Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Paulo Miguel Madeira

PORTUGAL

“?É Precisa Uma Espécie de Economia Mista? na TV”, copyright Público, 13/7/03

“Paddy Scannel, director de investigação na Escola de Comunicação e Actividades Criativas da Universidade de Westminster, em Inglaterra, esteve na semana passada no Convento da Arrábida, onde proferiu uma palestra sobre a aplicação do conceito habermasiano de esfera pública à televisão, no âmbito do ciclo de conferências sobre ?Os acontecimentos mediáticos, a televisão e a sociedade civil?. Defende que ?a radiotelevisão [à falta de melhor tradução para ?broadcast?] tem desempenhado um papel importante na normalização e democratização do discurso em público?. E postula-lhe duas esferas públicas: a do entretenimento e a política. Mas sugere que toda a conversa na rádio e na televisão tem um compronisso com a sociabilidade e o entretenimento. O PÚBLICO entrevistou-o no dia em que cumpriu 60 anos.

PÚBLICO – Porque decidiu trabalhar sobre a natureza da esfera pública?

PADDY SCANNELL – Comecei a trabalhar sobre radiotelevisão no Reino Unido, onde, historicamente, é serviço público. Comecei com um estudo histórico da BBC. Mais tarde, claro, começa-se a pensar sobre o que fizemos. E comecei a tentar perceber o que é que ?serviço público? significa. E o livro de Jurgen Habermas [?The Structural Transformation of the Public Sphere?, publicado na Alemanha em 1962 e traduzido para inglês em 1989] é muito influente, porque é uma tese sobre o papel do debate, o papel dos ?media? e o papel da democracia na vida política moderna. Por isso penso que as questões relacionadas com a vida pública, as questões relacionadas com a democracia e a política estão todas interligadas. E é claro que os ?media? são a instituição através da qual estas coisas se juntam.

Na Grã-Bretanha, a radiotelevisão e a democracia andam juntas. Começaram ao mesmo tempo. A democracia começou em 1918, com a universalização do voto. E a radiotelevisão começou quatro anos depois, em 1922.

P. – A televisão é essencial para a democracia?

R. – Sim.

P. – A discussão entre televisão pública e televisão comercial tem alguma relevância para a natureza da democracia?

R. – Acho que nem sempre o serviço público de televisão é o oposto de televisão comercial. Um problema da televisão é o de como a financiar. Historicamente isto teve duas soluções: ou a publicidade ou alguma forma de taxação, que é a solução britânica. Penso que é preciso uma espécie de economia mista. É precisa a disciplina da televisão comercial, que pensa naturalmente mais nas suas audiências. O serviço público tende a pensar mais naquilo que é do interesse público. Por um lado, a coisa boa é que tenta chegar a um largo espectro de gostos e interesses; por outro lado, o risco é que caia em várias formas de elitismo.

P. – Há várias perspectivas sobre o que é o serviço público…

R. – Penso que ?broadcasting? [radiotelevisão] é uma palavra importante, no serviço público, porque significa que algo está disponível para toda a gente. Portanto, que ninguém é excluído. E depois torna-se uma questão muito difícil, porque é preciso tentar arranjar maneira de fazer programas que atraiam toda a gente. Basicamente, penso que a radiotelevisão fornece serviços de informação e entretenimento.

P. – Hoje em dia temos programas com excesso de sedução? Uma facilitação psicológica para o público?

R. – Em inglês dizemos estupidificar a política… sobre-simplificar. Por outro lado penso que as boas ideias são simples, e que se não se puder explicar uma ideia, se for demaisdo difícil, provavelmente não será uma ideia muito boa. Penso que a democracia é uma ideia simples.

A sociedade está a tornar-se democrática. É uma coisa com que se aprende a viver. No princípio do século XX, a grande preocupação era que a sociedade era demasiado complexa, demasiado difícil para que a democracia tivesse significado. Mas a radiotelevisão deu aos políticos acesso directo a todo o eleitorado, e deu-lhes a oportunidade de expor as suas ideias. E se as puserem claramente e as pessoas gostarem, eles saem-se bem. Penso que isso é bom. Não concordo com Habermas quanto à noção de tornar as coisas demasiado fáceis, ou demasiado simples.

P. – Mas também podemos pensar em fazer com que as pessoas sejam capazes de pensar de um modo mais complexo acerca de assuntos que por vezes não são fáceis de explicar.

R. – Isso é verdade e esse processo é algo que se desenvolve ao longo do tempo. A democracia é um processo. É algo que se aprofunda ao longo do tempo. Não tenho dúvida de que actualmente as pessoas têm uma compreensão mais complexa das realidades políticas, numa democracia relativamente madura como a britânica, do que, digamos, na África do Sul.

P. – Mas a questão é que isso pode ter alguma coisa a ver com o modo como a televisão funciona…

R. – Tem, tem. Porque é um processo histórico. Pensamos sempre em termos do presente, mas a realidade é que a BBC emite há 80 anos. Há 80 anos que está em curso este processo de debate e discussão. E isso muda, desenvolve, é parte da memória colectiva das pessoas.

P. – Não considera mau que se transponha o ambiente do entretenimento para o debate político. Mas isso não pode ser uma maneira de não se discutir os assuntos? Porque tudo tem de ser engraçado…

R. – A política é um assunto sério. Afecta as nossas vidas, por isso tem de ser feita com seriedade. Mas no princípio do séc. XX os políticos falavam ao eleitorado numa linguagem que ele não compreendia. E isso tornava-se numa maneira de não comunicar com o público. É preciso comunicar as ideias com clareza. E penso que faz parte da disciplina da vida pública produzir um ?espectáculo? que leve as pessoas a interessarem-se. Que prenda a sua atenção. Se não, porque é que haveriam de ouvir?”

***

“Sociólogo Defende Nova Deontologia para o Jornalismo”, copyright Público, 9/7/03

“O jornalismo está perante novas realidades e por isso precisa de nova deontologia, advogou ontem Daniel Dayan, investigador do Laboratório de Antropologia Social do Centro Nacional de Pesquisa Científica francês, no segundo dia do seminário ?Os acontecimentos mediáticos, a televisão e a sociedade civil?, no âmbito dos Encontros da Arrábida 2003. ?É também preciso que os jornalistas utilizem a deontologia que já têm, mas esta corresponde a géneros passados e já pensados?, afirmou depois em conversa com os jornalistas.

Para o que considera ser os novos géneros, como ?a dramaturgia por dispositivo, é preciso pensar uma nova deontologia?. Mas o que é a ?dramaturgia por dispositivo?? São acontecimentos concebidos para produzir certos efeitos, uma espécie de ?espectáculos probabilísticos?. É o caso do ?concurso? Big Brother, em que à partida se espera que alguém se envolva emocionalmente com alguém, em que se espera que surjam conflitos, etc., mas sem se saber quem serão as pessoas envolvidas nesses acontecimentos, nem o momento exacto da sua ocorrência.

Dayan aplica o mesmo conceito a acontecimentos como as manifestações que rodearam a Cimeira do G8 em Génova, em que à partida se esperava que houvesse violência, mas sem se saber onde ou em que momento. ?Como é que a manifestação da maioria, pacífica, se transforma na manifestação de minorias violentas? É esta a questão que aqui me interessa?, diz Dayan. Isto porque os relatos da comunicação social sobre o evento acabaram por se centrar nos incidentes violentos.

Outro aspecto que preocupa este estudioso dos ?media? é a banalização das imagens de violência e de morte nos noticiários, as quais, ?na maioria das vezes, não acrescentam qualquer informação? à veiculada verbalmente. ?Os jornalistas devem ajudar a definir o que merece e o que não merece ser público?, remata.

José Rebelo, professor de Comunicação no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) da Universidade de Lisboa afirmou perfilhar a ideia dos ?media? como ?lugar de cruzamento de poderes?, mais do que um poder autónomo à imagem da habitual ideia de que a comunicação social é o ?quarto poder?. Quanto à questão de saber se ?os jornalistas ainda têm poder?, como questionava recentemente a revista ?Hermès?, respondeu com a expressão do sociólogo Dominique Wolton, director daquela publicação, a respeito dos jornalistas: ?Esses heróis frágeis…?”

 

REUTERS vs. BLOOMBERG

“?Reuters acusa Bloomberg de violação de patentes”, copyright Público, 13/7/03

“O grupo britânico de comunicação social e serviços financeiros Reuters lançou uma acção judicial contra o seu rival norte-americano Bloomberg (fundado pelo actual presidente da Câmara de Nova Iorque), que acusa de violação de patentes, disse ontem à AFP um porta-voz da Reuters. A empresa apresentou a sua queixa na sexta-feira num tribunal do Distrito Sul de Nova Iorque, acusando a Bloomberg de violação dos direitos de três das suas patentes de tecnologias de transacções automáticas. A Reuters utiliza esta tecnologia para possibilitar aos seus clientes a troca de divisas estrangeiras e outros títulos. No ano passado, este sistema rendeu ao grupo cerca de 54 milhões de libras (cerca de 78 milhões de euros ao câmbio actual). ?Apesar de a Reuters ter preferido não levar o caso à justiça, não pode tolerar uma utilização das suas patentes sem autorização?, afirma a empresa. E diz ter ?investido milhões em investigação e desenvolvimento? para pôr essas patentes operacionais. ?Vamos proteger vigorosamente os nosso direitos de propriedade intelectual?, declarou um porta-voz. A decisão da Reuters segue-se a vários meses de discussões infrutíferas com a Bloomberg, o seu principal concorrente no mercado norte-americano. Não foi especificado na queixa qual o montante de prejuízos e juros que a empresa pretende recuperar.”

 

CFI / FRANÇA

“?CNN à Francesa Marca Passo”, copyright Público, 12/7/03

“Graciosidades como ?macacos cobardes comedores de queijo?, endereçadas aos franceses em certas televisões americanas em reacção à hostilidade de Paris à guerra no Iraque, levaram o Presidente francês, Jacques Chirac, a apressar as coisas para fazer nascer a futura televisão de informação francesa com vocação internacional. Mas para avançar falta-lhe o principal: meios para funcionar.

Esta CNN à francesa tem já um nome de código – CFI-24 (CFI significa Canal France International, e 24 indica que emite 24 horas por dia) – que lhe foi dado pela comissão parlamentar encarregue de estudar o projecto e avançar propostas.

Em meados de Maio, a missão de estudo da Assembleia Nacional entregou um primeiro relatório, aprovado pela unanimidade dos deputados de direita e do centro (maioria), e da esquerda (oposição). Mas a comissão decidiu suspender esta semana o resto da sua missão, até 22 de Setembro. É que, fazendo tábua rasa do trabalho dos deputados e do voto do Parlamento, o primeiro-ministro Jean-Pierre Raffarin encarregou o deputado de Cannes, Bernard Brochand – um dos membros da comissão parlamentar que elaborou o projecto da CFI-24 – de organizar um grupo de trabalho para ?fazer propostas de um esquema operacional [da futura televisão internacional] (…) tendo em conta as diferentes forças mobilizáveis hoje no sector do audiovisual francês?. O primeiro-ministro quer receber as conclusões de Brochand até 22 de Setembro.

Ora, segundo afirmou ao PÚBLICO o deputado centrista François Rochebloine, presidente da comissão parlamentar, ?já está feito tudo o que é necessário para se lançar a televisão de informação francesa. Agora é só uma questão de encontrar meios para o fazer?. O deputado recusa especular sobre os motivos que levaram o executivo a pedir mais um relatório (havia já outros estudos preliminares), limitando-se a fazer certas constatações: ?Bernard Brochand está numa lógica diferente da comissão. O nosso relatório advoga uma solução de financiamento misto, público e privado, mas com o sector público numa posição de força. Bernard Brochant nunca escondeu que está mais inclinado para uma solução de televisão privada.?

A missão de informação da Assembleia Nacional preconiza uma vasta aliança das estruturas de informação já existentes em torno deste projecto de audiovisual público. Essa aliança iria da agência noticiosa AFP às televisões internacionais como a TV5 e a EuroNews, passando pelos ?media? públicos e por uma participação de grupos privados como os canais TF1 e Canal Plus.

Em português numa segunda fase

Com 200 trabalhadores e emitindo primeiro para a Europa, África e Médio Oriente, os custos de funcionamento da CFI-24 estão avaliados entre 80 e 100 milhões de euros por ano, implicando uma programação imediata em francês, inglês, árabe e espanhol. A prazo, seriam acrescentadas outras línguas, como o português e o chinês, quando a difusão fosse alargada à América Latina, à América do Norte e à Ásia, cinco a sete anos depois.

?É um projecto complexo, custoso, e que deve ter meios para durar?, frisa Rochebloine, acrescentando: ?Receio que não haja meios para se lançar uma televisão destas, por ora.? Mesmo se o sucesso da televisão do Qatar Al-Jazira, e mais recentemente o das suas rivais árabes Abu Dhabi TV e Al-Arabya, demonstraram que há um mercado para o audiovisual internacional, o projecto da CFI-24 é mais ambicioso. ?Preconizamos uma linha editorial independente e responsável, que seja a do olhar da França na actualidade, mas que não seja a voz do governo francês?, explica o presidente da comissão parlamentar -as televisões públicas francesas têm a reputação de serem mais independentes do poder do que as privadas.

As emissões em línguas estrangeiras seriam primeiro simples traduções da programação geral. Mas o relatório preconiza a criação, a prazo, de redacções com jornalistas de cada uma das outras línguas adoptadas. O período de transição foi adoptado em função das advertências feitas aos deputados franceses pela CNN e pela BBC World, que frisaram as dificuldades que têm tido para encontrarem jornalistas ?muito competentes? nas diferentes línguas.”