GOVERNO LULA
“Gushiken terá o controle de R$ 113,2 mi em publicidade”, copyright Folha de S. Paulo, 12/01/03
“O governo Luiz Inácio Lula da Silva pretende gastar cerca de R$ 230 milhões em publicidade oficial neste ano. Quase metade desse dinheiro – R$ 113,2 milhões- ficará diretamente concentrada nas mãos de Luiz Gushiken, 52, ministro-chefe da Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica da Presidência.
Gushiken -formado em administração de empresas, três vezes deputado federal pelo PT entre 1987 e 1998, e amigo de Lula e do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu- é o homem forte do governo na área de publicidade e mais poderoso que todos os seus antecessores.
Além de ampliar a área de atuação de sua pasta para ?assuntos estratégicos? -assim definidos pelo presidente da República, em incumbência que nenhum de seus antecessores teve- Gushiken cuida diretamente da publicidade institucional do governo.
Nas gestões anteriores, a Secretaria de Comunicação coordenava toda a publicidade de governo, mas sua verba própria no ano passado, por exemplo, foi perto de R$ 7 milhões, gastos em custeio administrativo.
O ex-secretário de Comunicação João Roberto Vieira da Costa planejou, no governo passado, a nova forma de alocação de recursos. A publicidade institucional – ou seja, a que trata da divulgação de metas e resultados do governo- fica com a Secretaria de Comunicação. A publicidade de utilidade pública (como, por exemplo, a campanha contra a dengue), a legal (atas, editais e avisos) e a mercadológica (caso de produtos da Petrobras) ficam diretamente com os ministérios ou estatais, ainda que sob o monitoramento de Gushiken.
O governo pretende gastar cerca de R$ 115 milhões com utilidade pública e publicidade legal, além dos R$ 113,2 milhões com publicidade institucional. O governo Fernando Henrique Cardoso gastou no ano passado R$ 245 milhões nas três categorias.
Somando-se os demais recursos de ministérios e estatais, a verba total para publicidade oficial em 2003 atinge R$ 1,4 bilhão, contra R$ 1,3 bi no governo tucano.
O ex-secretário Vieira da Costa sugeriu, durante a transição, que Gushiken concentrasse a verba de publicidade institucional do governo nas mãos de uma ou duas agências, em vez da quase uma dezena de empresas que trabalham hoje no setor. A medida -ainda não oficializada ou mesmo aceita- seria justificada por uma padronização da linguagem de comunicação do governo.
Assim a Secretaria de Publicidade -subordinada à Secretaria de Comunicação- escolheria uma ou duas agências que dividiriam R$ 113,2 milhões. No ranking de 2001 das empresas privadas (o de 2002 não foi concluído), a Unilever Brasil (do setor de higiene e limpeza) foi a maior anunciante do país com gastos de R$ 126,2 milhões, sendo seguida pela Volkswagen com R$ 91,1 milhões.
Esse montante será administrado pela nova secretária de Publicidade, Ângela Maria Tavares Chaves, que trabalhou, entre 1978 e 1984, com Duda Mendonça, marqueteiro da campanha petista.
Segundo assessores do PT ouvidos pela Folha, Ângela foi uma indicação de Duda. Há seis anos como consultora independente, manteve contatos com Duda e dirigiu contas publicitárias em São Paulo, Rio e Salvador, ?com ênfase no setor público?, como consta do currículo divulgado pela Secretaria de Comunicação.
Duda Mendonça, que recebeu R$ 5 milhões do PT para fazer o marketing eleitoral de Lula, nega ter sugerido o nome de Ângela. Afirma que foi ouvido apenas sobre sua capacidade gerencial.
?É uma profissional reconhecidamente competente. Já trabalhou comigo e com todo mundo do mercado. Já trabalhou até para o PSDB em São Paulo. Não indiquei ninguém?, declara Duda.
A nomeação de Ângela foi assinada no primeiro dia da administração Lula, em substituição ao publicitário Alex Periscinoto.
?Não sei se fui indicada por Duda. Quem me convidou para o cargo foi o Marcus Flora (secretário-adjunto de Gushiken e ex-coordenador de pesquisas eleitorais do PT)?, diz Ângela, que não comenta seus planos para o cargo. Colaborou MÔNICA BERGAMO, colunista da Folha”
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“Influência de Duda incomoda petistas”, copyright Folha de S. Paulo, 12/01/03
“Setores do PT estão incomodados com o papel do publicitário Duda Mendonça na comunicação do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Oficialmente, a última tarefa do publicitário foi organizar a festa de posse de Lula e criar, gratuitamente, a campanha de marketing do programa Fome Zero.
Mas ele é ouvido sobre decisões e nomeações do setor de comunicação. É atribuída a Duda, por exemplo, a sugestão -até agora não acatada- do nome do jornalista Florestan Fernandes Jr. para comandar a Rede Brasil-TVE.
São dois canais de televisão pública, um no Rio e outro no Maranhão, que coordenam uma rede de emissoras educativas e/ou públicas no país.
Formalmente, o PT sondou a jornalista Alice Maria, da chefia de jornalismo do canal pago Globo News, para comandar a Rede Brasil/TVE. Ela não manifestou interesse em assumir a empreitada. O ex-deputado federal petista e jornalista Milton Temer tentou articular seu nome para o cargo, mas sofre resistências internas.
Entre petistas, atribui-se a nomeação de Luiz Gushiken para a Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica não só a sua amizade com o presidente Lula. Durante a campanha, Gushiken construiu uma boa relação com Duda Mendonça, que detém a confiança do presidente nas questões do setor, em especial depois da forma como conduziu o marketing eleitoral petista.
Duda nega interferências no governo petista. ?Trabalho quando sou chamado. Até agora não fui?, diz o publicitário.
No livro que lançou no ano passado, ?Casos e Coisas?, Duda contou um episódio polêmico sobre a participação em governo de marqueteiros que cuidaram da campanha eleitoral.
Em meados da década de 80, disse que colaborou gratuitamente na campanha de Waldir Pires ao governo da Bahia. Derrotado, Pires é nomeado ministro da Previdência do governo José Sarney (1985-1990).
?Criei, naturalmente, uma expectativa?, escreveu Duda. ?Pensei que teria, pelo menos, uma oportunidade. Mas Waldir virou as costas para mim e por interesses políticos entregou a conta do ministério a uma outra agência, também da Bahia, do mesmo tamanho da minha, sem nenhuma concorrência (…). Eu não queria nenhum tipo de favorecimento. Só queria ter uma oportunidade para concorrer, para mostrar meu trabalho.?”
“Pauta de repórter”, copyright O Globo, 14/01/03
“Alistair Soames, correspondente itinerante do ?Manchester Banner? na América do Sul, estava com uma cara fechada, contrária à sua índole galhofeira. ?É essa viagem do Lula aos bolsões de pobreza. Deu o maior ibope na Europa. E sabem por quê? Porque rendeu imagens ótimas. Hoje em dia, o que não dá imagem não existe?, explicou. A explicação era razoável, mas não explicava o mau humor. Disse:
– Primeiro, porque meu jornal reclamou de não ter ido também na caravana. Bem que tentei, mas o Ricardo Kotscho disse que os jornalistas que quisessem teriam de ir pelos seus próprios meios e não tive tempo de me organizar para acompanhar a viagem. O pessoal lá em Manchester acha que todo presidente latino-americano viaja como o presidente dos Estados Unidos, que é sempre acompanhado por um avião de jornalistas. Expliquei que aqui é diferente, que o governo está tão interessado em poupar dinheiro que os ministros tiveram de pagar do próprio bolso até a Coca-Cola do minibar no hotel em Recife. Mas eles não ficaram contentes, não. Eu, arriscando-me a levar pedradas e até tiro nas ruas de Caracas, e eles lá, no bem-bom da Inglaterra reclamando por uma besteira dessas. Mas tem pior: com a exposição do Lula na mídia e um interesse redobrado pelo Brasil, meu editor foi buscar o arquivo de política brasileira. E olhe só o e-mail que me mandou:
?Procure entrevistar o ex-presidente Itamar Franco. Esse homem deve ser um gênio. Basta olhar a sua ficha biográfica.?
– Gênio como? – perguntei espantado.
– Simples. Imagine um editor que nunca pôs os pés no Brasil lendo a ficha do Itamar. Foi duas vezes prefeito de sua cidade natal. Duas vezes eleito senador pelo seu estado, depois vice-presidente e presidente da República. Escolheu Fernando Henrique Cardoso para seu sucessor e conseguiu elegê-lo no primeiro turno, por larga maioria. O presidente Cardoso considerou tão fundamental a sua colaboração na formulação de sua política externa que o mandou como embaixador para Portugal, um posto importante não só pelas ligações históricas de Portugal com o Brasil como pelos crescentes investimentos portugueses no Brasil e a ponte que faz com a União Européia e a comunidade de língua portuguesa na África. Terminado o período em Lisboa, o presidente Cardoso convocou-o para representá-lo na OEA, lugar chave para as decisões sobre a América Latina, que, afinal, é a região que interessa de imediato ao Brasil. Na volta, embora divergisse da política econômica do governo e de seu partido, elegeu-se governador de seu estado, o segundo mais importante do país. Agora, noticia-se que o governo Lula está considerando mandá-lo como embaixador para a Argentina, o posto mais estratégico da diplomacia brasileira. Com um currículo desses dá ou não para achar que o homem é um gênio? – disse.
O professor Wanderlei, que chegava ao grupo, meteu o bedelho na conversa:
– Esse e-mail é a prova de que o Lula tem razão quando diz ser preciso ver as coisas pessoalmente. O papel aceita tudo, estatísticas frias e a genialidade do Itamar. Não sei se o Alistair estava aqui quando o Itamar se entrincheirou no Palácio da Liberdade, convocou a Polícia Militar, mandou instalar ninhos de metralhadora nas janelas e estacionou ambulâncias nos jardins, dizendo ter informações secretas de que a sede do governo de Minas estava ameaçada de ser atacada. Por quem, não disse. E quando comandou manobras da PM às margens do Rio Grande para impedir a privatização de Furnas? Só faltou pôr um capacete de combate na cabeça. Foram espetáculos maravilhosos, melhores que os filmes mexicanos de Cantinflas. Mas, por mais que se aprecie Cantinflas, é difícil considerar que a sua imitação seja sinal de genialidade.
– E o que vocês estão achando do Fome Zero? – perguntei, mudando de assunto.
O coronel Tucídides, porta-voz do V Exército, tratou logo de responder:
– Estamos achando ótimo. É a primeira vez que, logo no início de um governo novo, apela-se para as Forças Armadas. Nem no período militar aconteceu isso. E o ministro Viegas sabe que nós somos capazes de cumprir qualquer missão que nos derem, desde que nos dêem também os meios para cumpri-las. Mas é bom parar de se falar em unificar as aposentadorias de civis e militares. Nós temos carreiras diferentes, com objetivos diferentes. Ao longo da carreira, um militar é obrigado a se mudar 12 ou 13 vezes, muitas vezes para lugares onde os civis se recusam a ir. Notem só o que aconteceu com o Calha Norte. Era para ter Polícia Federal, agentes da Receita, médicos do SUS, vários outros funcionários civis. E quem foi para lá? Só os militares.
Recusei-me a dar palpite no debate, ainda que instado pelo coronel Tucídides. Faz tempo que aprendi que paisano não deve se meter nesse tipo de discussão.”