VEJA
Renato Albuquerque (*)
Que a população tenha "abraçado" a causa do apagão, economizando e cortando o consumo de energia elétrica em suas casas, é compreensível. Que a imprensa tenha feito a sua parte, no sentido de alertar as pessoas quanto a critérios de cálculos para evitar maiores riscos para o país, também é aceitável.
Agora, apoiar "claramente" (sem apagões) a aprovação pelo Supremo Tribunal Federal "de alto a baixo" ? como disse a revista Veja (4 de julho) ? das medidas tomadas pelo governo é de uma total incoerência. A própria revista colocara um indivíduo, com nariz de palhaço e um castiçal numa das mãos, em sua capa de 6 de junho, com o título "O que mais falta acontecer?"
Já em 4 de julho, um mês após ter dito que o "brasileiro estava com raiva do apagão", a publicação semanal da Editora Abril, com "Lula light" (não, não é o Lula dos tempos da Light) na capa, afirma que "?foi uma decisão jurídica (não diga!!! pensei que tivesse sido elétrica) [os destaques são meus], como todas as outras do Supremo (também não sabia), mas essa teve uma marca especial de bom senso (e quais não tiveram??? Dá para falar???)."
E continua: "Na discussão do tema, ficou claro que a maioria dos juízes considerou tanto a necessidade de o país poupar eletricidade quanto a impossibilidade, ditada pela natureza, de agir de outra maneira." Será que dá para explicar melhor? Bom, aí a Veja explica: "Em suma, pesaram na decisão o nível de água existente nas represas, a incerteza quanto às chuvas e a desmoralização do controle energético que aconteceria se o STF revogasse as medidas."
Difícil, hein?
Para começar, com o caos político vivido pelo país atualmente , quem disse que o "controle energético" ? substitua-se por governo ? tem "moral" para alguma coisa? E o que quer dizer "desmoralização do controle energético"? É pior ainda do que tudo que o governo já fez? O fato de o STF aprovar as chamadas "medidas de racionamento" melhora em que a imagem de um governo desgastado, que põe a culpa da falta de energia em cidadãos e passa por cima das leis (como a de Defesa do Consumidor) para fazer valer seus interesses?
Como o STF pode julgar "a incerteza quanto às chuvas e o nível de água existente nas represas" penalizando pessoas que se esforçaram desde o início da crise para contribuir com o país? Na mesma matéria, um dos ministros do STF, Sidney Sanches, observou: "Se disser que é inconstitucional, o povo não vai mais cumprir." Ah, agora entendi. O governo então deve ter dito no início do racionamento que as medidas eram constitucionais, porque só assim as pessoas "cumpririam"; segundo informação da própria Veja, capa de 6 de junho, "91% das pessoas já estão economizando energia". Isto, sem a constitucionalidade da medida. Com a decisão dos ministros, então, já deve estar em "300%" de apoio, não é verdade?
Por outro lado, como uma questão tão profunda pode ser analisada de maneira tão rasa (não, não é um reservatório de água do governo) por pessoas (os juízes do STF) que julgamos serem igualmente profundas em seus estudos e análises? Será que então os brasileiros "caipiras" e "vagabundos" de outrora são também os responsáveis pela falta de água e energia? Será que faltou ensinar o povo a economizar? O problema é que em questões de ensino são necessários professores, escolas, planejamento? Difícil, hein?
(*) Jornalista