Tuesday, 24 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Pai discorda do Juizado

QUALIDADE NA TV

LAÇOS DE FAMÍLIA

"Pai discorda do Juizado", copyright Jornal do Brasil, 15/11/00

"A decisão do juiz titular da 1ª Vara da Infância e da Juventude, Siro Darlan, de suspender a participação das crianças na novela LAÇOS DE FAMÍLIA não agradou ao militar Sandro Monteiro, 28 anos, pai dos gêmeos Natã e Andrey Linhares Beltrão. Os bebês de um ano e três meses se revezam no papel de Bruninho, filho da garota de programa Capitu, interpretada pela atriz Giovanna Antonelli. ‘Não concordo com essa decisão, porque meus filhos não mudaram em nada seu comportamento por causa da novela’, disse. No dia anterior, Sandro disse que um de seus filhos, Andrey, ficou com medo do ator Henri Pagnocelli, após participar de uma cena em que o personagem Orlando, bêbado, promove uma quebradeira e agride outra pessoa.

Sandro Monteiro contou que, anteontem, durante as gravações do casamento de Camila (Carolina Dieckmann) e Edu (Reynaldo Gianecchini) na capela da reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, tudo transcorreu normalmente e as gravações não foram interrompidas por causa da presença dos fiscais do Juizado de Menores. ‘Eles só fizeram um levantamento das crianças que estavam na igreja e ficaram observando as gravações’, conta. A mãe dos gêmeos, Adriana Linhares, 26 anos, afirma que acataria a decisão da Justiça. ‘Violência não combina com criança’."

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"Problemas em outros canais", copyright Jornal do Brasil, 15/11/00

"Em maio deste ano, o ministro da Justiça, José Gregori, suspendeu por 45 dias as autorizações para sorteios como os realizados no Bolão do Faustão, na Globo, no Show do milhão, no SBT, e no Top vida, na Record. Com a publicação da Portaria 796, do Ministério da Justiça, em 8 de setembro, os programas passariam a ser classificados por faixa etária e horário de exibição, o que provocou a retirada do ar do quadro Banheira do Gugu do Domingo legal, do SBT.

Atualmente, além das notificações recebidas recentemente pela TV Globo, a emissora de Sílvio Santos aguarda a decisão da Justiça sobre a exibição, em outubro, no Programa do Ratinho, de um vídeo em que uma criança de três anos era espancada e torturada. Para o presidente da Sub-comissão de Rádio e TV do Senado, Pedro Simon, estas ações demonstram que a sociedade civil vem reagindo contra o que classifica como abuso:’Isso vem reforçar a necessidade de diálogo entre os três poderes sobre a questão da normatização da matéria’.

Para a autora do livro A histeria na mídia (editora Mauad), Raquel Paiva, a reação conjunta de instituições como o Ministério Público, o Juizado de Menores e a Igreja caracteriza ‘o feitiço que virou contra o feiticeiro’. ‘Em casos como os da vitória e do impeachment de Fernando Collor de Mello, a televisão ensinou ao público como se desestabiliza o poder. É isso que ela está vivendo agora’, avalia Raquel."

"Rede Globo vai recorrer para evitar censura", copyright O Globo, 15/11/00

"A Rede Globo entrará hoje com novo recurso para suspender a liminar do Juizado da Infância e Juventude do Rio de Janeiro. O documento determina que a novela ‘LAÇOS DE FAMÍLIA’ passe a ser exibida somente depois das 21h, com classificação para maiores de 14 anos, e não veicule a imagem de menores na trama. Só ontem, segundo a diretora do setor jurídico da TV Globo, Simone Lahorgue Nunes, a emissora ficou sabendo, informalmente, que o recurso que ela havia impetrado anteriormente fora indeferido pelo juiz Siro Darlan, da 1ª Vara da Infância e Juventude. Ontem, a novela começou após as 21h e sem a presença de menores. Segundo a emissora, a mudança de horário não foi proposital.

Para Simone Nunes, a ação judicial não respeita a Constituição, já que no artigo 5, inciso 9, está claro que é vetada qualquer tipo de censura a atividades artísticas e intelectuais. A promotora da 1ª Vara da Infância e da Juventude, Danielle Cavalcante de Barros, disse que o Ministério Público tomará medidas para o cumprimento da liminar, entre elas a execução da multa de R$ 70 mil por dia.

Para a advogada, esta multa também é questionável.

– O juizado está multando pelo descumprimento da lei, e nós estamos questionando este descumprimento. Ele fala em cenas de sexo, e eu pergunto: o que é uma cena de sexo? Para uns, pode ser uma coisa, para outros, pode ser outra – diz Simone.

Na noite de segunda-feira passada, 11 menores foram proibidos de participar da gravação de uma cena na capela da reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, na Urca, sob a alegação de que não havia alvará judicial. As cenas faziam parte dos capítulos 143 e 144, nos quais acontece o casamento dos personagens Edu (Reynaldo Gianecchini) e Camila (Carolina Dieckmann).

Manoel Carlos, autor de ‘LAÇOS DE FAMÍLIA’ e pai da atriz Júlia Almeida, que vive a Estela na novela, considera a decisão do Juizado ‘uma estupidez absoluta’ e diz que continua escrevendo:

– Eu estranho que ninguém tome uma atitude contra atitudes como essa, que são uma censura aberta. Agora querem interferir na educação que os pais querem dar aos filhos.

Para o diretor da trama, Ricardo Waddington, trata-se de um ato inconstitucional:

– O mais preocupante é que o problema pode vir a ser contra toda a manifestação artística e cultural do país. Até conseguirmos a liminar estamos editando duas versões. Uma com os menores nas cenas e outra sem eles.

Carlos Lombardi, autor de ‘Uga uga’, que recentemente teve que cobrir os seios das índias da novela por causa de problemas com o Ministério da Justiça, também critica a decisão do Juizado:

– Os militares pelo menos tinham coragem. Essa censura de armário é uma das coisas mais covardes que eu já vi na minha vida. Cortar novelas é uma coisa estúpida.

Benedito Ruy Barbosa, autor de ‘Terra nostra’, conta que ficou assustado quando soube que os diretores poderiam ser presos se já ontem à noite a trama fosse ao ar antes das 21h:

– Voltei ao tempo da ditadura. Será que amanhã, quando tiver que escrever a minha próxima novela, terei medo. Será que eu poderia, por exemplo, falar sobre os sem-terra novamente?

Stephan Nercessian, presidente do Sindicato dos Artistas do Rio de Janeiro, critica a atitude do juiz Siro Darlan:

– Acho que por vezes esse juiz avança em áreas que não são de sua competência. A responsabilidade é dos pais.

A autora da próxima novela das 18h, Ana Maria Morehtzon, disse que já viu esse filme:

– É a pior coisa que existe na vida. Acho um absurdo. Temos um presidente eleito e o que está acontecendo é que temos uma Constituição que não está sendo respeitada. É claro que isso é censura. Pode ser só o início, a coisa pode se espalhar.

Para Lauro César Muniz, autor de ‘Aquarela do Brasil’, é preciso mobilizar os artistas:

– Temos que fazer um movimento nacional. Isso que está acontecendo é de uma violência extrema. Essa censura vai acabar sendo tão drástica quanto na ditadura.

Gilberto Braga acha a liminar um absurdo:

– As pessoas que estão fazendo esta novela são muito responsáveis. A Constituição garante a participação de menores. As crianças que trabalham em ‘LAÇOS DE FAMÍLIA’ têm permissão dos pais. E a Rede Globo tem todo o cuidado em relação aos estudos e tudo o mais. Mandar cortar cenas da novela é um ato de extrema violência.

Indignada, a autora Maria Adelaide Amaral, que está adaptando ‘Os Maias’ para a televisão, acha uma atitude arbitrária:

– Nunca pensei que fosse chegar ao ano 2000 me vendo novamente ameaçada pelo fantasma da censura. É muito grave o que está acontecendo. Não podemos admitir isso por argumento algum. E o deles ainda é arbitrário.

O ator Paulo José concorda com a autora e acha que esta atitude pode ser a volta da censura:

– O Ministério Público pode fazer a classificação de horário, recomendar que o programa não seja visto por menores, mas não pode proibir de trabalhar. No Rio, o Juizado de Menores está ultrapassando os limites de sua função. É um excesso de zelo hipócrita.

Para a escritora Glória Perez, do jeito que estão indo as coisas, a violência da ditadura pode voltar:

– Quero que as pessoas entendam que isso é só o começo. Daqui a pouco vai haver censura no jornalismo, na música, no teatro. A liberdade de expressão está sendo agredida. É uma luta de todos. Levamos muito tempo para conseguir ter de volta a liberdade de expressão, não podemos deixar isso escapar.

Em nota oficial, ontem, a Cúria Metropolitana repudiou também a gravação da novela realizada na capela da reitoria da UFRJ e comunicou ao reitor José Henrique Vilhena de Paiva que a capela de São Pedro Alcântara ficará inabilitada para quaisquer atos religiosos a partir da data de exibição da cena do casamento. Por causa disso, o diretor da trama, Ricardo Waddington, decidiu ontem que a cena de casamento vai ser regravada no Projac:

– Não queremos privar a comunidade de poder usar a capela – disse ele."

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