Magda de Almeida (*)
Certamente, a frase não é minha, o verbo também era outro, mas o sentido é mais ou menos o mesmo e, três mil anos depois, ainda serve como lembrete. Esta trágica história de amor pode ser vista, no meu entender, de dois ângulos distintos, mas que se cruzam, porque tudo na vida se cruza mesmo, não nos iludamos: de um lado, o grande jornalão, snob, rempli de soi mème, baluarte da moral e da tradição burguesa, vê-se, de repente, diante de um um escândalo dessas proporções dentro de suas próprias entranhas. Caramba!!! O rei está nu. Está com tudo à mostra e o que se vê, por mais que tenha tentado esconder isso nos últimos 100 anos , é que o dele é igualzinho ao dos outros. Nada do que se envergonhar. Pelo contrário, bem-vindo ao mundo dos humanos. Finalmente vai poder saborear o gosto pra lá de amargo de saber-se vulnerável e exposto às mazelas naturais da vida. Dói, mas ajuda a crescer.
Disse de repente? A única coisa que explode de repente é uma bomba (para quem não a preparou). Coração avisa. Esta tragédia já vinha sendo anunciada há muito tempo, até pelos dois personagens principais, porque seus corações já vinham explodindo e cada um a seu modo gritava por socorro. Um socorro que nunca veio. Há um monte de cúmplices nessa história toda, visivelmente cercada por um inacreditável e mal disfarçado machismo. Ali não há inocentes, a não ser a própria vítima. E não é só o rei que está nu nessa peça. O cenário inteiro está dolorosamente exposto. Se há alguém que ainda tinha a ilusão de perceber uma redação como um templo sagrado cheio de sacerdotes e sacerdotisas acima do bem e do mal; seres diáfanos voltados para a defesa dos direitos inalienáveis dos humanos, onde quer que eles estejam; anjos enviados pelos deuses para brandirem suas espadas contra a injustiça, não importa de que tipo… quem assim pensava deve estar passando por profundas angústias, a esta altura. Para os ingênuos, um mundo que cai. Por este aspecto, esta história está valendo para muita coisa.
O outro aspecto que não pode ser percebido envolve a cobertura. Ao contrário do que faz com os demais mortais, a imprensa brasileira, tradicionalmente, sempre se autoprotegeu, enroscando-se num manto de impunidade e arrogância. Jamais permitiu-se cortar a própria carne, ainda que não tenha nenhuma piedade com a carne dos demais. Não me espanta, portanto, que o noticiário sobre este episódio venha marcado por uma já esperada autocomiseração. Mas também ando com a pulga atrás da orelha diante do farto material exposto por um grande matutino carioca, sempre sóbrio e ponderado no trato com seus próprios pares. É algo que, talvez, só possa ser melhor destrinchado mais para frente.
E para que isso tudo está servindo, além de nos pôr a nu? Está aí uma boa pauta para os famosos debates universitários. Sem querer exagerar, penso que este episódio é marcante para a história do próprio jornalismo brasileiro – não por serem os principais atores dois grandes jornalistas, mas pelo que ele traz de revelador. E até diria, sem medo de errar: de transformador.
(*) Jornalista
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