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Arthur Allen
(*) Copyright Salon <www.salon.com>, 14/7/00
Teriam o New York Times e o Washington Post publicado matérias sobre o mesmo artigo do New England Journal of Medicine? A reportagem publicada no Journal no dia 13 de julho revelou que: a) genes são mais importante do que se imagina na causa do câncer; ou b) genes são menos importantes do que se imagina na causa do câncer? Resposta correta: c) mais importante se você ler o New York Times, menos importante se você ler o Washington Post.
De acordo com o lide do Post, "a grande maioria dos cânceres não é causada por defeitos inerentes aos genes das pessoas, como muitos crêem nesta era da genética, mas por fatores ambientais e comportamentais". O Times cobriu o estudo a partir de material da Associated Press e afirma que "genes podem causar mais de 1/4 dos três principais tipos de câncer, mais que o previsto anteriormente, diz um grupo de pesquisadores."
A razão para a confusão é simples. O artigo do Journal, baseado em vasto estudo sobre gêmeos, afirmou, essencialmente, o que já se sabe: genes e ambiente têm suas funções no câncer, assim como em qualquer outra manifestação humana.
Baseado no incrível número de gêmeos analisados ? 44.788 pares escandinavos ?, o artigo não apresenta revelações mais surpreendentes. Mais que tudo, atenta para o fato de que estudos com gêmeos devem ser melhor aproveitados.
Apesar de terem examinado um total de 10.803 pessoas com câncer, só houve dados estatisticamente relevantes em quatro tipos da doença: câncer de mama, pulmão, próstata e colorretal. Ainda assim, os autores reconheceram margem de erro superior a 50%. O estudo também omite dados de tipos específicos de exposições ambientais que podem ter contribuido para os cânceres.
"O estudo tem muitos dados sólidos, mas suas fraquezas ilustram as dificuldades de usar dados de gêmeos em estudos do câncer", escreveu Robert Hoover, diretor de epidemiologia e bioestatística do Intituto Nacional do Câncer (NCI). "Delinear o ambiente específico e os componentes genéticos que aumentam riscos de câncer é como depender da geração nova e emergente de estudos epidemiológicos sobre moléculas grandes, em lugar de estudar gêmeos."
A idéia básica de estudos com gêmeos é obter dados a partir de numerosos pares de gêmeos idênticos e fraternos (bivitelinos) e comparar as semelhanças dos dois sujeitos em manifestações como câncer, asma, esquizofrenia e fenótipo canhoto.
Gêmeos idênticos apresentam os mesmos genes, enquanto os fraternos são diferentes geneticamente, compartilhando semelhanças, em média, de 50% do DNA. Estudos com gêmeos que tentaram atribuir o componente genético a manifestações como inteligência e agressão têm sido uma "batata quente" política, por razões óbvias. Mas cientistas que conduzem essas pesquisas são unânimes em afirmar que genes e ambiente influenciam simutaneamente o comportamento.
Os autores do artigo do Journal, liderados por Paul Lichtenstein, do instituto Karolinska, em Estocolmo, estimaram que 42% do risco de câncer de próstata provêm de fatores hereditários, da mesma forma que 35% do risco de câncer colorretal e 27% do risco de câncer de mama vêm dos genes. Esses números mostram que o irmão gêmeo idêntico de alguém com câncer colorretal, de próstata ou de mama, apresentam 13%, 11% e 18% de chance, respectivamente, de pegar a mesma doença; o que significa que genes são significantes para as doenças, mas não determinantes.
Isso revela que o lide do Post está próximo da verdade. "O fatalismo do público geral sobre a inevitabilidade de efeitos genéticos deveria ser facilmente dissipado com esses dados", escreveram os autores. Não precisamos, no entanto, de um estudo com gêmeos para que isso se revele. Diversos estudos de câncer mostraram um significativo componente genético.
Mesmo não podendo provar que genes estão envolvidos com várias doenças, gêmeos idênticos ainda podem contribuir para a ciência ? por meio de estudo de suas diferenças. Por exemplo, um par de gêmeos idênticos em que um deles adquire câncer de mama e o outro não, oferece a pesquisadores a chance de descobrir elementos ambientais que contribuem para o câncer, examinando diferentes exposições ao meio externo de ambos.
"Assim, observa-se genes e ambiente como fatores mais importantes no desenvolvimento das experiências de vida de cada um", afirma Nancy L. Segal, psicóloga do Fullerton, sediado na Califórnia. "Mas creio que, no futuro, veremos mais estudo controversos sobre gêmeos. [tradução de Beatriz Singer]"
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