PICADEIRO
Victor Gentilli
Na mesma terça-feira em que o ministro Paulo Renato Souza recebeu os coordenadores de cursos de Jornalismo, o governo anunciava a suspensão temporária dos processos de autorização de novos cursos. O argumento para fundamentar é o de que os processos necessitam de mais transparência e que serão informatizados.
Os jornais do dia seguinte limitaram-se ao jornalismo declaratório, sem nenhum questionamento. O Jornal do Brasil não deu nada. Veja desta semana reincide numa prática bastante incomum na revista: ficar insistindo num mesmo assunto. De um modo geral, Veja, quando trata um assunto, evita continuar tratando em edições seguintes, o que seria ideal para o leitor acompanhar. No caso, parece que a revista optou por alguma campanha.
De todo modo, faltou dizer:
1) que o problema maior está no CNE;
2) que a nova secretaria da SESu, Maria Helena Guimarães de Castro, é a presidente do Inep e que agora acumula o Inep com a SESu;
3) que todo esse processo é coerente com a idéia do MEC de criar a Agência Nacional de Educação (ANE);
4) que o governo há mais de um ano pensou em criar a ANE por medida provisória ou projeto de lei, mas abandonou a idéia por inviável politicamente; a partir de então, todos os movimentos foram na direção de que isto estava sendo feito por meio de decisões administrativas;
5) agora o governo volta a falar na ANE, mas o leitor-cidadão precisa conhecer o contexto;
6) a maneira como os jornais enfatizaram as declarações de Maria Helena Guimarães de Castro, de que a partir de agora os processos de autorização terão maior transparência, dão a entender que faltava transparência no processo.
Esta última informação é verdadeira e falsa. Tanto a porção verdadeira como a falsa exigiriam que os dirigentes da SESu fossem procurados, que fossem mostrados como funcionavam até agora e que a falta de transparência não significava necessariamente nenhuma irregularidade.
Mas para o jornalismo de espetáculo e de denúncias, ficar explicando detalhes é bobagem. Melhor fazer como a Veja e dizer que a farra acabou tarde. E os leitores ficaram sem saber como é que a farra funcionou ou deixou de funcionar.
Os números de escolas abertas nos últimos anos certamente impressiona. Mas se os jornalistas se preocupassem em saber quantos pedidos foram negados, os leitores teriam uma visão melhor do processo como um todo.
Se os jornais mostrassem como funcionam os processos de autorização, veriam como funcionam os constrangimentos a que são submetidos escolas e avaliadores do MEC sérios. Bastava dizer que o avaliador é transportado, alimentado, hospedado e remunerado pelo avaliado. Mas para isso seria necessário apuração. Existem casos, casos e casos para serem contados.
Como continua necessária a apuração para ver o que vai mudar. Se os jornalistas aceitarem de barato que informatização é sinônimo de transparência, todos vão sair perdendo. Inclusive o MEC, que, se montar efetivamente um processo transparente nas autorizações de cursos, precisa mostrar à sociedade como este funcionará.