
Pura síndrome de 1950 ou, como diria Nelson Rodrigues, mania de cachorro vira-lata. Mas o teletorcedor brasileiro não está nem aí para isso, nem para o número no dial, nem o logotipo da emissora e nem para o ufanismo exacerbado do narrador que transmite o jogo na sua TV. Ele quer mesmo é poder chorar, sorrir, suar, pular, gritar e torcer pelo seu verdadeiro time do coração, a Seleção Brasileira. Com a faixa de pentacampeão no peito e a taça na mão, ele bate palmas até para propaganda eleitoral no intervalo do jogo.
(*) Pedagogo, Rio de Janeiro