Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O Woodstock da comunicação no Brasil

INTERCOM 2001

Antônio Brasil (*)

A grande tribo dos comunicólogos costuma se encontrar anualmente nos congressos da Intercom, a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. E dessa vez a Intercom aconteceu na região do Pantanal, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, na semana passada. Para quem não conhece ou nunca compareceu a um desses congressos, é importante dizer que a Intercom é uma espécie de Woodstock da comunicação brasileira. Um festival de muitas palestras, oficinas, comunicados de pesquisa, exposição de trabalhos experimentais, lançamento de livros, prêmios e, até mesmo, rock? n roll. A principal diferença fica por conta da natureza específica do evento. A Intercom é um encontro de comunicação, a oportunidade de um encontro entre professores, pesquisadores e alunos de comunicação do Brasil inteiro, gente tanto da graduação como da pós, num clima bastante descontraído e informal.

A curiosidade mútua é grande. Todos querem saber o que está rolando em termos de novas idéias, pesquisas comunicacionais ou metodologias de ensino. Além disso, na Intercom pode-se encontrar muitos colegas que trabalham como professores ou pesquisadores em diversas universidades, algumas delas novas e distantes com nomes exóticos como Tuiuiú! Mas apesar da originalidade dos novos nomes, a surpresa maior fica mesmo por conta do bom trabalho que está sendo realizado fora dos grandes centros. Algumas dessas instituições de ensino têm desenvolvido idéias originais, ousadas e interessantes como a Universidade Federal de Santa Catarina e seu Curso de Jornalismo, numa parceria original com a engenharia de produção. Este é um exemplo claro e já bastante conhecido de excelência e pioneirismo do ensino público no Brasil com uma participação regular em eventos como a Intercom.

Apesar das enormes dificuldades como a falta de recursos, greves e descasos federais, a turma de Floripa, mais uma vez, participou em peso, com trabalhos sempre originais, tanto dos professores como dos alunos, com grande utilização das novas tecnologias na formação dos futuros jornalistas além do desenvolvimento de parcerias criativas com empresas do setor privado. Uma reafirmação clara da qualidade e dos desafios do ensino púbico universitário em nosso país. Mas na Intercom pode-se também encontrar os últimos trabalhos de grandes nomes das instituições tradicionais como a USP, PUC, UFRJ e tantas outras.

Para os estudantes é uma excelente oportunidade de não só conhecer e ouvir esses professores-estrelas das grandes escolas, mas também de participar em oficinas práticas de áreas específicas da comunicação como telejornalismo, publicidade ou relações públicas. Adquire-se experiência prática e conhecimento de qualidade em pouco tempo e de forma barata. Nesses encontros, o aluno também tem a chance de lançar um olhar no futuro ao conhecer novas opções profissionais e estabelecer alguns contatos importantes em setores diversos da carreira escolhida.

Cadê o rock?

Outro fator singular da Intercom é a mistura entre as pesquisas de graduação e pós-graduação, o que cria alternativas e situações inusitadas. Alunos que sequer concluíram o curso de comunicação dividem mesas de trabalho com professores renomados e de grande experiência profissional na apresentação e discussão de seus trabalhos. E são essas apresentações seguidas de discussões ou debates, muitas vezes acalorados, nos núcleos de pesquisa, que se constituem na essência desse festival da comunicação.

Na área de jornalismo, questões importantes como
as definições de objetividade, as dificuldades para
a sua prática num mundo pós-moderno de desconstruções,
aliam-se às últimas impressões e críticas
midiáticas sobre o seqüestro na família do Silvio
Santos. Discute-se, igualmente, o comportamento da televisão
neste caso tão polêmico, avalia-se a sua repercussão
na imprensa e na sociedade. Também são apresentados
trabalhos sobre novos monitores éticos para a imprensa ?
e, nesse campo, deve-se destacar o trabalho do professor Rogério
Christofoletti, da Univali, que investiga e indica o nosso Observatório
da Imprensa
como uma das possíveis alternativas à
criação de um Procon da imprensa brasileira. A idéia
é criar ou legitimar um centro de referenciação
do trabalho jornalístico em nosso país para dar mais
acesso e poder ao público leitor e ao profissionais da área.

Além de propostas objetivas, é claro que na Intercom também tem uma grande mistura de longas palestras e relatos de pesquisas sobre os assuntos dos mais diversos. São tantos que exigem um enorme catálogo com uma programação intensa nos dias principais. No evento também são apresentados vários tipos de trabalhos de comunicação em geral, que vão desde as novas formas de se produzir histórias em quadrinhos, a relatos sobre a introdução dos índios do Mato Grosso ao maravilhoso mundo das telenovelas, ou estudos recentíssimos sobre a utilização das novas tecnologias como a internet em diversos setores da comunicação social. Ou seja, tem de tudo, para todos!

Este ano, o tema central era "A mídia impressa, o livro e o desafio das novas tecnologias", com muitas indagações sobre o futuro dos recursos textuais e do meio impresso num mundo cada vez mais digital. Mas o mais importante em eventos como a Intercom 2001 é mesmo continuar acreditando que comunicação inclui e assimila praticamente quase tudo que se produz ou se pensa em ciências humanas e sociais, dentro e fora das universidades. Um universo de opções de pesquisas que não exclui os projetos comuns na área da tecnologia com a aproximação, cada vez mais freqüente, da turma da informática e os jornalistas, por exemplo. Afinal, o caráter interdisciplinar do evento é um dos aspectos mais excitantes da Intercom.

Discute-se de tudo, mas o importante mesmo é medir o interesse cada vez maior pelos estudos de comunicação em nosso país. Mas se a Intercom é o Woodstock da comunicação, e o rock ?n roll, onde fica? Tem presença garantida em estudos de mídia sonora, internet mas também na festa final de confraternização com algumas boas bandas locais, lá mesmo de Campo Grande.

(*) Jornalista, coordenador do Laboratório de TV e Vídeo e professor de telejornalismo da UERJ.

    
    
                     

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