Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os gigolôs da cultura

TRATOS À LÍNGUA

Franklin Jorge (*)

Gerenciada por tarefeiros sem distinção intelectual, a cultura oficial vigente ignora soberbamente que há novos modos de ver e pensar, muito mais ricos e instigantes do que esse feijão-com-arroz servido pelas instituições, sob sucessivos governos que têm em comum a incapacidade de compreender o fenômeno cultural em toda sua grandeza.

Hoje, nossa cultura é predada por apadrinhados ávidos que a restringe em vez de ampliá-la; uma gente, enfim, sem compromisso e que só pensa em locupletar-se das benesses e lantejoulas proporcionadas pelo poder.

É suficiente observá-los como se vestem e se comportam, no trato com a cultura e os produtores culturais, para sabermos que não são do ramo e que ali estão colocados apenas para embolsarem gordos salários e mordomias a que os artistas, como cidadãos de terceira categoria, jamais terão acesso.

Instituições como guetos

Amadores tacanhos e medíocres, confundem "arte popular" com "manifestações folclóricas" e identificam "popular" com "democrático", além de alimentarem uma ojeriza mórbida à "erudição", erroneamente entendida como "elitismo". E, assim, vão as instituições empurrando a cultura com a barriga e deixando rolar.

O filósofo Olavo de Carvalho, em texto lúcido e pertinente recentemente publicado em Continente Multicultural, observa que, nesse contexto perverso e estéril que insiste em se transformar em norma, cantores pop milionários são vistos como personificações dos "excluídos", enquanto professores esfarrapados e eruditos, sem sapatos, são representantes da elite.

Desfrutadores das tetas vitalícias do Estado, esses gigolôs limitam-se, ao longo da nossa história, a promover atividades primárias e a obsequiar o populismo, pois, evidentemente, lhes falta, além da capacidade de empreender e realizar, repertório cultural e refinamento, duas ferramentas necessárias à consecução de uma política cultural séria, antenada com realidades distintas e interativas.

Resumindo, para não enfastiar o leitor com obviedades, resulta dessa visão caolha uma ação cultural descuidadamente redutiva e alienada a serviço dos interesses desses dirigentes desinformados, mais do que da própria comunidade ? sempre burlada em seu direito ao biscoito fino da cultura.

Vemos assim dirigentes culturais que nunca entraram num museu ou assistiram a um concerto nomeados por conveniência de grupos políticos alheios à essência mesma da cultura e indiferentes à sensibilidade e ao discernimento, coisas que não se podem ensinar e que não se adquirem por decreto nem por osmose.

Arrogantes e manipulativos, como fátuos pseudoesquerdistas, esses gigolôs da cultura transformam as instituições em guetos aos quais somente os artistas, como vocacionados obsessivos, podem sobreviver, pois, como disse Camille Paglia, carreiras longas e produtivas não constituem ocorrências aleatórias. Resultam, como sabemos, não de favores nem de espontaneísmo, mas de trabalho persistente a serviço do talento.

(*) Jornalista