VEJA & CARTA CAPITAL
Breno Costa (*)
Nem sempre os provérbios são bem utilizados. Por vezes, acabam refletindo o senso comum. "Dize-me com quem andas e te direi quem és" é um deles. Porém, poucas vezes ele conseguiu tanta aplicabilidade quanto no caso da ilustram as páginas reservadas à publicidade.
Realizei estudo comparativo entre duas revistas semanais de caráter editorial antagônico: Veja e CartaCapital. Os anunciantes de cada publicação foram divididos em três grupos: empresas estrangeiras, empresas privadas nacionais e empresas públicas e/ou governamentais nacionais.
Os principais beneficiários
No caso de CartaCapital (edição de 22/10/2003) há um equilíbrio entre empresas privadas nacionais e empresas públicas: 69% da receita publicitária advêm de tais empresas. A participação de capital estrangeiro nas páginas de anúncio da publicação dirigida por Mino Carta é de 31%. Número relativamente baixo, se comparado aos 50% de publicidade oriunda de empresas estrangeiras na revista de maior tiragem do país, a Veja (edição de 29/10/2003). Na publicação de Roberto Civita, apenas 16% dos anúncios vêm de empresas públicas nacionais.
Assim, já se sabe com quem as revistas "andam", agora resta saber quem elas são. A capa da revista Veja analisada era sobre a questão dos transgênicos. Doze páginas de matéria se traduziam em defesa incondicional do plantio e da comercialização dos alimentos geneticamente modificados no Brasil. A princípio, poder-se-ia pensar num simples posicionamento pró-transgênicos por parte da revista. Imparcialidade em jornalismo é como Papai Noel para as crianças. Fala-se muito dela, muitos acreditam, mas, de fato, não existe. No caso, a problemática deve-se ao fato de a matéria não ter sido assinada, quando todas as matérias da Veja têm seus autores identificados, além de não haver na "reportagem" um único depoimento de cientistas, ambientalistas, produtores rurais, consumidores ou outras pessoas diretamente envolvidas na questão.
Como metade da publicidade da revista é ocupada por empresas multinacionais, principais beneficiárias da legalização de plantio e comércio ? as empresas produtoras de sementes geneticamente modificadas são, em sua maioria, estadunidenses ?, é possível perceber a influência dos anunciantes sobre a postura editorial da revista.
Anunciantes e editorial
A capa da CartaCapital continha três chamadas. Uma para a reportagem principal ? um estudo sobre os efeitos do trabalho sobre o homem neste início de milênio ? e duas chamadas menores: uma para matéria sobre os debates em torno da Alca e outra para análise da situação da Bolívia, após os protestos civis que resultaram na renúncia do presidente Sánchez de Lozada. Pode-se dizer que estas duas últimas não estão exatamente de acordo com o pensamento da atual cúpula regente da Casa Branca. Ao mesmo tempo, na matéria sobre a Alca exalta-se a postura da diplomacia brasileira na questão.
Talvez os percentuais de anunciantes expliquem a posição da revista. Vale lembrar que CartaCapital foi a única revista a admitir apoio a um dos candidatos à presidência da República, nas eleições passadas. Seu nome, Luiz Inácio Lula da Silva.
A relação entre os anunciantes e a postura editorial de determinado veículo de comunicação não é diferente da relação entre os acionistas de uma empresa e suas decisões. Os acionistas majoritários, bem ou mal, é que decidem os passos a serem dados pela empresa. No caso da comunicação não é diferente. A partir da constatação de que a participação de capital oriundo de receita publicitária é maior do que a participação de capital advinda de vendagem e assinaturas, não é difícil perceber a influência das "companhias" sobre a "personalidade" dos veículos de comunicação.
(*) Estudante de jornalismo da UFF, integrante da equipe do <www.fazendomedia.weblogger.com.br>