Saturday, 21 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O povo não é bobo

MÍDIA & REFORMAS

Chico Bruno (*)

A circulação paga de jornais e revistas não cresce na proporção em que cresce a população brasileira. A audiência de radiojornais e telejornais também não cresce, ao contrário, está diminuindo. As explicações são as mais variadas: vão desde o pequeno poder aquisitivo da grande maioria da massa trabalhadora nacional à falta de hábito da leitura.

Podem até estar certos os que defendem tais posições. Mas, pelo visto, há outros fatores. Entre eles a qualidade editorial da mídia tupiniquim, que anda para lá de sofrível. Às vezes é duro ler, ouvir ou assistir noticiários, tal a superficialidade com que assuntos tão caros ao povo brasileiro são tratados.

Agora mesmo, o governo federal empunha a bandeira das reformas tributária e da previdência como a salvação para todos os males da nação. A tropa de choque governista usa e abusa dos meios de comunicação para enfiar essa tese goela abaixo do povo. Infelizmente, a mídia, que deveria exercer o papel imparcial de apresentar aos seus leitores, ouvintes e telespectadores o quadro real da previdência social e da tributação se omite. É verdade que alguns colunistas se dão a esse trabalho, ou tentam, em seus escassos espaços. No domingo (27/4), por exemplo, o jornalista Fritz Utzeri, no Jornal do Brasil, tentou despir a dura realidade da previdência social e mostrar como realmente funciona a coisa. Ocorre que o alerta de Fritz Uteri está escondidinho, não merece destaque em primeira página.

Argumento simplório

As colocações de Fritz mereciam servir como pauta para as editorias de política e economia, pois dariam excelentes matérias elucidativas sobre a caixa-preta da previdência social brasileira. Mas, com certeza, a imprensa, que passa por mau momento financeiro e vai precisar do governo federal para desfazer esse nó, não se aventura em cutucar a onça com a vara curta. Prefere continuar conivente com a desinformação, que beneficia o governo. Além disso, basta pregar os olhos na lista dos devedores do INSS para se comprovar que a mídia não vai atirar no próprio pé.

Em vista dessas evidências, a imprensa brasileira vai cobrindo mal e porcamente as duas reformas, que mexem fundamentalmente com a vida e o bolso de todos os cidadãos e cidadãs do país. O governo vai fazendo a parte que lhe cabe, ou seja, injetando milhões de reais em campanha publicitária, tida de esclarecimento à opinião pública, nos veículos de comunicação. Infelizmente, a mídia, sempre tão ciosa em ouvir o outro lado, não move uma palha para transmitir aos 67% dos brasileiros que não sabem o que é a previdência social, segundo pesquisa Ibope/CNI, como realmente ela funciona, o que representa e quem são seus verdadeiros algozes.

Quem sabe o tratamento superficial dos assuntos seja um dos motivos pelos quais a circulação paga dos jornais e revistas não cresça e a audiência dos meios eletrônicos diminua proporcionalmente ao crescimento populacional do país.

Culpar o baixo poder aquisitivo e a falta de hábito de leitura dos brasileiros pelos principais males que afligem a mídia é um argumento, no mínimo, simplório. Vale lembrar que de há muito o povo deixou de ser bobo.

(*) Jornalista