ALMA DO NEGÓCIO
Luciano Martins Costa (*)
As questões que conduziram especialistas ao 4? Congresso Brasileiro de Jornais e 2? Fórum de Editores, realizado pela Associação Nacional de Jornais nos dias 11 e 12 de agosto, em São Paulo, se concentram numa equação central: a crise por que passa a mídia brasileira é circunstancial, resultante das dificuldades econômicas do país e do crescimento dos custos, ou se trata de um momento de ruptura ainda mal compreendido? O material colocado à disposição dos interessados no período de preparação do evento permitia deduzir que, oficialmente, a ANJ considera mais ponderáveis as razões circunstanciais do que as possíveis causas estruturais para a crise.
Dias antes do congresso, uma palestra de Dominique Héau, professor de Política e Estratégia Empresarial do instituto Insead, da França, promovida pela Fundação Dom Cabral para um grupo de ex-alunos, em São Paulo, lançava algumas luzes interessantes sobre o pano de fundo dessa crise e permitia visualizar alguns equívocos que se repetem na gestão de muitas empresas de comunicação.
Em primeiro lugar, a própria visão de mercado predominante nos centros de decisão da mídia pode estar equivocada e, portanto, viciando os planos estratégicos desde o advento da tecnologia da informação e o recrudescimento do processo de globalização da economia. Segundo Dominique Héau, as empresas são submetidas ao ambiente de variadas maneiras, e em cada setor essas maneiras determinam respostas diferenciadas. Exemplo: se uma parcela importante do público é influenciada pela rede global de informações, incluídas aí as mídias TV por satélite, internet, jornais e revistas, a estratégia da empresa precisa considerar as alterações produzidas no seu público por essa exposição. Mesmo que isso não afete a logística, é preciso levar em conta na escolha e elaboração do conteúdo jornalístico.
Diversidade e complexidade
A exposição a fontes mais amplas de informação e opinião transforma leitores ? e consumidores em geral ? em cidadãos mais exigentes e críticos, reduz a rapidez das suas decisões de longo prazo pela maior oferta de alternativas, dificulta fidelização e estabelece nova visão de relação custo-benefício em cada escolha.
As estratégias de aproximação e retenção desse público, portanto, precisam ser radicalmente alteradas em relação às práticas tradicionais de marketing e de vendas. Finalmente, numa interpretação literal de Dominique Héau, o conceito de concorrência se torna menos concreto.
Portanto, o Valor Econômico não é necessariamente o maior concorrente da Gazeta Mercantil nem a Folha de S.Paulo o maior concorrente do Estado de S.Paulo. A competição passa a ser toda fonte do mesmo produto, integral ou parcialmente entregue ao mercado que se pretende alcançar, produto aqui visto quase de uma forma metafórica: não é jornal que se compra, mas conteúdo para a interação social e decisões de interesse pessoal.
Mais: quanto mais os jornais abrem e diversificam os públicos que pretendem atingir, mais concorrentes acrescenta ao seu porta-fólio. Diversidade produz complexidade, complexidade cria custos, riscos e atrasos.
Oportunidades ocultas
Para se ter uma idéia do peso que esse fator pode ter na crise das empresas de comunicação, a última vez que os grandes jornais brasileiros fizeram um esforço sistemático para comparar seus números e buscar soluções comuns para seus problemas aconteceu há mais de oito anos. E essa definição de concorrência acabou por desandar a iniciativa.
Durante os entendimentos, os representantes do Estado de S.Paulo suspeitaram que o Globo estava demasiadamente interessado em obter informações sobre o mercado paulista, e a confiança se quebrou. Em seguida, o jornal carioca se associou à Folha para criar o Valor Econômico. Conclusão: a desconfiança entre os iguais tem impedido que eles ataquem em conjunto, como um time, seus problemas comuns.
Você, que é repórter ou editor(a), deve estar se perguntando, se é que chegou até esta linha: com todos os demônios, que é que eu tenho com isso?
Bom, caro(a) coleguinha, estamos vivendo a era da responsabilidade individual pelo bem-estar coletivo. A profusão de informações disponíveis no planeta determina que a ninguém é dado alegar ignorância. Entender um pouco de gestão e observar os movimentos dos gestores da empresa onde você trabalha é uma boa maneira de adivinhar onde aquela ave de mau agouro vai fazer seu próximo pouso.
Da mesma forma, interessar-se por tudo que se refere à profissão que te abraçou é uma maneira de desenvolver sensibilidade para oportunidades ocultas. Por último, convém lembrar que ninguém é excelente naquilo que faz enquanto não souber filosofar a respeito.
(*) Jornalista