FÁBIO ASSUMPÇÃO vs. EDITORA GLOBO
“Com o dedo na ferida”, copyright Folha de S. Paulo, 14/09/03
“Ano passado, ele processou uma revista de celebridades da Editora Globo – braço das mesmas Organizações que englobam a rede de TV da qual é contratado – por publicar fotos de seu casamento. Dentro de um mês, estará no ar em horário nobre, na Rede Globo, justamente no papel de um editor que comanda uma revista do mesmo gênero dessas publicações que o perseguem na vida real. Bom motivo para Fábio Assunção ir à forra, não? De jeito nenhum, diz o ator. Aos 32 anos, sereno como convém a um pai de família, ele bem sabe o que quer.
Em entrevista ao Estado em um flat de São Paulo, para onde se mudou enquanto aguardava o fim de uma pequena reforma em seu apartamento, o ator conversou sobre a polêmica que Celebridade, próximo folhetim das 8, de Gilberto Braga, deve causar ao mostrar o mundinho dos pseudofamosos.
Como prova o episódio de seu casamento com a modelo Priscila Borgonovi, a postura do ator em relação à fama segue na contramão daquela trilhada por gente que adora estampar, em capas de revistas, a quantas andam suas relações amorosas, o resultado da cirurgia plástica mais recente ou a última aquisição na decoração da casa. ?Não agüento ver a exposição dessas pessoas que não fazem nada, que só têm vida pessoal para mostrar?, diz, gesticulando e tendo entre os dedos, invariavelmente, um cigarro, esteja este aceso ou apagado.
Talvez nem ele soubesse em qual profissão se encaixaria quando lhe pediram para enviar à Globo uma foto e um currículo – até ali com apenas três peças amadoras. Aos 19 anos, foi praticamente jogado aos leões na novela Meu Bem Meu Mal (1990/91), em pleno horário nobre. Hoje, consumado um inegável amadurecimento profissional, o ator passa longe daquele garoto franzino que tremia só de ouvir as vozes de atores tarimbados no set.
Às voltas com as descobertas de seu filho, João, com seu projeto na ONG Meninos do Morumbi, onde coordena um grupo de teatro, e com a frustração de ter perdido sua aliança de casamento (uma nova está sendo providenciada por Priscila, aliás), Fábio Assunção fala sobre a expectativa em torno de Renato, seu personagem em Celebridade, que tem estréia prevista para outubro.
Estado – Como é interpretar um ?vilão? que você sempre repudiou?
Fábio Assunção – Eu não conto como vilão porque ele não mata criancinhas. É um cara que não tem escrúpulos, uma figura moralmente condenável. Ele é um editor de uma revista de celebridades, a Fama, e, para ele, o que importa não é a informação. Ele não quer saber sobre a verdade da informação, quer notícias sensacionalistas, explorar a vida dos célebres.
Estado – E esta indústria está em voga nos últimos anos. Como você vai interpretar isso na tela?
Fábio – Acho delicado falar sobre isso, mas mostrar, acho que não. Ele já começa em uma reunião de pauta dizendo: ?Quero um corno novo na capa desta semana.? A novela toda vai falar disso. Você tem a célebre, que é discreta, você tem a menina que quer ser célebre e faz qualquer coisa para ser famosa, você tem o bom jornalista, o mau jornalista. Tem de tudo.
Estado – Está inserida aí uma crítica à sociedade atual?
Fábio – É uma novela que pode ser não só uma crítica, mas uma mostra de como o mercado de celebridades virou uma coisa vazia. É uma valorização de muita coisa ruim, o lado pessoal das pessoas e muito pouco do que elas realmente fazem. É uma valorização de pessoas que não fazem nada, que não têm profissão e que são mostradas de forma pessoal.
Estado – É um problema do Brasil ou do mundo?
Fábio – É uma mudança de linguagem do mundo. Chegou a internet e, com ela, sites com câmera 24 horas, programas do estilo Big Brother. Essa coisa de fetiche, de ficar observando o outro foi uma coisa muito valorizada. Estava falando para a Priscila sobre o Sérgio Vieira de Mello. Quantas pessoas no mundo não são assim, estão fazendo coisas bacanas. Esse cara nunca foi capa de uma revista. Daí acontece um atentado, descobre-se a importância desse cara e, de repente, ele é um cara de que nos orgulhamos. Por que esse cara não foi valorizado antes? Onde estão esses caras: seja na cultura, na ONU, em outras áreas. A gente sempre vê as mesmas pessoas na mídia. Pessoas que não fazem nada e que só estão esperando o momento de serem descartadas, esperando que outras cheguem. Essa velocidade de consumo tinha que gerar uma velocidade de se produzir novas pessoas célebres de verdade. O problema é que muitas dessas não querem se expor.
Estado – É o seu caso.
Fábio – Eu não gosto de me expor. Não quero julgar quem faça, mas é um consumo. Não quero ser consumido, quero que o que eu faço seja consumido. Vivemos num mercado que o tempo todo está tentando as pessoas a serem consumidas. As pessoas querem ser famosas como se a fama fosse sinônimo de sucesso. Mas, independentemente de ser conhecido, existem pessoas de sucesso, como era o Sérgio Vieira de Mello. Mas essas pessoas (que buscam a fama) não querem fazer sucesso, porque para isso é preciso embasar seu sucesso no trabalho. Essas pessoas buscam a fama porque ela dá status e existe um inconsciente coletivo que isso é sinônimo de riqueza, de poder. Aliás, a maioria das mães das crianças que fazem TV se sente estrela. É incrível, mas elas começam a ter uma postura de ?quero isso quero aquilo?, querendo colher uma coisa que não aconteceu. É todo um pensamento equivocado de o que é ser uma celebridade.
Estado – Você vê uma luz no fim do túnel?
Fábio – (Risos) Não acho que isso tem que acabar porque isso não acaba com as pessoas que trabalham de verdade. Mas acho que esse mercado não leva a nada. É um mercado de muitas revistas que precisam de produtos e inventam, reinventam, exploram o que essas pessoas têm de pior. Não é bom nem quando te enaltece nem quando te denigre. Dá para sobreviver sem fazer parte disso. É até melhor para seu trabalho. Entrar nesse circuito e ficar exposto a cada troca de namoro e convocar a imprensa para falar disso te desgasta tanto que um diretor bom não vai te chamar.
Estado – Você tem um processo aberto contra a revista ?Quem?, que tirou fotos sem sua permissão do seu casamento. Foi a primeira vez que se indispôs com a imprensa?
Fábio – Foi. A gente conseguiu uma liminar para eles não colocarem as fotos na banca e eles colocaram. Está rolando um processo sobre a multa que eles terão de pagar por terem desobedecido a uma ordem judicial. Esse episódio foi péssimo porque eu tinha falado que ia mandar fotos, exclusivas, se fosse o caso, para a imprensa. Mas, cara, as pessoas ligavam dizendo que podiam pagar a festa! Não tenho nada a esconder, não tenho problema para falar do meu casamento, mas a forma como foi feito foi agressiva. Se fosse outra ocasião, não ia abrir o processo. Não é bom criar qualquer tipo de inimizade, mas tem que haver uma civilidade.
Estado – Você conta com o assédio quando sai de casa?
Fábio – Perguntam se tem muitos paparazzi atrás de mim. É claro que não. Estou com a mesma mulher há sete anos e não é interessante flagrar eu e a Priscila indo ao cinema, mas fujo de estréias e eventos em geral.
Estado – Tem medo de o seu personagem se tornar caricato?
Fábio – Não, mas tenho medo de não poder ir muito a fundo. Se faço um personagem anônimo, tudo bem, mas um editor de uma revista de celebridades, de certa forma, vai haver referências. No Rei do Gado, por exemplo, o Jackson Antunes fez um líder dos sem-terra, um retrato de uma classe. E coincidiu com o aumento do movimento no Brasil. É claro que dentro desse movimento havia pessoas realmente capazes de mexer com a terra e outras que não sabiam pegar uma enxada. Por isso, o Benedito (Ruy Barbosa, autor) teve que segurar. Ao mesmo tempo, o Gilberto (Braga) também tem isso. É delicado fazer um cara absolutamente sem ética porque não são todos que o são.
Estado – O papel será uma maneira de ir à forra com a imprensa?
Fábio – De maneira nenhuma. O Gilberto tinha me dado outras opções de personagens, mas escolhi esse porque achei interessante o poder que ele tem. É uma figura que usa esse poder de um jeito torto. Não é um psicopata. Ele não tem ética, o que é muito mais profundo.
Estado – Você gosta de fazer novela?
Fábio – Se é boa, eu gosto.
Estado – Já fez muitas ruins?
Fábio – (Risos) Toda novela tem fases que seu personagem não está bombando. São as partes ruins. O autor é meio deus, ele traça meu destino. E novela é uma obra muito grande, tem momentos que o personagem acontece, tem outros que essa história morre para vir outra. Não existe uma fórmula. Tem que ter a empatia do personagem com o público. O Marcos Mezenga, de O Rei do Gado, eu via que dava certo, as pessoas andavam igual a ele em Ribeirão Preto. Daí é legal, você vê o retorno, mas tem trabalhos que são mais frios.
Estado – Sente sua evolução a cada trabalho?
Fábio – Cada peça que faço vejo que dou um upgrade.
Estado – E novela?
Fábio – Às vezes. Às vezes acho que saio até mais gasto, exausto. Mas já houve novelas em que aprendi muito. Sonho Meu, a quarta que fiz, foi uma dessas. É difícil entender a mecânica de câmeras e, na época, não tinha oficina de ator. Hoje, de certa forma, os atores chegam mais preparados, começam em Malhação. Mas eu fui atirado aos leões, caí em uma novela das 8, meu avô era o Lima Duarte, tinha a Isabela Garcia… Era assustador, pois eu era praticamente fã daquelas pessoas (risos).
Estado – E hoje? Quem o assusta?
Fábio – Me assusto com essas ?celebridades?. Tem um volume de pessoas novas de quem nunca ouvi falar. A velocidade com que as pessoas ficam importantes me assusta. Acho que mostrar sua vida pessoal não anula seu talento, o problema é que tem pessoas que só têm vida pessoal! Trabalhando esses anos com pessoas conhecidas e competentes eu desmistifiquei essa coisa de celebridade. Sei que existe um trabalho muito sério por trás delas. O que me choca são as celebridades emergentes. Antigamente, tinha mais um conceito de classe, você observava as gerações de atores. Agora, não: as pessoas surgem e já com posturas de pessoas absolutamente prestigiadas, pose de superstar.
Estado – Ser pai mudou sua vida?
Fábio – Deixei de fazer uma peça porque ele ia nascer. Eu tinha e tenho romantismo em relação a filhos e queria que ele me dissesse qual ia ser meu próximo trabalho. Fico vendo o João, ele descobrindo as coisas, ele está conhecendo e eu quero me descobrir com ele. Estou redescobrindo minha profissão também. O projeto de coordenar um grupo de teatro nos Meninos do Morumbi tem muito a ver com isso. Os Meninos também estão tendo o primeiro contato com o teatro, conhecendo, e eu estou contemplando isso. Estou usando meu filho para retomar minha vida.”
GUERRILHA
“Adolescentes voltam a ter vez e voz”, copyright O Estado de S. Paulo, 14/09/03
“Houve época, bem mais pródiga, em que a TV Cultura produzia bastante e diferente e funcionava como laboratório para as emissoras comerciais. Do seu quadro de programas infantis saiu Cao Hambúrguer, que levou um pouco de qualidade para o SBT com o Disney Clube. Lá também foi criado o gênero programa inteligente para jovens (Matéria Prima) que, por sua vez, exportou Sérgio Groissman e o papo-cabeça para o SBT e Globo.
Hoje infelizmente a emissora passa por uma fase quase estéril por absoluta falta de recursos e de compreensão do poder público estadual. Comprovando a tese de Marcelo Tas de que a crise é boa porque gera a criatividade, a Cultura descobriu um parceiro e colocou no ar um programa para adolescentes que, se tiver vida longa, poderá influenciar positivamente a concorrência.
Guerrilha, produzido em parceria com o Itaú Cultural (domingo, 17 horas), é o contraponto para shows que usam os jovens como cenário e coadjuvantes em brincadeiras geralmente desconcertantes. Na Guerrilha da TV Cultura, o jovem é protagonista, por isso tem voz, opinião e atitude. E uma boa opção para os que não têm muita paciência para Gugus e Faustões nas tardes de domingo.
Na estréia, a apresentadora Anelis Assumpção explicita a missão do programa: provocar ação e reação, lutar contra o imobilismo. Colocando assim até parece conversa de assembléia de estudante de Sociologia, mas não é.
Guerrilha é até despretensioso. Anelis (percussionista e filha do compositor Itamar Assumpção) alinhava o programa com um texto cheio de informações relevantes, conduz o debate entre jovens e personalidades sobre o assunto do dia (na estréia sobre tolerância, participação e cidadania). Reportagens e música de gente de fora do showbiz completam o programa.
Quatro jovens videomakers saem às ruas para buscar depoimentos que ilustram a discussão no estúdio. Os rapazes são engraçados na medida certa e conseguem colher boas falas de adolescentes. A diversidade é garantida na edição. Algumas opiniões em relação à condição do jovem brasileiro são otimistas e outras bem críticas. O legal é que os entrevistados são convidados a se avaliarem de acordo com sua análise e topam da maneira mais descontraída.
O programa também é de personagens. A equipe encontra na rua um rapaz nissei que, na conversa, diz que desenha quadrinhos em casa. Os repórteres pagam um sanduíche para o garoto e se convidam para ir à casa dele ver o trabalho.
Entrevistam a avó e entram no universo gráfico do personagem pelo computador que assina seus quadrinhos como Zé Gotinha.
A banda Makumbacyber mostra seu trabalho no palco e seus componentes dão opiniões pessoais sobre os assuntos do programa em locações externas. Além de debater, a atriz e poetiza Elisa Lucinda declama trechos do poema Termos da Nova Dramática bem ilustrativos sobre o que se discute. Lúcia Pinheiro, da ONG Projeto Travessia, fala de trabalho voluntário e juventude, enquanto os repórteres mostram na prática o funcionamento da ONG.
O acabamento do Guerrilha tem a qualidade das produções da Cultura, mas a edição é mais MTV. É nervosa, ágil e fragmentada como o pensamento da geração com que o programa quer falar.
A guerrilha do terceiro milênio é bem diferente daquela apologizada pelos jovens dos anos 60 e 70 (do século passado, como lembra Elisa Lucinda), mas pode subverter a ordem medíocre do cardápio oferecido aos jovens pela TV.”
SEX AND THE CITY
“A revanche de ?Sex And The City?”, copyright O Estado de S. Paulo, 14/09/03
“Imagine a cena de um casal assistindo à TV. Ao primeiro programa, ela assiste atenta, se identifica e se emociona, ri e chora com a mesma facilidade, enquanto ele fica sem entender ao certo o que está acontecendo.
Na seqüência, outro programa arranca gargalhadas dele, que não desgruda os olhos da telinha, mas desta vez é ela que não acha a menor graça no que ouve e vê.
É justamente para tentar agradar ao gosto mais peculiar – e distinto – de ambos os sexos que o canal Multishow incluiu este mês em sua programação um tal de No Mundo dos Machos. Depois do sucesso do seriado Sex and The City, que agrada em cheio ao público feminino, o canal estreou no dia 6 um novo programa, na faixa Sábado Humor, mas desta vez indicado especialmente para os homens.
Não por acaso, No Mundo dos Machos (The Man Show, título original) vai ao ar aos sábados, logo após a reprise de Sex and The City, às 21h30. ?Não dá para defini-lo como um programa feito de homem para homem. Talvez aconteça como Sex, que hoje tem um público masculino bastante significativo?, aposta Wilson Cunha, diretor do Multishow e um dos responsáveis pela escolha do programa para integrar a programação do canal. ?Mas é um programa, digamos, politicamente incorreto, que tem um humor mais ousado e debochado, como Jackass (atualmente exibido pela MTV, mas que iniciou carreira na TV brasileira via Multishow).?
A idéia de exibir os programas na seqüência ganhou até piadinha interna no canal: o horário foi apelidado como ?faixa guerra dos sexos?. ?Fizemos uma programação casada. Sex é a visão das mulheres sobre os homens, e No Mundo dos Machos é a vingança dos homens?, brinca Cunha. Tanto que até as reapresentações, na segunda e sexta-feira, são na seqüência.
Apesar de ser um programa indicado para qualquer pessoa, as mulheres podem não gostar muito do que vêem em No Mundo dos Machos. Para rir, é preciso ter em conta que o índice de testosterona exalado pelo programa é, na verdade, uma caricatura do mais alto grau de machismo. Para quem era fã do extinto TV Pirata, na Globo, convém lembrar de Guilherme Karan no comando do quadro TV Macho.
Auditório de homens – ?É totalmente diferente do que as pessoas estão acostumadas a ver na TV aqui no Brasil?, avisa Cunha.
Gravado em estúdio, com recheio de cenas externas do tipo ?pegadinhas?, o programa tem até um auditório, formado, predominantemente, por homens, ao contrário do que se vê em qualquer auditório de TV.
Aliás, a platéia, diga-se, bastante interativa, mais parece estar num bar, com canecas de cerveja na mão, do que num programa de TV. O mesmo vale para os apresentadores e criadores da atração, Adam Corola e Jimmy Kimmel, que ora estão sentados em sofás, como se estivessem vendo um jogo na sala de casa, ora num balcão de bar e até numa mesa de carteado. Mas sempre contando piadas, conversando com o público e cercados por belas assistentes, que estão lá para atiçar as ?fantasias? masculinas. Sim: elas vestem figurinos de boxeadores – incluindo as luvas -, com shortinhos e decotes em tecidos do tipo cetim.
?É um programa que fala sobre o universo masculino?, simplifica Cunha.
O programa é sucesso nos Estados Unidos, onde é exibido pelo canal Comedy Central, e lá está na 4.? temporada. No episódio de estréia, o programa foi visto por mais de 1,5 milhão de americanos. Aqui no Brasil, o Ibope ainda não divulgou a audiência da estréia da atração, que está no ar há apenas duas semanas. Por via das apostas, o Multishow já garantiu as duas primeiras temporadas e tem opção de compra das próximas.”